Escrito por: CNTE
Trabalhadoras são maioria em estágios iniciais da educação e sofrem com salários menores
O ensino básico brasileiro é majoritariamente formado por profissionais do sexo feminino. Entre profissionais da educação, 79,2% são mulheres, segundo dados do Censo Escolar 2022 realizado anualmente pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep).
As estudantes também são maioria entre alunos matriculados no ensino superior (58,1%) e também entre aqueles que concluem esse curso (61%), segundo Censo da Educação Superior, de 2021. Porém, na sala de aula das universidades, predominam os professores do sexo masculino (52,98%).
Apesar de serem maioria da população brasileira e 49% das bolsistas do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), as mulheres ocupam espaços de reitoras em 30,2% das 63 universidades federais existentes no Brasil.
Os dados são apenas parte de uma realidade que demonstra a restrição do acesso das mulheres ao topo da pirâmide, também na educação.
O fenômeno é mundial, conforme destaca o “Relatório conciso de gênero 2018” produzido pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco).
Nos países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), o gênero feminino representa 57% da força de trabalho governamental, ocupando 65% das posições de secretariado, 35% dos gestores de nível médio e 27% dos gestores de alto nível.
Diante do cenário desigual na sociedade e na educação brasileira, a Câmara dos Deputados promoveu um importante avanço para a igualdade entre gêneros ao aprovar, no último dia 4, em sessão deliberativa, um substitutivo ao Projeto de Lei 1085/2023, que institui medidas para buscar garantir a igualdade salarial e remuneratória entre mulheres e homens para trabalho de igual valor ou mesma função.
O texto da relatora, deputada federal Jack Rocha (PT-ES), agora segue para o Senado e aponta parâmetros de fiscalização contra o tratamento desigual remuneratório entre homens e mulheres em empresas com mais de cem trabalhadores e trabalhadoras.
Em caso de discriminação por motivo de sexo, raça, etnia, origem ou idade, além das diferenças salariais o empregador deverá pagar multa administrativa equivalente a dez vezes o valor do novo salário devido ao profissional discriminado. O valor dobra em caso de reincidência. O pagamento de multa e das diferenças salariais não impedirá a possibilidade de indenização por danos morais à trabalhadora.
A medida altera a orientação prevista na reforma trabalhista, aprovada durante o governo de Michel Temer (MDB), que prevê multa fixada pelo juiz diante de comprovada discriminação por motivo de sexo ou etnia, em favor do empregado prejudicado, com o 50% do valor do limite máximo do Regime Geral de Previdência Social, atualmente em R$ 3.753,74.
O substitutivo recebeu 325 votos favoráveis e 36 contrários após negociação entre os líderes partidários. O avanço de medida tem um caráter simbólico e efetivo para a maior parte das pessoas em condições de votar no país, conforme aponta a Secretária de Relações de Gênero da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), Berenice D’Arc Jacinto.
“Um PL como esse só pode existir em em um governo democrático e popular. As mulheres são maioria votante e, portanto, a maior parte entre os que elegeram esse governo, que deve manter um compromisso conosco. Todo projeto que avança para possibilitar políticas que melhorem condições das mulheres são fundamentais”, diz.
Apesar do acordo entre líderes, representantes da oposição ao governo federal criticaram a medida. Com a mesma lógica utilizada por quem ataca direitos trabalhistas sob o argumento mentiroso da geração de empregos para aprovar a reforma trabalhista, parlamentares da base do governo apontam que a igualdade irá gerar rebaixamento salarial.
“O que vocês acham que o empregador vai fazer? Subir o salário do homem ou reduzir o salário da mulher? É óbvio: infelizmente vai ser nivelado por baixo, em prejuízo da mulher. Esse projeto bota nas costas do empreendedor uma série de responsabilizações e multas que vão inibir a contratação das mulheres”, disse o deputado Gilson Marques (Novo-SC) durante a discussão da proposta, na quarta.
Luta continua – Com a implementação de mecanismos que facilitam a fiscalização do Ministério do Trabalho e Emprego, o substitutivo aprovado também determina a publicação semestral de relatórios de transparência salarial e remuneratória.
A ferramenta para combater questões ligadas ao machismo, como a divisão desequilibrada dos cuidados com a família, porém, não é suficiente para mudar a situação da diferença entre homens e mulheres no mercado de trabalho, conforme destacou a ministra das Mulheres, Cida Gonçalves, em participação na Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher na Câmara dos Deputados, no último dia 10.
“É preciso ter uma discussão com a sociedade e também sobre a política de cuidados.
De que forma vamos poder estabelecer serviços que deem conta de que a mulher poder sair para trabalhar? Porque só a creche não é suficiente. Têm outras questões associadas”, disse.
Berenice reforça a fala da ministra, mas acredita que a medida, desde que cobrada e fiscalizada pelos sindicatos, federações, confederações em defesa da classe trabalhadora, ajudará a valorizar as trabalhadoras essenciais para a formação dos cidadãos e cidadãs brasileiras.
“As professoras são maioria nos anos fundamentais e na educação infantil, em que a relação de cuidado é maior e onde os salários são menores. Esse projeto será uma importante ferramenta para acabar com a diferença entre salário de professores nos diferentes níveis e por isso iremos nos debruçar neste debate para que os cuidados não sejam considerados atividades menores”, afirma a secretária da CNTE.