Escrito por: Rosely Rocha
Medida Provisória de Jair Bolsonaro para supostamente enfrentar a crise da pandemia do Covid 19, privilegia patrão. Advogados trabalhistas explicam quais as medidas que mais impactam na vida dos trabalhadores
Ao contrário de diversas lideranças políticas no mundo, que estão tomando medidas para proteger a renda e o emprego da classe trabalhadora durante a necessária quarentena para reduzir a disseminação do coronavírus (Covid-19), o governo de Jair Bolsonaro só adotou até agora medidas que protegem os patrões. A Medida Provisória (MP) nº 927 /2020 é mais uma delas.
A advogada Laís Lima Muylaert Carrano e o advogado Antonio Fernando Megale Lopes, sócios de LBS Advogados, falaram sobre os itens da MP mais prejudicais para a classe trabalhadora e responderam algumas dúvidas que os trabalhadores estão fazendo sobre o alcance da MP nº 927/2020, que já está em vigor.
De acordo com eles, os piores itens da MP são:
. Trabalhador demitido durante a pandemia não receberá do governo qualquer tipo de ajuda financeira;
. MP não prevê garantia de emprego no período da pandemia;
. Patrão pode convocar o trabalhador nos feriados sem precisar pagar hora extra;
. MP ignora o drama dos trabalhadores informais, autônomos ou de aplicativos que estão tendo a renda praticamente zerada com as quarentenas que vêm sendo determinadas pelos governos estaduais;
. A MP estabelece que contaminação pelo coronavírus não é doença ocupacional, apenas se o trabalhador demonstrar a relação entre a doença e o trabalho. O governo ignora recente decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que determinou que trabalhador que adoece em ambientes de trabalho de risco deve ser incluído nos casos de doenças ocupacionais, mesmo sem comprovação da relaçao entre o trabalho e a doença.
. A MP não traz nenhum dispositivo contra as demissões de trabalhadores infectados ou não, nesse período, o que os deixam sem qualquer tipo de proteção. Recentemente, foi anunciado um projeto de lei para garantir que o governo pague os primeiros 15 dias de licença médica, que é uma proteção para as empresas, que eram antes responsáveis por esse pagamento.
. A MP flexibiliza a fiscalização sobre normas de medicina e segurança, deixando os trabalhadores mais vulneráveis pela ausência de treinamentos periódicos e eventuais itens previstos nas Normas Regulamentadoras (NRs), em um momento em que a saúde deveria ser o foco.
. A MP de Bolsonaro atropela a Constituição, impedindo que sindicatos sejam informados pelas empresas sobre as medidas tomadas e não valoriza a negociação coletiva e existência de acordos e convenções coletivas.
. E autoriza a celebração de acordo individual escrito entre trabalhador e empregador, como se a correlação de forças entre um e outro fosse a mesma.
. Os trabalhadores da saúde que estão arriscando a vida para conter a disseminação do Covid-19 também foram esquecidos por Bolsonaro, MP não prevê proteção à saúde, ao emprego ou ajuda financeira aos trabalhadores do serviço de saúde, utilizando apenas regra que flexibiliza as jornadas e a forma de compensação ou pagamento.
Confira abaixo as perguntas dos trabalhadores e as respostas dos advogados:
R: Sim. A MP 927/2020 estende o estado de calamidade pública e procura vincular com o conceito de força maior para fins trabalhistas, o que pode levar a aplicação do art. 503 da CLT, que autoriza redução de até 25% dos salários mediante acordo individual, o que evidencia a inconstitucionalidade, pois qualquer redução salarial depende de acordo coletivo ou convenção coletiva.
A MP flexibiliza as hipóteses de banco de horas, inclusive com possibilidade de banco de horas negativo: o empregado não trabalha, recebe os salários e fica devendo o cumprimento da jornada de trabalho. A compensação dessas horas pode ocorrer em até dezoito meses, o que é muito tempo.
R: Sim. A empresa não precisar recolher o FGTS para as contas vinculadas dos seus empregados, nos meses de março, abril e maio de 2020. Os respectivos pagamentos poderão ser efetuados em seis parcelas mensais, a partir de julho de 2020. Ou seja, caso o empregado necessite sacar seu FGTS antes desse período, ele ainda não terá recebido os respectivos meses.
R: A MP flexibiliza as formalidades para estabelecer o teletrabalho e deixa a critério do empregador, basta a empresa comunicar ao empregado com 48 horas de antecedência. Caso o empregado não possua meios para fazer o teletrabalho, o empregador deverá fornecer os equipamentos, o que pode ocorrer em regime de comodato.
R: A MP permite ao empregador conceder férias já adquiridas (vencidas) e antecipar férias ainda não adquiridas (vincendas). Quando o empregado retornar das férias antecipadas, começará nova contagem do período aquisitivo de férias.
Os 1/ 3 a que o trabalhador tem direito a mais sobre o salário, quando tira férias, poderá ser pago até o dia 20 de dezembro para as férias concedidas durante o estado de calamidade.
Vale a mesma lógica para as férias coletivas. Porém, quanto às férias coletivas, a MP afastou as exigências previstas na CLT, sendo elas: limite de máximo de períodos anuais (2); limite mínimo de dias corridos (não inferior a 10 dias); comunicação prévia das férias coletivas ao Ministério da Economia e aos sindicatos da categoria.
A MP não mexe com o 13º salário dos trabalhadores. A única medida do governo em relação a isso foi antecipar a primeira parcela para os aposentados do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). A primeira parcela vai ser liberada entre 24 de abril e 08 de maio. A segunda será paga entre 25 de maio e 5 de junho.
R: A MP suspende por 180 dias a fiscalização das empresas, exceto em relação à:
- falta de registro de empregado, a partir de denúncias;
- situações de grave e iminente risco, mas somente para as irregularidades imediatamente relacionadas à configuração da situação;
- ocorrência de acidente de trabalho fatal apurado por meio de procedimento fiscal de análise de acidente, somente para as irregularidades imediatamente relacionadas às causas do acidente e;
- trabalho em condições análogas às de escravo ou trabalho infantil.
R: A MP suspende a obrigatoriedade de exames ocupacionais. Porém, as empresas e empregados ainda precisam efetuar o exame demissional.
Quanto aos exames ocupacionais, estes deverão ser efetuados até 60 dias após o fim do estado de calamidade pública, salvo se o médico responsável do Plano de Controle Médico de Saúde Ocupacional (PCMSO) indicar a empresa da necessidade de realização do exame ocupacional.
O exame demissional será dispensado caso o exame ocupacional tenha sido realizado a menos de 180 dias. Esse prazo foi estendido pela MP. Antes as normas de saúde previam prazos menores e diferenciados a considerar o grau de risco que o trabalhador estaria exposto no ambiente laboral (ex: atividade insalubres).