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Quilombolas denunciam crimes ambientais no Pará

Vazamento de rejeitos da mineradora norueguesa Hydro Alunorte polui rios e igarapés da região

Publicado: 05 Março, 2018 - 19h33 | Última modificação: 05 Março, 2018 - 19h47

Escrito por: CUT Nacional

Foto: Ascom/Semas
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Moradores quilombolas denunciam pelo menos 15 vazamentos na cidade de Barcarena, no Pará, desde a inauguração da Hydro Alunorte, em 1995. A mineradora é uma empresa de economia mista, controlada pelo governo da Noruega que tem a maioria das ações. O último vazamento nas barragens de rejeitos de bauxita da mineradora foi em fevereiro deste ano.

Já a comunidade quilombola de Burajuba, que fica próxima à mineradora e é uma das afetadas pelo vazamento, tem mais de 200 anos. Antes da Hydro se instalar na região, viviam na comunidade mais de 220 famílias e a renda vinha por meio da pesca de peixe e camarão, e do cultivo de frutas, como o açaí, castanha do Pará, uxi e pupunha, vendidos nos mercados de Belém.

A luta da comunidade começou desde a instalação do pólo industrial, na década de 1980, quando o governo estadual criou a Codebar (Companhia de Desenvolvimento de Barcarena) e praticamente expulsou as famílias da região com indenizações irrisórias, conta Arnaldo Lobo Martins, tesoureiro da Associação dos Moradores Quilombolas da Comunidade de Burajuba.

“Mais de 90% eram analfabetos. O governo da época chegou a prometer a construção de casas, mas fizeram umas dez, no máximo, e o povo teve de construir com seu próprio dinheiro. Como era pouco, acabou”.

“Pelo menos 15 pais de família se suicidaram e muitos jovens foram para as drogas e a prostituição”, lamenta Arnaldo.

A maioria não era mão de obra qualificada, não podia mais se sustentar da terra e não tinha onde viver. Foi então que começou a voltar para o entorno do pólo industrial na década de 1990.

Enquanto os quilombolas se apossavam de suas terras nas áreas não utilizadas pela Hydro Alunorte, a empresa fazia de tudo para afastá-los.

“Derrubavam casas e plantações, passavam o trator em cima de tudo”, conta Arnaldo.

Somente em 2000, com a entrada de uma ação na Justiça, que recebeu o apoio do Ministério Público Federal e da Procuradoria Geral da República, é que um geólogo confirmou, por meio de peças coletadas no subsolo (panelas, tigelas de barros, entre outros instrumentos), que a terra pertencia à comunidade quilombola há pelo menos 200 anos. Assim, a população pôde voltar à região.

Mas era tarde demais. A Hydro já havia poluído o rio Murucupi, que corta a comunidade. A nascente do Rio fica a 50 metros da Bacia, que recebe os rejeitos diretamente quando transborda.

“Sem peixes e sem camarão, além das fruteiras que também não davam mais frutos, contaminadas pela soda cáustica”, lamenta Arnaldo.

Até agora a comunidade não recebeu nenhuma indenização da Hydro, mesmo com a multa aplicada pela Justiça, em 2009, de R$ 15 milhões, por outro vazamento.

“O que nós queremos é um projeto de desenvolvimento sustentável para que a gente possa voltar a viver da pesca, da roça. Queremos a despoluição do Rio, um tratamento de esgoto e que a Hydro indenize a comunidade. Queremos uma vida mais digna”, finaliza o tesoureiro da Associação dos Moradores Quilombolas da Comunidade de Burajuba.

O caso
O último vazamento provocado pelo Hydro Alunorte, que processa metais pesados e geram resíduos que contêm elementos tóxicos como chumbo, mercúrio e alumínio, foi detectado nas barragens de rejeitos de bauxita da mineradora, no dia 17 de fevereiro, pelos moradores de Barcarena (PA).

Os produtos químicos vazaram por meio de uma ligação clandestina para eliminar a bauxita e soda cáustica produzidas pela empresa. Esses metais causaram ânsia de vômito, diarreia e coceira na pele dos moradores locais. Uma lama vermelha afetou os rios e igarapés das áreas das comunidades, após uma forte chuva.

Hydro Alunorte é multada em R$ 20 mi e produção, reduzida
Após o último vazamento, o Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) multou a mineradora em R$ 20 milhões (R$ 10 milhões por realizar atividade potencialmente poluidora sem licença válida da autoridade ambiental competente e outros R$ 10 milhões por operar tubulação de drenagem também sem licença). Também embargou o Depósito de Rejeitos Sólidos n° 2 (DRS-2) e a tubulação de drenagem de efluentes da empresa, em Barcarena.

O Tribunal de Justiça do Pará (TJ-PA) proibiu o funcionamento de uma das bacias da mineradora, determinou a redução em 50% da produção da empresa e estipulou multa de R$ 1 milhão por dia caso a Hydro Alunorte desrespeite a decisão.

Por enquanto, a Hydro, cujo acionista majoritário e controlador da empresa é o governo norueguês, está oferecendo apenas água potável para mais de 400 famílias que vivem em três comunidades próximas à mineradora.