Senado brasileiro aprova medida do regime militar
Agora só depende da sanção de Temer o projeto que transfere para a Justiça Militar o julgamento crimes cometidos por membros das Forças Armadas, mesmo que sejam homicídios dolosos.
Publicado: 11 Outubro, 2017 - 09h29 | Última modificação: 14 Outubro, 2017 - 10h18
Escrito por: CUT Brasil, com informações da Anistia Internacional e Agência Senado
No final da tarde desta terça-feira, 10 de outubro, o Senado Federal aprovou o PLC 44/2016, que transfere para a Justiça Militar o julgamento crimes cometidos por militares em missões de Garantia da Lei e da Ordem (GLO), como a que ocorre atualmente na cidade do Rio de Janeiro. Uma das principais críticas ao projeto é que ele impede o julgamento de militares pela Justiça Comum em crimes dolosos (intencionais) contra civis quando envolverem ações de Estado. O texto vai agora para sanção do golpista Michel Temer.
Segundo os senadores que apoiaram o PLC, a proposta dará mais garantias jurídicas às “tropas” que atuam no policiamento das cidades. Na avaliação da Anistia Internacional, tradicional ONG da área de de Direitos Humanos, a proposta aprovada no Senado faz a legislação brasileira retroagir no tempo, se igualando à lei vigente durante o regime militar e acabando com a possibilidade de julgamentos imparciais e independentes.
“A proposta de lei aprovada hoje no Senado nos remete aos tempos sombrios do regime militar no Brasil quando membros das forças armadas cometiam todo tipo de violações de direitos humanos e tinham a garantia de que não seriam responsabilizados. Conseguir que os crimes dolosos contra a vida e graves violações de direitos humanos cometidos por militares contra civis fossem julgados na justiça comum foi uma vitória do nosso processo de democratização. Ao aprovar essa proposta, o Congresso Brasileiro está retrocedendo no tempo” afirma Renata Neder, coordenadora de pesquisa e políticas da Anistia Internacional no Brasil.
O Estado do Rio de Janeiro foi centro do debate na sessão do Senado que aprovou a proposta devido ao uso recorrente das Forças Armadas em operações de Garantia de Lei e Ordem (GLO) e no policiamento de favelas. O uso das Forças Armadas, no entanto, apresenta resultados inexpressivos na redução dos índices de violência com mais relatos de violações que resultados positivos.
Historicamente, a presença das Forças Armadas e da Força Nacional no Rio de Janeiro resultou em graves violações de direitos humanos. Em junho de 2007, uma intervenção policial com o apoio das Forças Nacionais no Complexo do Alemão, no Rio de Janeiro, resultou em 19 mortes, algumas com forte evidência de execuções extrajudiciais, de acordo com especialistas independentes. Em junho de 2008, enquanto o exército realizava o policiamento no Morro da Providência, no Rio de Janeiro, três soldados foram responsáveis pela morte de três jovens, que foram entregues pelos próprios militares a um grupo criminoso. Em dezembro de 2011 um adolescente foi morto no Complexo do Alemão e oito militares foram considerados responsáveis. Entre 2014 e 2015, as Forças Armadas permaneceram no Complexo da Maré por 15 meses, período marcado por uma série de violações de direitos humanos cometidas pelos militares e o caso mais emblemático foi de um jovem que teve a perna amputada depois de ter sido baleado pelos militares.
“O que está em jogo são os homicídios dolosos e violações de direitos humanos cometidos pelos agentes das Forças Armadas. A afirmação, por parte daqueles que defenderam a proposta, de que a lei atual limita ou inibe a atuação dos militares cria uma cortina de fumaça sobre a inadequação do uso das Forças Armadas na redução da violência. A atuação crescente das Forças Armadas no policiamento com a garantia de que as violações cometidas pelos militares serão tratadas em “foro privilegiado” pode estimular as práticas de execuções extrajudiciais já tão comuns nas favelas e periferias brasileiras.” reforça a pesquisadora da Anistia Internacional.
Polêmica
A aprovação do texto gerou polêmica. Lindbergh Farias (PT-RJ) considerou que as ações militares e o emprego das Forças Armadas como polícia não resolverão o problema da violência nas cidades. O senador destacou o risco de que, com essa mudança, se tornem cada vez mais frequentes os pedidos desse tipo de operação, para o qual os soldados do Exército Brasileiro não são devidamente preparados.
Roberto Requião classificou o projeto como irresponsável por banalizar o uso das Forças Armadas como polícia. Ele informou que apresentará projeto para prever que os pedidos de utilização do Exército nesse tipo de operação sejam examinados pelo Senado. "O projeto é uma monstruosidade, um absurdo. Exército não é polícia. O Exército não está adaptado para esses confrontos urbanos", argumentou Requião.