Escrito por: Luiz Carvalho
Para juízes do trabalho, instâncias trabalhistas podem atuar para preservar direitos
Os parlamentares vendidos aos empresários que financiam as campanhas eleitorais esperavam diminuir processos contra maus empregadores que descumprem a legislação trabalhista.
Mas a aprovação do PLC 38/2017 (Projeto de Lei da Câmara), medida que implementa a Reforma Trabalhista e sacramenta o fim da CLT, na noite desta terça-feira (12), pode produzir um efeito contrário, conforme afirmam juristas ouvidos pelo Portal da CUT.
O presidente da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), Guilherme Feliciano, acredita que a farta cesta de pontos contrários à Constituição produzirá o efeito contrário ao esperado.
“Se os apoiadores da reforma achavam que isso iria reduzir a litigiosidade e aumentar a segurança jurídica, temo que venham a se decepcionar nos próximos anos. Uma ruptura dessa natureza com o que era historicamente o direito do trabalho vai gerar o contrário, aumento de litigiosidade, aumento de demandas e de insegurança jurídica até que se construa uma jurisprudência em torno dessas novas regras construídas”, disse.
Para ele, o embate em defesa da garantia de direitos constitucionais agora se dará em âmbito jurídico, mas acredita que o questionamento à aberração imposta por Temer deva ser feito ponto a ponto no Supremo Tribunal Federal (STF) e não por meio de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin).
Isso porque Feliciano acredita que uma Adin contra a lei em geral teria maior chance de ser rechaçada no Supremo e ainda limitaria a atuação dos juízes do Trabalho em primeiro grau, que podem questionar os itens do PLC e criar uma jurisprudência favorável aos trabalhadores.
“A possibilidade de se reverter a reforma toda pelo STF é remota. Melhor seria atacar pontos de inconstitucionalidade no Supremo mais patentes e permitir que a jurisprudência dos tribunais da Justiça do trabalho construam a melhor interpretação desse texto de acordo com os princípios constitucionais e que regem o direito do trabalho”, afirmou.
Maioria do Senado acovardou-se
Feliciano conta que a Anamatra esteve no dia da votação da reforma com vários senadores, em especial, os indecisos e apontou a inconstitucionalidades e os retrocessos sociais presentes na reforma.
Muitos dos parlamentares entenderam que a proposta não traria benefícios econômicos, sabiam que o projeto tinha como função tentar dar sustentabilidade ao governo moribundo, mas se apegaram à promessa de uma medida provisória de Temer para rever os pontos mais precarizantes do texto. Uma demonstração de má fé ou ingenuidade, avalia.
“O Senado é casa revisora, não me lembro de nenhuma outra situação em que tenha abdicado de seu papel constitucional para que o presidente da República cumprisse isso. Alertávamos para o risco de que o acordo construído não fosse cumprido e, de fato, hoje o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ) disse que não fez acordo algum e não tem disposição alguma de, em havendo medida provisória, aprová-la na Casa. Os parlamentares que disseram votar a favor da proposta por conta do acordo ou estavam ludibriados ou quiseram dar imagem de normalidade para nos ludibriar”, falou.
Judiciário é uma incógnita
O juiz do trabalho Hugo Cavalcanti Filho também aposta numa saída pelo Judiciário como a mais plausível. Porém, se por um lado acredita que a maioria dos juízes é contra as medidas aprovada pelo Congresso, por outro, sabe muito bem como funciona a cúpula.
Em 30 de junho, Dia Nacional de Greve Geral contra as Reformas Trabalhista e Previdenciária, Cavalcanti Filho determinou o adiamento das audiências da 12ª Vara do Recife, em respeito ao movimento grevista, e aconselhou aos servidores que não comparecessem ao trabalho.
Como resposta, o Corregedor Nacional de Justiça, Ministro João Otávio de Noronha, solicitou à presidência do Tribunal Regional do Trabalho da 6ª Região informações sobre seu comparecimento ao trabalho e registros da ausência dos servidores, além de dados estatísticos da produtividade do juiz, solicitações que não usuais.
“Não me intimidaram porque esses dados são públicos e acredito que a maioria dos juízes do Trabalho entendem que a reforma é a medida mais prejudicial à classe trabalhadora já adotada no país. Com o agravante de ser aplicada em momento de exceção, aprovada por um Congresso desmoralizado e sob comando de um governo cujo chefe está sendo denunciado por crime de corrupção e pode ser afastado a qualquer momento”, criticou.
Ele lembra que tanto o ministro do STF, Gilmar Mendes, como o presidente do Tribunal Superior do Trabalho (TST), Ives Gandra Filho são favoráveis à reforma. O segundo, inclusive, um dos idealizadores.
Diante desse cenário, ele acredita que frentes democráticas dentro dos tribunais trabalhistas possam enfrentar esse ataque a direitos fundamentais.
“Espero que maioria dos juízes do trabalho considere que o resultado do trabalho legislativo é peça inconstitucional e venha a se posicionar dessa maneira nas decisões que vierem a tomar. Inconstitucional e inconvencional, porque ofende diversas normas da OIT (Organização Internacional do Trabalho) e não deveria ter aplicação em nosso país”, defende.
Ainda sobre a OIT, o presidente da Anamatra, Guilherme Feliciano, lembra também a reforma agride normas internacionais, como apontou a própria organização.
“Como diz o artigo 7º da Constituição, a função da negociação coletiva não é rebaixar, mas promover melhores de condições. Se a reforma traz uma negociação cuja finalidade primeira é reduzir direitos, isso atenta contra ao menos três convenções das quais o Brasil é signatário. Quando isso for constatado, o Brasil, que já está numa lista para ser investigado, terá de ser responsabilizado por não cumpri com seus deveres internacionais”, explicou.
Legislativo e Executivo – Analista político do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (DIAP) Neuriberg Dias ressaltou que é possível reverter o processo em um Congresso Nacional mais progressista ou via Legislativo, desde que o próximo presidente tenha apreço pelos direitos da classe trabalhadora.
Mas isso, reforça, exige que os movimentos sindical e sociais mobilizem suas bases para colocar na Câmara parlamentares comprometidos com a defesa da democracia e da igualdade.
“As propostas podem ser revistas por meio de um projeto de lei, mas vai depender da composição do Congresso. Teria de retirar esse grupo que representa os interesses do setor empresarial e colocar mais representantes dos trabalhadores para começar a combater a reforma trabalhista. Ou editar uma medida provisória para alterar ou revogar esses pontos. Isso tudo, porém, demanda que o movimento sindical em sua base faça a resistência para que impeça a aplicação da reforma trabalhista. Restaram a frente jurídica e o sindicato para fazer resistência à lei”, definiu.