Moro acusa ‘hackers criminosos’ e nega autenticidade de mensagens
Em audiência na Câmara dos Deputados, ex-magistrado afirma não se lembrar de trechos de mensagens e que a frase "In Fux We Trust" foi uma paródia
Publicado: 03 Julho, 2019 - 09h46 | Última modificação: 03 Julho, 2019 - 10h15
Escrito por: Redação RBA
No depoimento na Câmara dos Deputados nesta terça-feira (2), o ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro, foi questionado sobre vários aspectos que, segundo os deputados, comprometem sua conduta como “juiz imparcial” na condução de processos da operação Lava Jato, incluindo o do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Diversos parlamentares questionaram o ex-juiz a respeito do que ele poderia apontar como realmente falso nas revelações do site The Intercept Brasil.
“Existe algum dos diálogos que vossa excelência negue? Algo como ‘esta frase eu não falei?’”, questionou Alessandro Molon (PSB-RJ). “Não parece que, ao aconselhar a substituição (da procuradora Laura Tessler), sai do papel de juiz e passa para o lado da acusação?” Segundo Molon, com essa atitude Moro “perde a imparcialidade e coloca em risco o papel do juiz num processo penal”. “Vossa excelência não gostaria de ser julgado por um juiz que tenha um lado.”
“Jamais aconselhei o Ministério Público a fazer qualquer coisa”, respondeu o ministro. Pela terceira vez, afirmou que juristas não “vislumbraram qualquer ilicitude” nas mensagens divulgadas e mencionou nominalmente o ex-presidente do STF Carlos Veloso.
Durante todo o depoimento, Moro insistiu que as mensagens são fruto de hackeamento e obtidas “por meios criminosos”. Repetiu também várias vezes que, mesmo tendo dito frases reproduzidas nas reportagens, elas podem “ter sido adulteradas, inseridas palavras”.
Esse é o caso, por exemplo, da frase “In Fux we trust”. Em resposta a mensagem de Dallagnol segundo a qual a força-tarefa poderia contar com o ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal (STF), Moro teria respondido: “In Fux we trust” (“em Fux nós confiamos”, em tradução livre). “Posso ter dito, não lembro”, disse Moro. “Se existiu, foi uma paródia de uma inscrição do dólar norte-americano”, explicou.
Afonso Florence (PT-BA) perguntou sobre o episódio segundo o qual, em suposto diálogo com o procurador Deltan Dallagnol, Moro teria sugerido que evitasse “melindrar” o tucano Fernando Henrique Cardoso. O ex-juiz afirmou não se lembrar do fato. “O caso nunca passou pelas minha mão, ou do procurador Deltan. Nunca fiz nada em relação a esse caso. É um balão vazio.”
Líder da Minoria na Câmara, Jandira Feghali (PCdoB-RJ) citou trecho de uma mensagem que Moro teria enviado a Dallagnol dando pistas sobre o processo contra Lula. A mensagem citada pela deputada é a seguinte: “Então, seguinte. Fonte me informou que a pessoa do contato estaria incomodado por ter sido a ela solicitada a lavratura de minutas de escrituras para transferências de propriedade de um dos filhos do ex-Presidente. Aparentemente a pessoa estaria disposta a prestar a informação. Estou então repassando. A fonte é séria”.
Para Jandira, a gravidade da mensagem é flagrante, no sentido de comprovar a parcialidade do então magistrado. “Isso é normal ou é crime?”, questionou a parlamentar. “Uma conduta como essa, não dá pra dizer se disse ou não disse, se lembra ou não lembra. Se (o The Intercept) não publicar mais nada, isso aqui já é muito grave para punição exemplar a qualquer magistrado. Acha normal esse diálogo? Ensinaria a alunos seus?”, continuou Jandira. “Ouço o sr. Moro dizer que tudo é normal e que foram hackers. O sr. até agora não apresentou provas.”
Vários deputados repetiram o questionamento feito quando do depoimento no Senado, sobre o fato de o comandante da Lava Jato ter aceitado o cargo após o processo contra Lula ter levado o ex-presidente à prisão, o que possibilitou a vitória eleitoral de Jair Bolsonaro. O ministro da Justiça respondeu dizendo que foi sondado pelo então futuro ministro da Economia, Paulo Guedes, depois do segundo turno.
Moro acrescentou: “Sobre ter aceito o convite, já disse isso 30 mil vezes. Acatei, assumi o objetivo de consolidar os avanços anticorrupção da operação Lava Jato. No Executivo poderia barrar qualquer tentativa de retrocesso”. “Vocês tentaram fraudar a eleição. Vocês têm que ser investigados e vossa excelência tem que ser demitido”, disparou Afonso Florence.
O ex-juiz, que, como ministro da Justiça, comanda a Polícia Federal, foi também questionado sobre informações de que o jornalista Glenn Greenwald estaria sendo investigado para apurar movimentações “atípicas”. “Sempre fui um grande defensor da liberdade de imprensa”, afirmou Moro. Leia mais.
A sessão foi encerrada por volta das 21h30, após o ministro foi chamado de “juiz ladrão” por Glauber Braga (PSOL-RJ), o que causou reação de parlamentares da base governista e deu início a um tumulto. “A população brasileira não vai aceitar como fato consumado um juiz ladrão e corrompido que ganhou uma recompensa para fazer com que a democracia brasileira fosse atingida. É o que o senhor é: um juiz que se corrompeu e, apesar dos gritos, um juiz ladrão”, disse Braga. Após a confusão, a sessão foi interrompida.