Escrito por: Vanessa Ramos, CUT São Paulo
Assassinatos mostram que sociedade brasileira ainda é marcada por relações transfóbicas
“Chega de migalhas, queremos a criação de leis efetivas e cidadania plena”. A afirmação, da vice-presidenta do Centro de Apoio e Inclusão Social de Travestis e Transexuais (Cais), Maite Schneider, demonstra que ainda há muita luta a ser feita para combater a violência, por oportunidades no mundo do trabalho e por reconhecimento da população transexual.
Uma das fundadoras da Associação Brasileira de Transgêneras (Abrat), Maitê, atriz e escritora transexual, sofreu vários preconceitos ao longo de sua vida até perceber a sua essência e se empoderar. Hoje, aos 45 anos, já realizou 14 cirurgias para mudar o sexo.
No país, cirurgias de mudança de sexo são realizadas pelo SUS desde 2008. Foi durante o governo Lula que o Ministério da Saúde passou a oferecer atenção às pessoas nesse processo por meio do Sistema Único de Saúde (SUS).
E foi para evidenciar a luta de pessoas como Maitê e mostrar a realidade deste segmento que o Dia da Visibilidade Trans (população que engloba travestis e homens e mulheres trans) foi criado em 29 de janeiro de 2004, também no governo do ex-presidente Lula.
A comemoração marca a luta pelos direitos humanos e o respeito à identidade, como afirma o representante do Coletivo LGBT da CUT São Paulo, Walmir Siqueira.
“Queremos chamar atenção da sociedade não apenas neste dia para falar sobre o preconceito, a discriminação, a LGBTfobia, mas sobre a transfobia, especificamente. Porque a população trans é a que mais sofre, principalmente para acessar o mundo do trabalho”, afirma o dirigente sindical, que é também professor.
No último dia 27, vários movimentos, dentre os quais a CUT, participaram da 3ª Caminhada pela Paz: Sou Trans, Quero Dignidade e Cidadania que saiu do Museu de Arte de São Paulo (Masp), na Avenida Paulista, até o Largo do Arouche, no centro da capital paulista.
Para Maitê, a população trans ainda carece de leis e políticas públicas amplas.
“Toda conquista com relação ao uso do nome social e tudo mais foram importantes, mas, repito, não queremos migalhas estatais, mas conquistas maiores. Políticas e leis que efetivamente possam garantir direitos e combater a transfobia”, propõe.
Exclusão por fatores culturais
Para a cientista social e estudante de pós-graduação em Direitos Humanos, Diversidade e violência da Universidade Federal do ABC, Leona Wolf, é preciso entender que a maior parte da população trans, dentro de um quadro de igualdade jurídica, é excluída por fatores culturais.
“O fato de a gente ter mais de 90% desta população sem acesso ao mercado de trabalho formal, encontrando na prostituição, de maneira compulsória, a única forma de conseguir sobreviver, ou mesmo se a gente pensar em toda população trans que se encontra em situação de rua, entendemos que direitos básicos como moradia ou ao trabalho não são contemplados”, afirma Leona, que também integra o Coletivo LGBT Prisma e se autodenomina mulher trans não binária.
Além disso, Leona afirma que dentro do patamar da população LGBT, os (as) trans se encontram em um quadro de genocídio.
Isso se comprova com dados do relatório da Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra). Entre janeiro e dezembro de 2017 ocorreram 179 assassinatos de travestis, mulheres e homens transexuais.
Ao falar também sobre o papel da mídia e de outros aparatos, Leona alerta sobre os cuidados necessários a serem tomados. “Temos que parar de culpabilizar a vítima dentro dos casos de violência. Vemos um genocídio esquemático que nega, de fato, o direito à vida. A marginalização desta população é um dos principais pilares a ser combatido”, conclui.