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Por que o caso de Lula durou menos de 2 anos e o do tucano Azeredo 11 anos?

Acusado em 2007, o ex-governador tucano manobrou e contou com a boa vontade da Justiça. Agora, pode ser atingido pelas prisões em segunda instância

Publicado: 13 Abril, 2018 - 12h28 | Última modificação: 13 Abril, 2018 - 12h40

Escrito por: Miguel Martins, da Carta Capital

Ricardo Stuckert/Instituto Lula e José Cruz/Agência Brasil
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Eduardo Azeredo, ex-governador de Minas Gerais pelo PSDB, comparou-se a Lula em 2014, quando estava prestes a ser alvo de um julgamento no Supremo Tribunal Federal (STF) sobre sua participação no chamado "mensalão" tucano. Ele afirmou que, assim como o ex-presidente não foi responsabilizado pelo esquema, ele também não poderia ser.

Lula não foi responsabilizado diretamente no "mensalão", mas já foi acusado, condenado em duas instâncias e preso no caso do tríplex. Entre a apresentação da denúncia, em setembro de 2016, e o início do cumprimento da pena do ex-presidente, passaram-se apenas 1 ano e 7 meses.

Enquanto o ex-presidente cumpre pena em um processo recorde, o ex-governador tucano sofre grande risco de ser preso. Em 24 de abril, serão julgados os embargos infringentes de sua condenação em segunda instância no Tribunal de Justiça de Minas Gerais. Se tiver o recurso negado pelo tribunal, Azeredo deve ser preso 11 anos após a apresentação da primeira denúncia contra ele.

O tucano foi condenado em segunda instância na Justiça estadual em agosto de 2017. O Tribunal de Justiça de Minas Gerais determinou uma pena de 20 anos e 10 meses ao ex-governador, que é acusado de ter recebido, em 1998, 3,5 milhões de reais de recursos desviados de estatais mineiras para abastecer sua campanha à reeleição. Ele foi derrotado nas eleições de 20 anos atrás pelo ex-presidente Itamar Franco. Como houve divergência entre os desembargadores que julgaram seu caso, ele tem direito a um novo julgamento no TJ de Minas.

Ele aguarda, assim como Lula, uma possível votação no Supremo Tribunal Federal das Ações Declaratórias de Inconstitucionalidade que questionam as prisões em segunda instância. Caso o STF mude o entendimento e volte a exigir o trânsito em julgado, tanto o petista como o tucano seriam beneficiados.

Ocorre, porém, que Azeredo há muito se beneficia da tradicional lentidão do judiciário, tipicamente sonolenta em casos que envolvem tucanos. Ele não foi contemplado apenas pela letargia da Justiça estadual. Seu caso reflete uma certa boa vontade do STF com manobras heterodoxas de alta plumagem, algo incomum em casos envolvendo o PT.

Apresentada em 2007, a denúncia sobre crimes ocorridos há 20 anos foi aceita pela STF apenas em 2009. À época, Azeredo era senador por Minas Gerais. Por ter foro privilegiado, seu caso foi analisado diretamente pelo Supremo, a exemplo do "mensalão" do PT, que também tinha como pivô o publicitário Marcos Valério. Enquanto o julgamento de líderes petistas como José Dirceu e José Genoíno ocorreu em 2012, a Corte só preparou-se para deliberar o caso do ex-governador dois anos depois.

Em 2014, Rodrigo Janot, então procurador-geral da República, apresentou uma denúncia contra o tucano e um pedido de 22 anos de prisão. A acusação estava prestes a ser analisada pela Corte, quando o já deputado federal Azeredo decidiu renunciar.

Tratava-se de uma manobra para escapar do iminente julgamento e protelar o caso, que recomeçaria na primeira instância. O relator do caso no Supremo, o ministro Luís Roberto Barroso, votou por permitir a remessa da ação ao primeiro grau, assim como a maioria da Corte. À época, Barroso chegou a propor uma nova regra para que políticos não renunciem com o objetivo de empurrar seus casos na Justiça.

Lula seguiu caminho oposto. Ao contrário de Azeredo, seu processo começou na primeira instância, na 13ª Vara Federal de Curitiba, sob os cuidados do juiz Sérgio Moro. Antes mesmo de a primeira denúncia da Operação Lava Jato contra o ex-presidente ser apresentada, a Justiça impediu Lula de seguir o caminho inverso do tucano: ao ser nomeado por Dilma Rousseff como ministro-chefe da Casa Civil, o petista em tese saía dos cuidados da primeira instância para os do STF.

No caso do petista, sua nomeação foi barrada por uma série de movimentos da Justiça. Em primeiro lugar, a liberação de um áudio gravado em horário irregular de uma conversa entre Lula e Dilma, na qual eles negociavam a entrega de um termo de pose ao novo ministro. O áudio foi um dos elementos que levaram Gilmar Mendes a impedir a nomeação do ex-presidente.

Não é apenas no STF que a Justiça deu um pouco mais de tempo a Azeredo. Lula foi condenado em segunda instância em janeiro deste ano, apenas 6 meses após a condenação de Moro, que ocorreu em julho de 2017.

Já a análise do caso de Azeredo no segundo grau levou 20 meses após a condenação na primeira instância, mais tempo que levou a Justiça a aceitar a denúncia, condenar em duas instâncias e prender o petista. O ex-governador ainda teve outra vantagem: ao contrário do ex-presidente, foi beneficado pela divergência dos desembargadores e teve direito aos chamados embargos infringentes, que autorizam um novo julgamento da Corte.

A depender da confirmação da condenação, Azeredo pode enfim ser preso. Mas não seria surpreendente se conseguisse esticar a corda um pouco mais. Mesmo que seja detido, ele pode recorrer a tribunais superiores e se beneficiar de uma eventual prescrição do caso. O ex-governador completa 70 anos neste ano, o que pode levar à extinção de sua pena.

Azeredo pode ser o primeiro tucano de relevância a ser preso no País. Outros integrantes do PSDB não parecem sofrer grandes ameaças por ora. Geraldo Alckmin, agora ex-governador de São Paulo e pré-candidato à presidência pelo PSDB, descompatibilizou-se de seu cargo e tornou-se um potencial alvo da primeira instância, já que é citado em casos da Lava Jato investigados em São Paulo. O caso foi, porém, remetido à Justiça Eleitoral, onde as penas são sempre mais brandas.

Com tantas situações vantajosas para Azeredo e seus correligionários, talvez ainda seja cedo para o ex-governador perder a esperança de não ser preso.