Escrito por: Redação CUT
Projeto de Lei de 7 deputados do PSOL e do PT quer acabar com pena de prisão para quem furta para comer ou dar comida para a família
Está tramitando na Câmara dos Deputados um projeto de lei que impede a prisão de pessoas em situação de extrema pobreza, que furtam comida para satisfazer a própria necessidade ou a de sua família. A medida também valeria para quem furta bens de valores insignificantes. Este é o chamado furto famélico.
O Projeto de Lei (PL) Nº 4.540/21 pretende alterar o parágrafo 2º do artigo 155 do Código Penal e deve apreciado pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara. A proposta está apensada ao PL 1244/11 e poderá ser votada no Plenário se for aprovado requerimento de urgência.
Assinam o projeto de lei, que tem o apoio de defensores públicos e instituições, as deputadas Talíria Petrone (PSOL/RJ), Natália Bonavides (PT/RN), Sâmia Bomfim (PSOL/SP), Vivi Reis (PSOL/PA), Fernanda Melchionna (PSOL/RS) e, Áurea Carolina (PSOL/MG), e os deputados Glauber Braga (PSOL/RJ) e Ivan Valente (PSOL-SP).
A proposta também determina que a ação penal em caso de furto só será levada adiante mediante queixa do ofendido. O texto determina que o juiz, caso não possa absolver o autor, deverá aplicar uma pena restritiva de direitos ou multa, sem prisão.
Na enquete sobre o PL que está na página da Câmara dos Deputados, a maioria dos que responderam são contra a proposta, com alegações de que nenhum tipo de roubo deve ser aceito ou que “esse tipo de lei fará com que empresas fechem suas portas”.
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O Código Penal já permite livrar de punição os crimes cometidos em estado de necessidade, caso que abrange o crime famélico. Mas, segundo os autores do projeto, o Judiciário tem interpretação restrita do princípio e mantém encarceradas pessoas que furtaram alimentos ou valores muito pequenos. Por isso, cabe ao Legislativo aperfeiçoar a lei para garantir que não haja injustiças.
“A prática judiciária cotidiana se depara com inúmeras situações de furtos motivados por necessidades materiais urgentes, e muitas vezes se recusa, sob variados argumentos, a reconhecer a situação de necessidade do autor”, dizem os autores.
Na justificativa do projeto, os deputados citam exemplos como o caso que ocorreu em meio ao auge da pandemia do coronavírus, quando o Tribunal de Justiça de São Paulo manteve preso um homem acusado de furtar uma cartela com barbeadores no valor de 22,56 reais. A decisão dos desembargadores do TJ-SP contrariou recomendação do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que previa a liberdade de presos em grupo de risco e crimes mais leves.
Outro caso citado pelos deputados ocorreu no Rio Grande do Sul, quando o Ministério Público do estado recorreu contra uma decisão que absolveu dois homens acusados de roubar alimentos vencidos no pátio de um supermercado no valor de R$ 50. Eles relembram ainda de um episódio recente sobre prisão mantida por mais de cem dias de uma diarista por furto de água. Quando foi presa ela estava com o filho de cinco anos.
Além disso, os autores destacam que o furto é um crime sem características violentas, que responde cerca de 11% da população carcerária (cerca de 61 mil presos) e, em grande maioria, negros.
Em entrevista ao Valor, a advogada Marcia Dinis, presidente da comissão de criminologia e membro da comissão de Direito Penal do Instituto dos Advogados Brasileiros (IAB), ressalta que o sistema punitivo acaba sendo seletivo e racista e que essas hipóteses de furto acabam tendo como consequência a prisão de pretos e pobres, que passam a ser estigmatizados.
A Defensoria Pública da União (DPU) enviou uma nota técnica favorável a projeto de lei. No documento, a DPU afirma que mais de 30 mil pessoas estão presas no país por furto simples, segundo o Departamento Penitenciário Nacional (Depen). E acrescenta que o custo médio de um preso é de R$ 2,4 mil por mês, o que – somado aos atos processuais – representa um custo mensal superior a R$ 160 milhões mensais aos cofres públicos. Segundo a defensoria, o sistema carcerário está sobrecarregado e as pessoas que cometeram furto simples – sem uso de violência ou grave ameaça ao patrimônio – estão muitas vezes em situação de vulnerabilidade.
Em agosto, a CCJ analisou tema semelhante. Rejeitou o Projeto de Lei nº 1.878/07, de autoria do deputado Carlos Bezerra (MDB-MT), para que o Juizado Especial Criminal passasse a ser competente para definir multa a ser aplicada para casos de furto de pequeno valor. O autor do projeto defendia que, na maioria das vezes, tratam-se de crimes de menor potencial ofensivo.
Porém, os integrantes da comissão seguiram o parecer do relator, deputado Delegado Pablo (União-AM), que pediu a rejeição do PL 1878. Para ele, a proposta representa um desrespeito à luta travada por legisladores de combater e punir o criminoso, de acordo com a natureza do crime praticado.
Com a decisão da CCJ, a matéria do PL 1878 será arquivada pela Câmara dos Deputados, exceto que haja recurso para análise do Plenário.
Com informações da Agência Câmara e do Valor.