SC: Professor é demitido após trabalhar texto sobre tortura na ditadura militar
O docente foi denunciado por um pai de aluno e a Secretaria de Educação de Itapema decidiu por desligá-lo da escola
Publicado: 24 Maio, 2019 - 09h49
Escrito por: Ana Luiza, da Carta Capital
O professor de educação física Willian Meister foi demitido da escola Escola Municipal de Educação Básica Oswaldo dos Reis, de Itapema, Santa Catarina, após trabalhar um texto poético sobre o período da ditadura militar com seus estudantes.
O caso aconteceu próximo ao 1 de abril, data que este ano marcou os 55 anos do golpe militar ocorrido em 1964, e levou à instauração da ditadura. O professor reservou parte de algumas aulas para ler e debater com as turmas do sétimo e nono anos o texto “Canção para Paulo (A Stuart Angel)”, de Alex Polari, que narra a tortura sofrida por Stuart, filho da estilista Zuzu Angel, morto durante o período ditatorial. O professor explicou que a atividade de leitura era prevista no cronograma escolar.
O caso aconteceu próximo ao 1 de abril, data que este ano marcou os 55 anos do golpe militar ocorrido em 1964, e levou à instauração da ditadura. O professor reservou parte de algumas aulas para ler e debater com as turmas do sétimo e nono anos o texto “Canção para Paulo (A Stuart Angel)”, de Alex Polari, que narra a tortura sofrida por Stuart, filho da estilista Zuzu Angel, morto durante o período ditatorial. O professor explicou que a atividade de leitura era prevista no cronograma escolar.
“Na introdução da aula, eu falei um pouco sobre a ditadura, os impactos que o movimento teve na reformulação da educação e também da Educação Física, que se tornou desportivista no período, ou seja, serviu aos militares como uma ferramenta de contenção dos corpos, de aplicação de uma moral comportamental”, explicou o docente. Ele garante que a atividade rendeu a participação e debate dos estudantes e que a escola tinha conhecimento sobre o material utilizado.
Dias após a atividade, o professor foi advertido pela diretor da escola, Emílio César da Silva, que também é presidente do Conselho Municipal de Educação de Itapema. A justificativa para a advertência foi o que pai de um dos estudantes do sétimo ano procurou o gabinete da prefeita Nilza Simas (PSD) para reclamar do texto utilizado, por ‘ser pesado e conter palavrões’. O familiar foi encaminhado à Secretaria de Educação, que, por sua vez, cobrou que a escola chamasse o professor para uma conversa, e emitisse um relatório para ser entregue ao reclamante.
Meister conta que, diante a situação, conversou novamente com os estudantes. “Narrei o que estava acontecendo e disse que estava aberto ao diálogo, que caso algum deles ou familiar quisessem conversar sobre o meu trabalho, era só me procurar. Entendo que não houve uma ilegalidade, um questionamento técnico pedagógico sobre a minha prática, mas uma crítica, e ela poderia ser feita diretamente a mim”, contou o professor.
Após a atitude, no entanto, a situação se agravou. Admitido em caráter temporário pela rede, Meister não teve o seu contrato renovado no fim do mês de abril, situação que, segundo ele, foi anunciada pelo diretor da seguinte forma: “procure o RH da prefeitura, seu contrato não será renovado e você não trabalha mais aqui”.
Discordância política ideológica
Segundo o professor, o caso acerca do texto não foi o único enfrentado por ele na escola, que garante ter sofrido perseguição política ideológica e ter sido visto como adversário político dentro da instituição – em 2016, Meister se candidatou a prefeito de Itapema pelo PSOL e fez oposição à chapa da atual prefeita, apoiadora de Bolsonaro.
O professor entrou com uma representação no Ministério Público, que prevê crime de improbidade administrativa, devido a um esforço burocrático por parte da gestão escolar de afastar o professor da instituição – a escola produziu registros de outras práticas do professor, sem que ele tivesse conhecimento. A ação também alega ofensa ao princípios da legalidade e impessoalidade, além de assédio moral.
A defesa reitera o pedido para que o Ministério Público de Santa Catarina abra um inquérito civil para analisar a conduta dos envolvidos no caso e para que o professor seja reinserido no serviço público.
“Quero voltar a trabalhar em sala de aula por uma questão de dignidade, do meu compromisso social e profissional. Sou vítima de uma injustiça, de uma ilegalidade. Sobretudo nesses tempos de ataque a educação, é importante registrar esse ato de resistência como professor, com relação a arbitrariedade, autoritarismo e censura. É fundamental que os professores denunciem situações como essa. Não vão destruir a educação crítica do Brasil por uma perspectiva politica ideológica”, criticou.
Repúdio
A Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE) publicou uma nota de repúdio no dia 14 de maio em relação á demissão sumária do professor, “ato que representou o ápice de um movimento intenso de perseguição política e ideológica“, grafou.
O texto coloca que, casos como este, “ficam, infelizmente, cada vez mais comuns e corriqueiros nos tempos em que vivemos, forjando um caldo de perseguição política e ideológica dentro das escolas brasileiras”.
“Estamos todos/as atentos/as aos desdobramentos desse caso e não nos furtaremos em reverberar nacional e internacionalmente essa atitude vergonhosa de gestores públicos de um município que não honram a área que deveriam gerir. Essa espécie de gente, que não entende nada de educação, não deveria assumir funções dessa natureza e lutaremos para que nunca mais o faça”, finaliza a nota.
A reportagem procurou a Secretaria de Educação de Itapema para comentar o caso, mas não recebeu respostas até o fechamento da reportagem.