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PGR pede fim do fundo da Lava Jato. 'É ilegal', diz Raquel Dodge

Procuradora-geral da República afirma que força-tarefa da Lava Jato em Curitiba extrapolou "os limites constitucionais de sua atuação e que implica verdadeira concentração de poderes"

Publicado: 13 Março, 2019 - 14h46

Escrito por: Patricia Faermann, do GGN

Reprodução
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A procuradora-geral da República (PGR), Raquel Dodge, entrou com uma ação liminar no Supremo Tribunal Federal (STF), pedindo o fim do acordo da força-tarefa de Curitiba e a Petrobras que garante um fundo bilionário sob o controle dos procuradores da Lava Jato. O pedido de Dodge foi remetido diretamente ao presidente do Supremo nesta terça-feira (12) e foi obtido pelo GGN.

A estatal repassou R$ 2,5 bilhões de reparação, para serem aplicados em projetos sociais administrados por uma fundação de direito privado recém constituída e controlada pelo Ministério Público Federal do Paraná, em conta vinculada com a 13ª Vara Federal de Curitiba.

A PGR entrou com a ação por considerar "ilegal" a autorização pelo Poder Público do acordo. Trata-se de uma Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental, em que a Procuradoria quer "evitar e reparar" lesão a garantias constitucionais e elenca uma série de ilegalidades cometidas pela força-tarefa da Lava Jato de Curitiba e pela juíza Gabriela Hardt.

"Não compete ao Ministério Público Federal ou ao Juízo da 13ª Vara Federal de Curitiba administrar e gerir, por meio de fundação, recursos bilionários que lhe sejam entregues pela Petrobrás", resume. Nela, Dodge ressalta que o acordo entre a Lava Jato e a Petrobras foi firmado por "natureza não penal", descrevendo-o como "administrativo", e é inconstitucional:

"É um ato judicial de efeitos concretos, que viola preceitos fundamentais e, portanto, é inconstitucional, e não há outros meios de controle abstrato de constitucionalidade que se mostrem eficazes para sanar o vício de inconstitucionalidade e a iminente lesão constitucional decorrente da homologação e execução do Acordo de Assunção de Compromissos ora questionada", inicia Dodge, na ação.

Entre as ilegalidades constatadas, a procuradora pontua a "lesão a direitos fundamentais e estruturantes da República Federativa do Brasil e do Estado Democrático de Direito".

Dodge afirma que foram violados todos os preceitos com base na "separação dos poderes, na preservação das funções essenciais à Justiça, nos princípios da legalidade e da moralidade, na independência finalística e orçamentária do Ministério Público e na preservação do princípio constitucional da impessoalidade, como medidas necessárias ao exercício das suas prerrogativas e funções constitucionais".

A procuradora-geral dá destaque especial ao "ato judicial violador" da força-tarefa da Lava Jato de Curitiba que tentou "dar adequada aplicação a vultosos recursos públicos resultantes de acordo celebrado entre a Petrobrás com autoridades norte-americanas". Mas tal medida não compete aos procuradores, lembrou.

Ao contrário, "caracteriza grave violação de princípios constitucionais estruturantes do modelo republicano e democrático, pautado no sistema de freios e contrapesos (checks and balances)".

Durante toda a ação, Dodge ressalta que o estado democrático de direito está sendo violado, principalmente nos poderes que o Ministério Público Federal do Paraná acreditou assumir com esse acordo.

"A Constituição também estabelece um sistema de controle recíproco dos limites e das vedações no exercício dessas funções, de modo que cada um dos órgãos estatais exerce uma parcela específica das atribuições constitucionais, prevenindo confusão e concentração excessiva de poderes, o que poderia contaminar as bases da democracia", explica.

No caso do acordo com a Petrobras, o MPF extrapolou "os limites constitucionais de sua atuação e que implica verdadeira concentração de poderes entre a atividade de investigar e atuar finalisticamente nos processos judiciais e de executar um orçamento bilionário, cuja receita provém de acordo internacional do qual não é parte nem interessado".

Da mesma forma, Raquel Dodge aponta que tampouco é competência da Justiça Federal de Curitiba, no caso da juíza Gabriela Hardt, a de autorizar um acordo que permite a procuradores controlarem recursos financeiros de uma negociação internacional.

"As cláusulas do Acordo de Assunção de Compromissos deixam bastante evidente o protagonismo de determinados membros da instituição, singularmente os que integram a Força-Tarefa Lava Jato Curitiba, na integral condução da aplicação dos recursos financeiros oriundos do Acordo de Não Persecução Penal firmado pela empresa Petrobrás com os Estados Unidos, pelo Departamento de Justiça americano."

"Basta verificar que aqueles membros da Força-Tarefa, assumiram compromissos administrativos e financeiros pelo Ministério Público Federal, falando pela própria instituição sem poderes para tanto, de conduzir todas as etapas do processo destinado à constituição de uma fundação de direito privado, idealizada para administrar cinquenta por cento dos recursos disponibilizados – US$682.560.000,00 ,– ficando responsável por todos os meios destinados à constituição dessa fundação, que terá sede em Curitiba", continua Dodge.

A procuradora lembra que parte da responsabilidade de concentrar estes poderes nas mãos da força-tarefa de Curitiba é da juíza Gabriela Hardt, porque ela homologou "a responsabilidade pela gestão e aplicação desses vultosos valores" aos procuradores. Além disso, a Justiça Federal não tem "competência jurisdicional" para acordos desse tipo.

"Por mais louvável"…

A procuradora faz uma dura crítica sobre a tentativa da Lava Jato de associar a intenção "louvável" com o fundo bilionária para justificar a medida. Basicamente, porque nem a força-tarefa de Curitiba, nem a juíza Gabriela Hardt têm competência para decidir sobre "gestão orçamentária, financeira e finalística".

E, por isso, ambos "extrapolaram suas atribuições constitucionais e legais e violaram os preceitos básicos da instituição, notadamente de ser órgão equidistante dos demais poderes, o de representar os interesses sociais relevantes, defender os interesses públicos e os princípios fundamentais do regime democrático".

"E mesmo que fosse legal..."

Por fim, a procuradora-geral esclarece que mesmo que a defesa da Petrobras tivesse a intenção "benéfica para o interesse nacional de reaver parte do dinheiro desviado", querendo que 80% retornassem ao Brasil e não à Petrobras, ainda assim, "não há qualquer fundamento de ordem constitucional, legal ou contratual para determinar que a administração desse dinheiro seja feita pelo MPF ou com participação de membros do MPF".

Está evidente, segundo Dodge, "a violação das regras de integridade" e "o conflito de interesses na atuação funcional de órgãos públicos, entre estes, membros do Ministério Público que possuem o status constitucional", porque o papel do MPF deve ser "institucional e impessoal".

Dessa forma, a PGR conclui que o acordo da Lava Jato de Curitiba é "nulo".