Escrito por: Rosely Rocha

Projeto de emprego precário do governo pode tirar jovens da escola, diz Sérgio Nobre

Relator da MP nº 1045 cria emendas para gerar empregos com baixos salários e sem direitos para os jovens. Presidente da CUT e entidades educacionais criticam as medidas que podem tirar os jovens da escola

Roberto Parizotti (Sapão)
Presidente da CUT em manifestação antes da pandemia

Sem ter apresentado sequer um programa de geração de emprego decente, com carteira assinada e com direitos trabalhistas, em dois anos e oito meses de gestão, o governo de Jair Bolsonaro (ex-PSL) atira para todos os lados e quer aprovar de qualquer jeito programas que exploram ainda mais o trabalhador. Como disse durante as eleições, Bolsonaro quer aprofundar a reforma Trabalhista, de 2017, de Michel Temer (MDB-SP), que legalizou o bico, o trabalho intermitente e retirou cerca de cem itens da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).

O novo ataque está contido na Medida Provisória (MP) nº 1045, que em tese era para tornar permanente o programa de redução de jornadas e salários e a suspensão temporária de contratos de trabalho, quando houvesse calamidade pública, como no caso da pandemia do novo coronavírus. No entanto, o relator da MP, deputado Christiano Aureo (PP-RJ ), acatou o pedido do ministro da Economia, o banqueiro Paulo Guedes, e incluiu em seu relatório os chamados “jabutis” – emendas que nada têm a ver com a proposta original.

Com os “jabutis”, a MP se tornou uma minirreforma trabalhista. A CUT já se manifestou contrária e disse que vai lutar para derrubar. Entidades ligadas à área da educação também se manifestaram contra a MP, que segundo os dirigentes, pode aumentar a evasão escolar porque não estabelecem ligações com as instituições de ensino, além de não atender às necessidades das empresas. 

O presidente da CUT, Sergio Nobre, diz que a entidade e as demais centrais  já conversaram com o relator da MP sobre a preocupação com as emendas que não resolvem o problema da geração de emprego no país e ainda prejudicam a educação formal, especialmente dos mais jovens.

“Os jovens têm de estudar para se desenvolverem profissionalmente, estabelecer uma carreira, estruturar a vida com emprego de qualidade para que possam sustentar mais tarde uma família”, diz o presidente da CUT.

O governo não pode estimular emprego precário, precisa dar condições para que os jovens fiquem nas escolas. E a nós, cabe lutar por isso- Sergio Nobre

Até os empresários, que supostamente seriam beneficiados, são contra a proposta. O Centro de Integração Empresa-Escola (Ciee) disse ao jornal Folha de São Paulo, que se uniu a outras entidades, como a Federação Brasileira de Associações Socioeducacionais de Adolescentes (Febraeda ) e a Associação de Ensino Social Profissionalizante (Espro) para fazer uma nota contra as propostas, e o grupo está conversando com parlamentares antes da votação da MP.

Isto porque dentro do texto está a criação de dois programas destinados à geração de emprego de jovens de 19 a 24 anos; pessoas desempregadas há mais de dois anos, ou beneficiários de programas federais de transferência de renda.

Exploração da mão de obra

A pegadinha como sempre é a de retirar direitos desses trabalhadores para que empresas possam exercer livremente a exploração da mão de obra, num momento de crise em que as pessoas estão desesperadas, precisando de um emprego para sobreviver e evitar a fome que já atinge 55,2% da população brasileira.

Uma das propostas que o Congresso Nacional vai analisar é o “Programa Primeira Oportunidade e Reinserção no Emprego (Priore)”, que tira direitos dos trabalhadores ao prevê:

1 – redução de 8% para 2% do recolhimento do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS); e.

2 - o “Regime de Qualificação (Requip)”, que estabelece empregos sem contrato de trabalho, sem férias, FGTS e contribuição previdenciária, entre outros direitos. Esse regime não caracteriza a contratação como uma relação de trabalho. Os pagamentos são chamados de Bônus de Inclusão Produtiva (BIP) e de Bolsa de Incentivo à Qualificação (BIQ).

O problema de geração de empregos para os jovens é grave, diz Sergio Nobre, ressaltando que a solução não é desestimular a educação formal. Uma pesquisa do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), mostra que 42,8% dos jovens, entre 18 e 24 anos, já pararam de frequentar a escola para procurar trabalho e/ou trabalhar.

O mercado de trabalho brasileiro tem outro problema, diz o dirigente, afirmando que os empregos que o país está gerando são poucos diante da necessidade. São quase 15 milhões de desempregados, sem contar os desalentados, os que gostariam de trabalhar mais, mas não conseguem, e os que estão fazendo bico.

Para o presidente da CUT, uma das causas desta crise foi o fim do Ministério da Indústria e Comércio, promovido no governo Bolsonaro.

“É preciso emprego decente na indústria, no comércio e nos serviços, com carteira assinada, para o país voltar a crescer. O Brasil só crescerá com investimento, com valorização dos salários, mas o governo em vez de corrigir a rota, continua precarizando o trabalho”, diz.

Qualquer oportunidade de trabalho é importante, mas emprego precário não faz o país crescer. É preciso emprego com qualidade, com proteção social e  previdência, mas o governo mente para o povo dizendo que a CLT sai cara para as empresas e por isso elas não empregam- Sergio Nobre

Como prova de que emprego precarizado não cria vagas de trabalho, o presidente da CUT ressalta outro estudo do Dieese, que demonstra que a reforma Trabalhista, não criou os seis milhões de empregos prometidos à época. Ao contrário, só destruiu o trabalho.

O estudo mostra que quando a reforma Trabalhista passou a vigorar, no 4º trimestre de 2017, a taxa de desocupação estava em 11,8%. Dois anos depois, nos últimos três meses de 2019, pouco antes do início da pandemia, o desemprego tinha caído apenas 0,8 ponto percentual. Hoje este índice está em 14,7% - um aumento de 2,9 %, em menos de cinco anos. 

Leia mais: Entenda porque desemprego entre jovens é mais que o dobro da taxa geral

*Edição: Marize Muniz