PEC dos Fundos vai acabar com políticas de combate ao desmatamento na Amazônia
Governo Bolsonaro quer extinguir fundos e transferir recursos para pagamento de juros da dívida pública. Políticas de combate ao desmatamento serão prejudicadas se PEC for aprovada
Publicado: 27 Novembro, 2019 - 09h20 | Última modificação: 27 Novembro, 2019 - 09h35
Escrito por: Andre Accarini
As políticas de combate ao desmatamento e grilagem de terras na Amazônia podem ser extintas se a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 187/2019, a PEC dos Fundos, for aprovada no Congresso Nacional. A medida idealizada pelo ministro da Economia de Jair Bolsonaro, o banqueiro Paulo Guedes, pretende transferir recursos de mais de 200 fundos destinados a áreas específicas, inclusive saúde e educação, para pagamento de juros da dívida pública.
O secretário de Meio Ambiente da CUT, Daniel Gaio, afirma que a proposta vai na linha deste governo que quer desmontar as políticas públicas e transferir recursos de áreas importantes para o mercado financeiro. “O governo não tem projetos e quer acabar com os que já estão criados e que funcionam. E o Fundo Amazônia é um deles”.
De acordo com o Painel da Folha, o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, afirmou que vai se mobilizar para manter o fundo, mas sob “novas bases”.
Para Daniel Gaio, Salles quer recriar posteriormente o fundo para continuar captando os recursos, que hoje em sua maioria vêm de outros países, como Noruega, Alemanha e Inglaterra, para utilizá-los na regularização fundiária na Amazônia.
“Na prática, o que vai acontecer é a regularização de toda a política de grilagem que vem sendo promovida por esse governo”, afirma.
CITAÇÃO Ricardo Salles quer beneficiar os que botam fogo na Amazônia.
A PEC
A leitura do relatório do senador Otto Alencar (PSD-BA) sobre a PEC dos Fundos, na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, está marcada esta quarta-feira (27). Alencar fez mudanças, entre elas, preservar o Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT), que custeia o seguro-desemprego e abonos salariais.
Daniel Gaio explica que os senadores da base aliada do governo têm feito acordos no esforço para aprovar a PEC. “A base deles está bastante engajada porque eles sabem que as outras duas propostas do Plano Mais Brasil [a Emergencial e do Pacto Federativo] têm mais dificuldade de passar”.
Segundo ele, a PEC dos Fundos tem facilidade de ser aprovada porque pode gerar acordos com governadores para transferir recursos para pagar a dívida pública de estados. Por isso, ele ressalta, para proteger as políticas de combate ao desmatamento, financiadas com os recursos do Fundo Amazônia, é necessário organizar a resistência.
Um dos caminhos, aponta o secretário de Meio Ambiente da CUT, é pressionar parlamentares para que não aprovem a PEC usando como argumento principal a fragilidade das ações do governo Bolsonaro.
“Os parlamentares têm que entender que proteger a Amazônia é essencial até mesmo para o agronegócio. Por conta do desmatamento já temos mudanças no regime de chuvas, o que afeta também os produtores”, afirma Daniel.
Segundo o dirigente, os quase 30% de aumento no desmatamento, observados por institutos de pesquisas, entre agosto de 2018 e julho de 2019, já provocaram alterações no regime de chuvas da região.
Os temas Amazônia e Meio Ambiente, conforme explica Daniel Gaio, têm apelo internacional e sensibilizam tanto a sociedade quanto a mídia, por isso, a “argumentação tem que ser muito utilizada porque o impacto será imediato e o desmatamento que parte dos grileiros e pecuaristas têm feito não interessa ao agronegócio”.
A votação da PEC deve acontecer na primeira quinzena de dezembro, de acordo com informações do Portal do Senado.
Alternativa
Com o descaso do governo Bolsonaro, os governadores de estados do Norte, Nordeste e Centro-Oeste criaram o Consórcio Amazônia Legal, uma alternativa para captar os recursos, que em sua maior vêm de outros países, e assim dar continuidade às políticas de combate ao desmatamento. Os recursos seriam geridos pelo consórcio sem interferência do governo Federal.
“Seria uma alternativa que não passaria pelo governo Bolsonaro para eles não meterem a mão nos recursos”, diz Daniel.
Mas o dirigente afirma também que, para ser efetivado, o fundo depende de uma sinalização positiva do Itamaraty e da Casa Civil. “O que está ficando claro é que os próprios governadores não têm expectativas positivas em relação às políticas desses órgãos”, complementa.
Ainda de acordo com Daniel Gaio, “o governo deve inviabilizar o Fundo Amazônia e os governadores trabalham com a perspectiva que os países continuem contribuindo, mas em um fundo gerido pelos estados.
Gestão
A gestão do Fundo Amazônia é feita pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). O secretário de Meio Ambiente da CUT alerta que o desmonte do Estado pelo governo Bolsonaro atinge também o banco. “Eles estão acabando com as políticas de apoio às pequenas e médias e empresas e com a gestão de fundos pelo BNDES e isso faz parte do desmonte do Estado”.
Daniel Gaio afirma que projetos de conservação e combate ao desmatamento desenvolvidos por importantes órgãos como o Instituto Nacional de Pesquisa Espacial (Inpe), o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) serão os mais prejudicados caso o Fundo Amazônia seja extinto.
O fundo, que serve para captar doações, já investiu mais de R$1,8 bi, em 103 projetos de prevenção, utilização sustentável da Amazônia, monitoramento e combate ao desmatamento. Os investimentos ainda se estendem a projetos contra o desmatamento no restante do Brasil e em outros países tropicais.