Escrito por: Redação RBA

Povo Guarani ocupa rodovia em protesto contra o PL 490. ‘Demarcação já’

Com cantos, cartazes e pedidos de “Fora Bolsonaro”, indígenas chamaram a atenção de quem passava pela rodovia dos Bandeirantes, em São Paulo, nesta sexta (25), em manifestação contra o PL 490

Ana Flávia Carvalho/Reprodução

A comunidade Guarani Mbya da Terra Indígena do Jaraguá, localizada na zona noroeste de São Paulo, amanheceu nesta sexta-feira (25) sob protesto contra o Projeto de Lei (PL) 490/2007, aprovado nesta semana pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados. Considerado uma ameaça pela comunidade, o chamado “PL da morte” praticamente inviabiliza a demarcação de terras indígenas, coloca em risco os povos isolados, além de abrir o território para exploração de atividades comerciais.

De acordo com a liderança da aldeia do Jaraguá, Sonia Ará Mirim, para chamar a atenção da população quanto aos retrocessos do PL, os indígenas decidiram ocupar, por volta das 6h, uma das pistas da rodovia dos Bandeirantes, no sentido capital, altura do quilômetro 20, próxima à comunidade. A faixa ficou interditada por cerca de duas horas e foi liberada às 8h25. No local, faixas e cartazes de protesto foram estendidos e, entre os cantos sagrados evocados, o povo guarani cobrava por “Fora Bolsonaro” e “Demarcação Já”.

A manifestação também prestou apoio aos 850 indígenas, de todas as regiões do Brasil, que acamparam por 16 dias em Brasília para lutar contra a proposta. A mobilização conseguiu inclusive adiar a votação do PL na comissão, mas também foi alvo da repressão policial, na terça (22), e de ataques com bombas de gás lacrimogêneo no dia 16. O ato dos guarani também ocorre na esteira da nomeação do novo ministro do Meio Ambiente, Joaquim Álvaro Pereira Leite, indicado pelo presidente da República à chefia da pasta após a saída de Ricardo Salles.

Os temores

Ligado à entidade que apoiou a “boiada” do agora ex-ministro, Pereira Leite também integra uma família de fazendeiros de café de São Paulo que pleiteia um pedaço da TI do Jaraguá. Os Pereira Leite ainda são acusados, como mostra documento da Funai, de destruir a casa de uma família da comunidade. Os guaranis agora temem que essa influência possa ameaçá-los ainda mais. 

“(Salles era) um ministro omisso, que não respeitava a floresta, os animais e tudo que havia dentro dela.  E hoje, infelizmente, Bolsonaro coloca novamente um ministro que também não vai nos respeitar, vai lutar para que a comunidade sofra algum tipo de repressão. Há dois dias já começaram a atacar a aldeia Xakriabá. Então, nós não temos mais o que fazer, precisamos realmente que a população nos apoie. A luta indígena é uma luta de todos nós. Não estamos mais em 1500, mas estamos vivendo como se estivéssemos”, lamenta Sonia Ará Mirim em entrevista à Marilu Cabañas, do Jornal Brasil Atual.

Não ao marco temporal

A Terra Indígena do Jaraguá conta, ao todo, com seis aldeias, mas apenas um território pertencente a elas foi demarcado, ainda em 1987. Os outros cinco, de acordo com a liderança, ainda estão em processo de reconhecimento, atualmente feito pela Funai. Paralisada desde o início do governo Bolsonaro, em 2019, a demarcação é ameaçada agora pela tese do “marco temporal”, incluída também no PL 490.

O marco temporal impõe que o processo de demarcação seja restrito àquelas terras que já estavam ocupadas pelos povos tradicionais em 5 de outubro de 1988, data de promulgação da Constituição Federal. O que, na prática, torna ainda mais difícil a demarcação. A tese irá a julgamento na próxima quarta (30) no Supremo Tribunal Federal (STF), que definirá o futuro das demarcações de terras indígenas no país. A expectativa é que o Supremo barre o marco temporal.

“A nossa aldeia faz parte disso, da vida da floresta, uma vida que a gente respeita. Quando falamos que precisamos de terra, não é para construir casa, ganhar dinheiro. Falamos isso porque precisamos preservar o que o Criador criou. Este é o motivo pelo qual falamos que precisamos das nossas aldeias em pé, que precisamos preservar. A cultura está viva”, destaca Sonia Ará Mirim. “É muito grave o que está acontecendo conosco em relação a um governo que não nos respeita.”