Escrito por: Remígio Todeschini
Decisão contraria todos os atuais índices de acidentalidade vigentes no setor industrial
A 1ª. Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) na segunda semana de setembro (Valor Econômico de 17/09/2014) rebaixou o Seguro Acidente (RAT) de risco elevado (grave), alíquota de 3%, para 2%, contrariando o Decreto 6.957/2009 vigente, de uma empresa do setor de autopeças do grupo FIAT (FPT Powertrain do Brasil). Esse decreto na época (2009) definiu os riscos leve (1%), médio (2%) e grave (3%) em base dos critérios da frequência, gravidade e custo dos acidentes. Toda vez que um setor econômico estatisticamente ficasse abaixo de 33% dos percentis médios de frequência, gravidade e custo da acidentalidade esse índice seria de 1%. Entre 33% e 66% seria de 2% e acima de 66% o índice seria de 3%. Os parâmetros da frequência, gravidade e custo da acidentalidade que foram transformados em percentis, basearam-se na metodologia do FAP, conforme Resoluções 1308/2009 e 1309/2009 do Conselho Nacional da Previdência Social (CNPS).
O caso chama atenção porque a decisão dessa Turma do TSJ contraria todos os atuais índices de acidentalidade vigentes no setor industrial, em que os traumas, Ler-Dort e transtornos mentais e comportamentais representam 80% dos principais motivos de acidentalidade segundo estatísticas do Ministério da Previdência e Ministério do Trabalho e Emprego (Ver estatísticas do MPS), sendo que esses mesmos motivos de acidentalidade estão presentes também no setor de autopeças de fabricação de motores.
Quando analisam-se as portarias do FAP, editadas pelo Ministério da Previdência e Ministério da Fazenda, em base no processamento da frequência, gravidade e custo da acidentalidade feita pela Dataprev, dos anos de 2009 a 2013 vê-se que esses números mantem-se em percentis elevados no setor de autopeças de fabricação de motores, conforme Tabela 1, ou seja todos estão com índices superiores a 66%. Essa demonstração em base do processamento dos micros dados pela DATAPREV , mostra que acidentalidade dessa CNAE continua elevada.
Tabela 1 – Percentis médios de Frequência, Gravidade e Custo do setor de autopeças fabricação de motores (CNAE2941700).
Ano
Percentil de Frequência
Percentil de Gravidade
Percentil de Custo
2009
83,77
82,03
76,26
2010
79,09
78,01
66,90
2011
91,35
84,72
79,20
2012
90,72
79,03
77,9
2013
90,42
86,94
93,63
2014
76,62
66,87
78,18
Fonte:PortariaMPS/MF Nº 254 - 24/09/2009;PortariaMPS/MF Nº 451 - 23/09/2010;Portaria MPS/MF Nº 579 - 26.09.2011; Portaria MPS/MF Nº 424 -24/09/2012;Portaria MPS/MF Nº 413 - 24/09/2013;Portaria MPS/MF Nº 438 - 22/05/2014.
Através de outros indicadores da acidentalidade do Ministério da Previdência e do Trabalho vê-se que diversos índices do setor de autopeças da fabricação de motores são o dobro (incidência de acidentes típicos),triplo e até quatro vezes maiores (incidência de doenças ocupacionais) que os índices nacionais demonstrando a elevada acidentalidade desse setor justificando o nível máximo de cobrança do Seguro Acidente do Trabalho, conforme Tabela 2.
Tabela 2. Indicadores de acidentes do trabalho nacionais e setoriais de autopeças de fabricação de motores (CNAE – 2941700)
Incidência por 1000 vínculos
Incidência de doenças ocupacionais por 1000 vínculos
Incidência de Acidentes Típicos por 1000 vínculos
Incidência de incapacidade temporária por 1000 vínculos
Índice nacional 2010
19,29
0,47
11,34
16,67
Índice setor 2010
33,43
1,86
22,27
27,74
Índice nacional 2011
18,13
0,38
10,79
15,59
Índice setor 2011
29,16
1,67
18,93
25,26
Índice nacional 2012
16,93
0,36
10,18
14,36
Índice setor 2012
32,80
3,12
19,47
28,04
Fonte: MPS e MTE: Anuários Estatísticos de Acidente do Trabalho – anos 2010 2011 e 2012.
Em síntese o que justificará o rebaixamento do percentual de cobrança do Seguro Acidente é um sério e contínuo trabalho de prevenção com a diminuição gradativa de todo e qualquer tipo de acidente do trabalho, para que essas taxas de seguro possam ser revisadas em futuras revisões normativas em decretos do Ministério da Previdência. Utilizar-se de medidas temporárias judiciais, não baseadas nos dados estatísticos conforme aqui demonstrado, é perpetuar a acidentalidade e não contribuir com a reparação previdenciária que deve ser feita aos trabalhadores lesionadas. Recorde-se que a conta Brasil da Acidentalidade é pesada. No ano de 2012 entre os diversos benefícios acidentários, incluídas as aposentadorias especiais, a Previdência teve de desembolsar cerca de 17 bilhões de reais, que somados aos custos indiretos chega a 68 bilhões de reais. Um custo muito pesado para o povo brasileiro.
* Remígio Todeschini, Diretor Executivo do Instituto de Previdência de Santo André e ex-diretor de Saúde Ocupacional do Ministério de Previdência Social.
Referências
Portarias interministeriais do Ministério da Previdência e Ministério da Fazenda de 2009 a 2014
Anuários Estatísticos dos Acidentes do Trabalho – Ministério da Previdência e Ministério doTrabalho e Emprego de 2010 a 2012.
TODESCHINI, R.; CODO, W. (Orgs.) O novo Seguro de Acidente e o novo FAP. São Paulo: LTR, 2009.