Por 10 a 1, STF reconhece o direito do fotógrafo Alex Silveira de ser indenizado
Para os ministros, o Estado deve ser responsabilizado por jornalistas feridos em manifestações. O único voto contrário foi de Kassio Nunes Marques
Publicado: 10 Junho, 2021 - 16h46 | Última modificação: 10 Junho, 2021 - 17h08
Escrito por: Redação CUT

O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu nesta quinta-feira (10), por 10 votos a favor e 1 contra, que o fotógrafo Alex Silveira tem o direito de receber indenização do estado. O repórter foi vítima de uma bala de borracha disparada por um policial militar de São Paulo, em maio de 2000, quando cobria uma manifestação de servidores públicos na Avenida Paulista. Ele ficou cego do olho esquerdo. A informação foi publicada pela da Folha de S. Paulo.
O único voto contrário ao direito do fotógrafo foi do ministro Kassio Nunes Marques, indicado para o STF pelo presidente Jair Bolsoanro (ex-PSL). Para ele, o Supremo não deveria reconhecer um direito genérico a jornalistas em casos de cobertura de manifestações públicas. “O que não se pode é, sob o argumento da liberdade de imprensa, instituir a regra abstrata de que a vítima, apenas pelo fato de ser jornalista, nunca contribuirá pelo evento danoso”, disse.
Ao contrário de Nunes Marques, a maioria dos ministros entendeu que o Estado deve ser responsabilizado por jornalistas que são feridos durante a cobertura de manifestações públicas.
Como o julgamento tem repercussão geral, a decisão dos ministros vale para todas as ações similares que estão tramitando no Judiciário.
O caso chegou ao STF depois do Tribunal de Justiça de São Paulo considerar o próprio fotógrafo culpado, por estar no meio do tumulto, colocando-se "em situação de risco ou de perigo".
“Chega a ser quase bizarro” culpar o fotógrafo por ter levado o tiro, disse a ministra Cármen Lúcia.
Para o ministro Marco Aurélio, o TJ-SP “violou o direito ao exercício profissional, no que assentada a culpa exclusiva da vítima”.
“Ao atribuir à vítima, que nada mais fez senão observar o fiel cumprimento da missão de informar, a responsabilidade pelo dano, o Tribunal de Justiça endossou ação desproporcional, das forças de segurança, durante eventos populares. Marco Aurélio
21 anos de luta por justiça
O fotógrafo entrou com uma ação na Justiça para reparar ao menos parte dos danos causados. Em fevereiro de 2008 conseguiu uma decisão favorável em primeira instância - o estado de SP foi condenado a ressarcir despesas médicas e o pagar 100 salários mínimos por danos morais ao fotógrafo.
O Tribunal de Justiça de São Paulo, no entanto, decidiu rever a decisão e em agosto de 2014, afirmou que a culpa pelo acidente foi do próprio Silveira porque ele “permaneceu no local de tumulto” e, com isso, “colocou-se em quadro no qual se pode afirmar ser dele a culpa exclusiva do lamentável episódio do qual foi vítima”.
Alex Silveira recorreu ao STF depois que a 1ª turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), com base no voto do ministro relator Gurgel de Faria, também negou o recurso.
O julgamento em plenário virtual no STF começou em agosto de 2020, mas foi suspenso após pedido de vista do ministro Alexandre de Moraes, que devolveu o processo em novembro do mesmo ano.
Categoria se une para defender direitos
Jornalistas e organizações que atuam em defesa do jornalismo e dos direitos humanos acompanharam de perto o julgamento. O grupo Fotógrafos Pela Democracia faz campanha nas redes sociais pedindo justiça para o companheiro.
Em uma carta aberta enviada aos ministros do Supremo, vários jornalistas afirmam que o julgamento é um momento crucial para corrigir "uma grave injustiça que marca um dos episódios mais emblemáticos de violência contra comunicadores em contexto de protestos no país".
A carta já foi assinada por 16 organizações, entre elas a Artigo 19 e a Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) -amicus curiae (amigo da corte) no caso.
“Quando a polícia extrapola suas prerrogativas e reprime violentamente manifestantes e comunicadores, ignorando direitos consagrados pela Constituição Federal, é dever do Judiciário zelar pela garantia desses direitos, o que passa pela reparação das vítimas e pela responsabilização dos órgãos de segurança pública”, diz o texto.