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Sem bancos públicos, desenvolvimento fica submetido a humores do mercado

Descapitalizados e sob ameaça de privatização, BB, Caixa e BNDES têm seu papel ofuscado por interesses dos bancos privados que patrocinaram o golpe

Publicado: 22 Maio, 2018 - 17h15

Escrito por: Tiago Pereira, da RBA

Reprodução/Carta Capital
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O governo Temer, atendendo aos interesses do mercado financeiro, promove o desmonte dos bancos públicos com a venda fatiada de ativos da Caixa Econômica e do Banco do Brasil, além de promover a descapitalização do BNDES. Ao mesmo tempo, as instituições "equalizam" suas taxas de juros e tarifas enxugando o crédito e abrindo espaço para os grandes bancos privados.

O resultado é falta de recursos para financiar o consumo das famílias e o setor produtivo. Sem outro planejamento que não o próprio desmonte dessas instituições, a economia nacional é deixada ao sabor das crises e dos humores dos especuladores.

Esses foram alguns dos apontamentos trazidos pelo debate Diálogos Capitais: Bancos públicos e o desenvolvimento econômico e social, realizado nesta terça-feira (22) em São Paulo, iniciativa da revistaCartaCapital, apoiada pela Federação Nacional das Associações do Pessoal da Caixa Econômica Federal (Fenae).

Na abertura, o economista e professor da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) Luiz Gonzaga Belluzzo lembrou que tanto a nossa própria história recente como a de países como Inglaterra, Estados Unidos e Alemanha, ou ainda a China dos tempos atuais, mostram que não há conflito irreconciliável entre a ação do Estado e do capital privado para a promoção do desenvolvimento nacional. 

Segundo Belluzzo, é papel do Estado – e dos bancos públicos – "gastar na frente", para assim criar o ambiente econômico propício ao investimento privado. Ele citou casos de empresas como a Eletrobras e a Telebras, que por meio de um plano de ação de longo prazo promoviam considerável crescimento dessas cadeias produtivas, contribuindo para o desenvolvimento de milhares de empresas.

O professor afirmou que os bancos públicos – e as empresas públicas de maneira geral – têm papel fundamental porque podem agir com mais autonomia em relação aos ciclos econômicos. Em momentos de crise, enquanto o capital privado se retrai, estas instituições podem fazer ações que sirvam de "contraponto", expandindo o crédito e dissipando incertezas, como ensinava o economista britânico John Maynard Keynes (1883-1946). O que não vem sendo feito no Brasil hoje.

Desmonte

Representante dos empregados da Caixa no Conselho de Administração da instituição, Rita Serrano disse que os bancos públicos vêm sendo fatiados pelo atual governo, com a venda de ativos para o capital privado. Enquanto o Banco do Brasil estuda vender a sua participação em operações com cartões de crédito e seguros, a CEF quer repassar suas loterias instantâneas. 

Rita lembrou que a Caixa chegou a responder por até 70% do crédito imobiliário no país, contribuindo com a criação de emprego e renda. O programa Minha Casa Minha Vida, que chegou a contar com orçamento de cerca de R$ 20 bilhões em 2015, recuou para R$ 7,7 bi dois anos depois, e segue sendo "enxugado".

Para além da importância nos investimentos diretos, Rita destacou o papel da Caixa no avanço da "bancarização" no país. Segundo ela, foram criadas, nos últimos anos, cerca de 12 milhões de contas para quem não tinha acesso ao sistema bancário. Restam 30 milhões de pessoas ainda excluídas, que devem ter a sua situação prejudicada a partir do atual processo de "elitização" do sistema bancário, com o fechamento de agências da Caixa e do Banco do Brasil, e com a equiparação das tarifas com os bancos privados.

Seguir a lei

O professor da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP) Gilberto Bercovici lembrou que os bancos públicos e empresas estatais não existem com a finalidade exclusiva do lucro, "mas para cumprir a sua função", definida por lei. "Não fazer isso não é só desmonte ou esvaziamento político, é descumprimento e violação da legislação vigente."

Bercovici critica a ideia liberal de que os bancos públicos tomariam espaço dos privados, causando danos à concorrência, e usou o mercado de capitais para ilustrar. Segundo ele, sem a participação do BNDESPar (que atua como sócio de empresas com capital aberto) e do Banco do Brasil, "não haveria mercado de capitais".

O debate de sempre

Pedro Celestino, integrante do Conselho Diretor do Clube de Engenharia do Rio de Janeiro, lembrou que foi o planejamento estatal levado a cabo por diferentes governos – desde Getúlio Vargas aos presidentes militares, passando por Juscelino Kubitschek – que garantiu que o Brasil avançasse de uma economia primária exportadora para a industrialização. 

Ele afirmou que os atuais dilemas econômicos do país remontam ao debate ocorrido na década de 1940 entre o líder industrial paulista Roberto Simonsen e o economista liberal carioca Eugênio Gudin. Para o primeiro, o Estado deveria intervir para criar as bases do desenvolvimento nacional, corrente vitoriosa nas décadas seguintes e que agora volta a perder espaço para aqueles que defendem que a ação do Estado mais atrapalha, como defendia Gudin.

Sobre Temer, Celestino afirmou que "nunca tivemos governo tão descompromissado com o interesse nacional", e defendeu a convocação de plebiscito revogatório, pelo próximo presidente eleito, de todos os atos "antinacionais" cometidos desde 2016. "Só o povo poderá garantir a recuperação do que é nosso."