Escrito por: Redação RBA

Rio de Janeiro tem 177 casos de abuso sexual em hospitais de 2015 a 2021

Acusações contra o médico anestesista Giovanni Quintella Bezerra, preso por sedar e cometer estupro durante trabalho de parto de mulheres, não são denúncias isoladas

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 O estado do Rio de Janeiro tem um estupro registrado em “hospital, clínica ou similares” a cada 14 dias. De acordo com dados do Instituto de Segurança Pública (ISP), obtidos pelo jornal O Globo, via Lei de Acesso à Informação (LAI), entre 2015 e 2021, 177 casos de abuso sexual foram denunciados às autoridades do Rio. O que equivale, em média, a uma pessoa abusada em uma unidade de saúde do estado a cada duas semanas, ao longo dos últimos sete anos. 

O maior número de ocorrências foi registrado na capital fluminense, com 80 casos do gênero, ou 45,2% do total. Ela é seguida pela cidade de Niterói, na região metropolitana, com 18 casos no mesmo período. Outros 12 denúncias foram realizadas em Duque de Caxias, na Baixada Fluminense. O município é vizinho a São João de Meriti, também na Baixada, onde o médico anestesista Giovanni Quintella Bezerra, de 32 anos, foi preso na madrugada desta segunda-feira (11) por cometer estupro durante um parto no Hospital Estadual da Mulher, em São João do Meriti. Ele foi filmado introduzindo o pênis na boca de uma paciente enquanto ela estava sedada. 

A cidade onde atuava é também a quinta com mais casos, com seis estupros em hospitais. São João do Meriti aparece empatado nessa triste estatística com São Gonçalo, que tem, no entanto, mais que o dobro de população. Os dados também mostram que as denúncias contra o anestesista não são isoladas. Dos seis casos em Meriti, dois aconteceram no bairro Vilar dos Teles, onde está a unidade de saúde que Giovanni trabalhava há cerca de dois meses. O hospital é gerido pelo governo do Rio.  Estupro de vulnerável 

O levantamento do O Globo também indica que mais da metade das ocorrência, um total de 90 casos, dizem respeito a estupros de vulnerável, crime pelo qual o anestesista foi indiciado em flagrante. Essa tipificação é prevista nos casos em que a vítima não tem necessário discernimento para a prática do ato sexual ou não é capaz de oferecer resistência. O que pode valer tanto para vítimas menores de 14 anos, independentemente de eventual anuência, quanto para vítimas incapazes de se defender por problemas de saúde ou por estarem sob influência de substâncias como álcool, drogas ou sedativos, por exemplo. 

A pena prevista neste tipo de crime é de 8 a 15 anos de prisão. Além disso, das 177 ocorrências, 37 foram contra crianças de no máximo 13 anos. E outras 10 contra adolescentes de 14 a 17. Os dados também revelam cinco ocorrências em que as vítimas eram idosos de 60 anos ou mais. A maioria dos abusos foram cometidos contra mulheres, 147 casos, no total. Em 24, as vítimas eram homens. Outras seis ocorrências o campo “gênero” consta como “sem informação”.  Crime filmado

Giovanni foi preso depois que funcionárias da unidade de saúde o filmaram cometendo o crime de estupro. Esse tipo de modalidade não inclui apenas penetração e também é usada para casos de sexo oral e outros atos libidinosos sem anuência. No caso da mulher vítima do anestesista, ela estava dopada e passava por um parto cesárea. Segundo investigadores da Delegacia de Atendimento à Mulher (Deam) de São João de Meriti, enfermeiras do hospital, já desconfiadas da postura do médico, decidiram usar um aparelho celular para registrar o que ele fazia durante as cirurgias. 

A quantidade de sedativo aplicada por ele foi um dos indícios que levantou desconfiança na equipe de mulheres. Uma das testemunhas contou à polícia que “Giovanni ficava sempre à frente do pescoço e da cabeça da paciente, obstruindo o campo de visão de qualquer pessoa”. A gravação só pôde ser feita, no entanto, no terceiro atendimento do anestesista do dia. As enfermeiras conseguiram trocar a sala, esconder o telefone em um armário de vidro e, então, confirmar o flagrante, entregue à polícia. Há ainda, contudo, a suspeita de que o médico estuprador tenha agido em outros partos. 

Nova denúncia 

Logo após a prisão de Giovanni, uma segunda vítima se apresentou na Deam, para testemunhar contra ele nesta segunda. De acordo com o jornal Folha de S. Paulo, familiares da jovem, que tem 23 anos, afirmaram aos policias que ela também foi vítima de estupro durante uma cesárea realizada no mesmo hospital, no dia 6 de julho. A mãe conta que a filha saiu totalmente dopada do procedimento e que acordou apenas no dia seguinte à noite. Em depoimento, uma funcionária descreveu que era comum que as pacientes fossem sedadas pelo anestesista ao ponto de “nem sequer conseguir segurar os seus bebês”. 

A mãe também relatou à polícia que a filha acordou com uma substância branca no pescoço. À época, a família achou que poderia ser resultado de algum procedimento do hospital. Porém, ao ter conhecimento da denúncia pela imprensa, a mãe viu que o médico havia sido preso e concluiu que sua filha também foi vítima de um estupro. 

A delegada responsável pelo caso, Barbara Lomba afirmou que levantará o prontuário para verificar se houve sedação, qual era a equipe presente e quais procedimentos o anestesista adotou, para apurar a nova denúncia. À jornalistas, a segunda vítima disse estar indignada e que o médico se aproveitou de um momento vulnerável para cometer o crime. A família já passava por um momento difícil. Segundo a Folha, a vítima é mãe de gêmeos que nasceram prematuros. Um deles acabou morrendo e foi enterrado no domingo (10). E o outro ainda está na UTI neonatal.