Escrito por: Andre Accarini

PL da educação como atividade essencial é risco de morte para professores e alunos

Entidades estão mobilizadas contra o projeto da senadora Paula Belmonte, do Cidadania/DF, que quer colocar educação como atividade essencial e determina retorno imediato às aulas presenciais

Arte:CUT

A CUT e entidades que defendem a educação e a preservação da vida durante a pandemia do novo coronavírus estão mobilizadas contra o Projeto de Lei (PL) nº 5595/2020, da senadora Paula Belmonte (Cidadania/DF) que coloca a educação básica e a superior no rol de serviços e atividades essenciais.

Se aprovado, o PL torna obrigatória a volta das aulas presenciais no momento em que complicações provocadas pela Covid-19, doença provocada pelo vírus, faz mais de duas mil vítimas fatais por dia, argumentam representantes das entidades contrárias à medida, que chamam de ‘fila do abate’.

De acordo com dirigentes dessas entidades, o projeto coloca em risco a vida de cerca de 60 milhões de pessoas, entre professores, alunos e trabalhadores da educação que ficarão expostos ao vírus, podem se contaminar e contrair a forma mais grave da doença, com risco de morte ou sequelas permanentes. Isso porque, alegam, a grande maioria dos estabelecimentos de ensino público do país não têm condições sanitárias para acomodar aulas presenciais.

Além disso, a proposta ataca a autonomia dos estados e municípios, que de forma regionalizada, conduzem estudos para avaliar os impactos da pandemia, com base nos índices de contaminação, adoecimento, hospitalizações e mortes e quais setores oferecem mais riscos e devem ser priorizados no isolamento social.

“Não é a hora de voltar, as escolas não têm capacidade, não têm condições materiais de impedir a contaminação dessas pessoas ainda mais em uma fase da pandemia em que estão aparecendo variações ainda mais agressivas do vírus”, diz o secretário de Cultura da CUT, o professor José Celestino Lourenço (Tino).

Ele reforça que a voltas às aulas é um anseio da sociedade, mas sem segurança, não há possibilidade. “O projeto, relatado pelo  senador Marcos do Val [Podemos/ES], é danoso para a vida das pessoas e é por isso que já há uma grande articulação nacional para impedir o retorno”, diz Tino, ressaltando que a luta contra essa barbaridade é de toda a sociedade brasileira e alertando que a proposta deve ser votada no dia 29 de abril.

A mobilização das entidades que defendem a educação pública, democrática e de qualidade é grande, de acordo com o dirigente. A Campanha Nacional pelo Direito à Educação, da qual participam entidades como a CUT e a Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE) se manifestou contra o projeto.

“São inúmeras entidades que contam, inclusive, com apoio de prefeitos e governadores contrários à inciativa, justamente por ferir o pacto federativo e a autonomia dos municípios e estados para medidas de combate à pandemia”, explica Tino Lourenço.

Em nota, as entidades afirmam que “não é o momento de causar mais caos, mais contaminações e mais mortes e é inadmissível que o Congresso Nacional se abstenha de exercer sua função democrática em representar a população e a comunidade escolar - representada neste posicionamento e em tantos outros contrários à aprovação deste projeto de lei altamente equivocado”

Ainda de acordo com nota, é “urgente o Senado Federal corrigir essa decisão nefasta e negacionista, e retomar a racionalidade e o compromisso com os direitos humanos da população brasileira”.

Na avaliação da CNTE, reabrir escolas, antes de mais nada requer vacina para todos e investimentos nas redes públicas de ensino. Heleno Araújo, presidente da entidade, ressalta que o país possui legislações específicas que tratam de atividades essenciais e que não são consideradas pelo PL 5.595/20. “Além disso, atenta contra direitos constitucionais como a greve e o próprio direito à vida”, diz o dirigente.

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Parlamentares da oposição também são contrários ao projeto. Para a deputada Federal Rosa Neide, Coordenadora do Núcleo de Educação e Cultura das bancadas do PT no Congresso Nacional, “o PL 5595 fere a autonomia dos entes federados [estados e Distrito Federal], obrigado-os a se adequarem à uma lei federal, sem respeitar as realidades locais”.

Rosa Neide afirma que o projeto segue um conceito equivocado em relação ao trabalho essencial, e aproveita a pandemia para destruir a organização das categorias da educação. O projeto acaba ferindo também o direito da categoria à greve.

“A Bancada do PT é contra, estamos organizados com a minoria para a retirada. Entre outras ações estamos organizados com as entidades que defendem a educação em todo país falando com os senadores de todos os estados”, diz a parlamentar.

Tino Lourenço diz ainda que há até mesmo parlamentares que não são da oposição, que são contra o projeto. “Estamos conversando também com o Senador Flavio Arns, do mesmo partido, o Podemos, de Marcos do Val, para que conscientize o relator sobre o retrocesso que esse projeto representa”, diz Tino Lourenço

Faltam condições nas escolas

A grande maioria dos estabelecimentos é da rede pública de ensino e muitos não apresentam uma estrutura adequada para receber alunos em tempos de pandemia. “Falta ventilação adequada, espaços nos refeitórios para manter as crianças em distanciamento seguro e a até a manutenção do mais básico como banheiros, por exemplo, é precária”, afirma o secretário de Cultura da CUT

Além disso, o transporte tanto de alunos como de professores no trajeto de casa para a escola e vice-versa, é fator de risco.  Deputado Federal pelo PT de SP, médico infectologista e ex-ministro da Saúde, Alexandre Padilha alerta também para questões decisivas para um retorno às aulas.

Uma delas é espaço arejado não só na sala de aula, mas em todos os espaços onde há circulação “onde é mais difícil ter controle sobre o risco do contato entre as pessoas”. Padilha cita ainda, a necessidade de estruturas de higienização permanente com oferta de álcool-gel e máscaras de proteção.

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O projeto da senadora Paula Belmonte, ignora todas as considerações de especialistas sobre os riscos do ensino presencial neste momento. Um deles, Diego Xavier, pesquisador e epidemiologista do Instituto de Comunicação e Informação em Saúde (Icict), ligado à Fiocruz, afirma que a volta às aulas é um passo da reabertura econômica que, teoricamente, coloca fim ao isolamento social recomendado por autoridades de saúde e o resultado é o aumento de casos.

“O vírus se aproveita da grande circulação de pessoas para se disseminar e a tendência é de que voltemos a ter aumento no número de casos”, ele diz.

Já um outro projeto, que tramita na Câmara dos Deputados, de autoria da Deputada Federal Professora Dorinha (DEM-TO), conta com o apoio das entidades que defendem a educação.

“Estamos apoiando o projeto da Professora Dorinha porque estabelece estratégias de garantias sanitárias para o retorno às aulas, ao contrário do projeto de Marcos do Val, que quer a volta às aulas, de qualquer jeito, sem nenhuma segurança”, afirma Tino Lourenço.

 

*Edição: Marize Muniz