Escrito por: Isaías Dalle

Relações internacionais e integração sul-americana

Professor afirma que fortalecer a Unasul é essencial para consolidar parcerias com vizinhos

Roberto Parizotti
Romano, da UFABC: é preciso resolução política e base industrial própria

O Brasil deve colocar peso político na Unasul (União das Nações Sul-americanas) para manter a integração regional, pois do contrário o processo terá dificuldades para se manter. “Isso passa pela Unsaul, se não,  não há política nessa direção”, afirma o professor Giorgio Romano, coordenador do curso de Relações Internacionais da Universidade Federal do ABC.

Nesta semana, entre os dias 4 e 5, no Equador, acontece a Cúpula da Unasul. Na pauta, a discussão de um acordo de cooperação técnica na área de defesa, o fortalecimento da cooperação em infraestrutura e a inauguração da nova sede da entidade. O ex-presidente Lula confirmou presença.

A Unasul protagonizou intervenções diplomáticas que garantiram, por exemplo, o respeito às últimas eleições na Venezuela e uma concertação social na Bolívia, depois de grave crise em 2008 que, segundo especialistas, poderia ter derivado para uma guerra civil.

Inclusive a pauta do Mercosul, união comercial do bloco, é dependente do fortalecimento político da Unasul, diz Romano. Na sua opinião, a presidente Dilma Rousseff tem esses pontos como prioridade de sua política internacional. Mas, além dos desafios multilaterais, há questões domésticas a resolver.

Difícil avanço

“O eixo Brasil-Argentina é a âncora desse projeto. Não há muita margem de manobra no momento. Há eleições à vista na Argentina. O Brasil precisa reconquistar a área econômica. Em 2015 há poucas chances de avanço, acho difícil”, comenta. “Acho que o Brasil vai tentar pelo menos manter, mas isso passa pela Unasul”, reforça.

Romano foi um dos participantes de recente debate sobre os desafios das relações exteriores brasileiras no segundo mandato Dilma, realizado na Universidade Federal do ABC. Outro participante, o também professor da UFABC Igor Fuser, afirmou em relação à integração sul-americana que “se o governo não agir com clareza, setores privados e a mídia vão ditar ainda mais os rumos”.

Embora concorde que o governo Dilma registrou “perda de ímpeto” na integração latino-americana, Marco Aurélio Garcia diz não acreditar que esse segundo mandato vai recuar nas relações internacionais.

Inteligência política

“Haverá uma contenção econômica, mas isso não deve mudar os rumos na área”, comentou Garcia, assessor especial da Presidência da República.

“Será necessária muita inteligência política para tirar proveito dos meses e talvez do ano de dificuldades econômicas que teremos e achar possibilidades”, disse. Com a queda das transações comerciais com o exterior, Garcia sugere, como exemplo, “fazer inserção nas cadeias globais de produção”, em projetos de cooperação.

Em entrevista concedida após o debate, Romano lembrou que estratégias como a sugerida por Marco Aurélio Garcia passam pela política industrial brasileira.  “O Brasil precisa continuar investindo numa base industrial própria. O pré-sal não é a salvação da pátria, mas é uma oportunidade de fonte de investimento”.

Pactuar com as múltis

Para o professor, a tônica do período à frente deve ser pactuar transferência de conteúdo tecnológico nos acordos e contratos. E para isso é importante a busca de outros nichos. “O centro está cada vez mais na Ásia. Para o Brasil, de certa forma, as relações com a China, a Índia e a Coreia do Sul tendem a ser cada vez importantes”, lembrou.

“Na última reunião dos Bric’s, em Fortaleza (julho de 2014), a China fechou a compra de 40 aviões da Embraer e os dois países fecharam acordo para produção de satélites. Você tem um campo lá que se tornará cada vez mais importante, mas se desenvolvermos bases tecnológicas próprias. A chave é a retomada dos investimentos”, comentou

Outro exemplo positivo citado pelo professor é a compra dos caças suecos da Gripen, que inclui a transferência de tecnologia, garantida pela fabricação em solo nacional. As exigências de conteúdo local nas compras da Petrobrás e os esforços em fazer valer o programa Inovauto também são sinais nessa direção. “Mas tem de ter política. Se não tiver, as empresas não fazem”, adverte o professor. Portanto, se o governo não exigir, as intenções não sairão do papel.

Oportunidades

Pressões internas pela adoção de uma política fiscal e monetária mais austera e as disputas políticas do ano que vem podem deslocar a política externa para um plano secundária e fazê-la sumir do horizonte noticioso. Porém, Romano acredita que há pelo menos três agendas capazes de reverter essa tendência e acalorar os debates.

Uma delas é o processo de negociação de paz com as Farc’s (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia) e o governo colombiano. “Se chegarem a bom termo, serão fator de estabilidade e uma vitória dos governos progressistas”, crê.

A Conferência do Clima, que ocorre em Paris no final de 2015 terá o potencial de envolver diferentes segmentos no debate. “Vamos tratar da sustentabilidade do planeta, do futuro. Existe também a possibilidade de superação dos problemas diplomáticos com os Estados Unidos, surgidos a partir das denúncias de espionagem daquele governo sobre o nosso. “A presidenta acha que esse elemento pode transcender a ideia que as relações Sul-Sul são contra os Estados Unidos”.

Conselho de Relações Internacionais

Reivindicação dos movimentos sociais reunidos no Grupo de Reflexão em Relações Internacionais (GR-RI), a necessidade de criação de um Conselho Nacional de Relações Internacionais, composto por entidades da sociedade civil para subsidiar o governo em sua política, continua na pauta, diz Romano. “Precisamos agregar mais pessoas em torno da proposta”, explica.

Sobre qual será o futuro ocupante do Ministério das Relações Exteriores, o professor comenta: “A gente defende uma certa política, mas em relação a nomes... Não há candidatos naturais. Vamos aguardar”.