Em ano sem novas demarcações, 135 indígenas foram assassinados no Brasil
Relatório do Cimi aponta 111 casos de invasão de terras já demarcadas e homologadas
Publicado: 25 Setembro, 2019 - 10h14 | Última modificação: 25 Setembro, 2019 - 10h26
Escrito por: Rafael Tatemoto e Juca Guimarães - Brasil de Fato
O Conselho Indigenista Missionário (Cimi) lançou nesta terça-feira (24) o relatório “Violência Contra os Povos Indígenas”, com informações compiladas do ano de 2018. Os dados apontam que no ano da eleição do presidente Jair Bolsonaro (PSL), durante a gestão de Michel Temer (MDB), houve um forte movimento de ataque em diversas frentes, principalmente em relação aos territórios.
Foram assassinados 135 indígenas no ano passado, contra 110 em 2017, aumento de 25%. Houve aumento também de casos de invasão de terras já regulamentadas, de 96 para 111 (15%).
Em 2018, o presidente Michel Temer fez uma única demarcação de terra indígena, porém, a medida foi revertida na Justiça. Bolsonaro não fez nenhuma e reafirmou também nesta terça, na ONU, que não fará.
“O Cimi não faz esse lançamento com alegria, mas com dor e sofrimento. Há no Brasil uma institucionalização da violência como prática do próprio governo”, disse dom Roque Paloschi, presidente da entidade.
No, 305 povos habitam 1.229 terras indígenas. A maioria desses territórios, 66%, está em fase de reivindicação ou de regulamentação.
Com a omissão do poder público, houve aumento da grilagem, do roubo de madeira, do garimpo, das invasões e até mesmo da implantação de loteamentos em seus territórios tradicionais.
“O discurso de Bolsonaro na ONU é sinal tem que não há perspectiva. A Funai foi completamente desmontada. Dados preliminares de 2019 já indicam que houve mais invasões do que no período anterior. Todo período de construção da democracia. Agora é um período de desconstrução”, disse Roberto Antônio Liebgott, do Cimi região Sul.
De acordo com o relatório, existe um alinhamento do poder público a um modelo de gestão empresarial, por meio do qual se estabelecem bases para a desregulamentação de leis.
Os povos indígenas têm que enfrentar instituições que representam e exercem os poderes político, administrativo, jurídico e legislativo. Elas atuam, quase sempre, tendo como referência interesses marcadamente econômicos, e não os direitos individuais, coletivos, culturais, sociais e ambientais.
O levantamento do Cimi também contabiliza oito ameaças de morte e 11 conflitos por terra no ano passado.
Em Pernambuco, em menos de dois meses a Terra Indígena Pankararu de Araçuaí, do povo Pankararu, sofreu ataques que resultaram no incêndio de uma escola e do posto de saúde e na depredação da igreja católica.
Os prédios atacados estavam próximos a uma área de conflito com posseiros instalados no local. No mês de setembro, 12 famílias que moravam ilegalmente na área foram finalmente retiradas.
Álcool e descaso
Mesmo sendo proibida a venda de bebida para indígenas em todo território nacional, o Cimi apurou 11 casos de disseminação de álcool e outras drogas. Foram quatro no Acre, três no Mato Grosso, dois no Mato Grosso do Sul, um no Maranhão e outro no Tocantins.
O relatório identificou comercialização na própria aldeia. Em relação às drogas, por exemplo, na reserva de Dourados, no Mato Grosso do Sul, crianças Guarani Kaiowá, são recrutadas pelo tráfico a partir dos oito anos de idade.
“Eles [traficantes] fornecem drogas gratuitamente, viciam as crianças e depois começam a cobrar a dívida”, diz o relatório.
A bebida, de acordo com o relatório, também é apontada como um dos motivadores de violência sexual. Foram 11 estupros, uma tentativa de estupro e três casos de abusos sexuais. Dos casos de estupro, sete foram contra crianças.
A falta de assistência médica foi responsável pela morte de 11 indígenas, devido a doenças respiratórias, gripes e pneumonia. A situação se agravou depois que acabou o programa Mais Médicos.
O relatório também revela que no ano de 2018 aconteceram 101 suicídios de indígenas. Só no Mato Grosso do Sul foram 44. As vítimas tinham entre 5 e 64 anos.