Escrito por: Redação CUT
PL aprovado retira assentamentos da reforma agrária e comunidades quilombolas da prioridade de comercialização de alimentos para a merenda escolar. Além disso, beneficia indústria de laticínios e frigoríficos
A Câmara dos Deputados aprovou na quinta-feira (6) mais um Projeto de Lei (PL nº 3292/2020) que prejudica a agricultura familiar brasileira e beneficia a indústria de laticínios e frigoríficos.
De autoria do deputado bolsonarista Major Vito Hugo (PSL-GO), o projeto visa criar uma cota para a aquisição de leite líquido para a merenda escolar. Retira também a prioridade de aquisição de alimentos produzidos por assentamentos da reforma agrária e comunidades indígenas e quilombolas para a mesma finalidade.
Além de acabar com a prioridade, o texto do substitutivo do também deputado bolsonarista Carlos Jordy (PSL-RJ), permite a inclusão de alimentos produzidos pela indústria agropecuária nos cardápios das escolas.
Atualmente, a Lei 11.947/09, que mantém o programa de merenda escolar em pé, prevê o uso de um mínimo de 30% dos recursos da merenda escolar para a compra de gêneros alimentícios produzidos diretamente pela agricultura familiar ou empreendedor familiar rural, com prioridade para os assentamentos da reforma agrária, comunidades indígenas e quilombolas, justamente os que mais dependem da comercialização de sua produção para sobreviver.
Pela característica arquitetada pelo autor e pelo relator da proposta, o PL acaba abrindo espaço para que setores da indústria alimentícia – frigoríficos e de laticínios – tenham espaço garantido de comercialização de seus produtos no Programa Nacional de Alimentação Escolar (Pnae), em detrimento dos pequenos produtores locais, da agricultura familiar, em especial dos mais pobres, e que compõem o cardápio elaborado pelas escolas.
Em entrevista ao Brasil de Fato, a nutricionista e mestre em Nutrição em Saúde Pública, Vanessa Manfre, afirmou que a alteração arbitrária no cardápio, que é elaborado por nutricionistas e responsáveis técnicos de acordo com a realidade de cada região, também fere as diretrizes do Pnae.
“O Estado não pode adotar qualquer medida que possa resultar na privação do fornecimento da alimentação adequada e saudável, e deve agir para impedir que pessoas, grupos ou empresas atuem para violar este direito".
É um risco para o Pnae e para a Agricultura Familiar, diz a secretária de Política Agrícola da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag), Vânia Marques Pinto.
“O PL cria uma reserva de mercado para o leite fluido e tira a autonomia de estados e municípios na elaboração da merenda escolar”, ela afirma.
Ela reforça que o Pnae é importante para a soberania alimentar brasileira, porque atende cerca de 41 milhões de estudantes e beneficia os pequenos produtores. “Se a intenção é ajudar [outros setores], existem outros caminhos, como ampliar recursos da Política de Garantia de Preços Mínimos (PGPM) para a compra de leite, fortalecendo quem produz e distribuindo para quem tem fome”.
A crítica principal de parlamentares contrários ao projeto é de que a proposta vai tirar a autonomia para a compra da merenda escolar.
No caso do leite, ao definir que 40% dos recursos repassados pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) sejam destinados à compra do produto líquido, o projeto acaba criando dificuldades de orçamento para os gestores locais.
O que ocorre é que esses recursos são geridos pelas escolas que, de acordo com os argumentos da oposição, não vão conseguir, com o orçamento que têm, comprar o produto por um preço razoável.
O texto do projeto dispensa a necessidade de licitação para a compra e, assim, os preços devem se elevar.
“O leite vai deixar de ser comprado por muitas escolas e municípios”, disse a Deputada Federal Professora Dorinha (DEM-TO), durante a sessão de votação.
Aprovado com 243 votos a favor e 177 contra, o PL segue para votação no Senado. A luta das entidades que representam a Agricultura Familiar como a Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura Familiar (Contraf-Brasil) e a Contag vai ser de pressão a Senadores para que não aprovem o projeto.
As entidades lançaram uma nota pública contra o projeto, Já foram também coletadas mais de 23 mil assinaturas em uma petição que segue aberta a adesões. Acesse aqui.