RS: Servidores marcam posição contra recuperação fiscal
Servidores interromperam as falas de deputados com manifestações
Publicado: 30 Janeiro, 2018 - 10h18 | Última modificação: 28 Fevereiro, 2018 - 18h25
Escrito por: Luís Eduardo Gomes, Sul 21
O primeiro dia de convocação extraordinária para votação do Regime de Recuperação Fiscal (RRF) e das privatizações de estatais lotou as galerias da Assembleia Legislativa nessa segunda-feira (29), colocando de um lado servidores públicos, contrários aos projetos, e de outro apoiadores do governo e representantes de federações empresariais. Em diversos momentos da sessão, os servidores interromperam as falas de deputados com manifestações como “Do lado de cá só tem trabalhador, do lado de lá só tem sonegador”. Ao final, comemoram bastante a “cochilada” da base aliada que permitiu a derrubada do quórum e a diminuição do tempo que o governo tem para aprovar as medidas nesta semana.
Para a vice-presidente do Centro dos Professores do RS (Cpers), Solange Carvalho, a derrubada do quórum pode ser considerada uma vitória para a posição dos servidores. “A gente sabe que amanhã a votação continua, mas a cada dia que a gente consegue uma vitória sobre os projetos do governo, isso alimenta a nossa expectativa de que até é possível que ele não consiga a aprovação, mas a gente sabe que é uma luta bastante difícil”, afirma.
Solange diz que, pelos cálculos feitos pelo sindicato a partir de conversas com deputados, o governo não tem os 33 votos necessários para aprovação das PECs das privatizações. Contudo, o resultado de hoje seria um indicativo de que ele sequer teria os 28 votos consolidados para garantir a aprovação da adesão ao RRF, o que o governo diz ter com tranquilidade. “Não tinha deputados presentes por diversos motivos, mas isso é um sinal de que o governo está com dificuldade até para conseguir os 28 votos. Isso é muito importante pra gente”, afirma.
A professora ainda lamenta que o governo tem usado a necessidade de priorizar serviços básicos, como segurança, saúde e educação, como justificativa para garantir o apoio ao RRF, o que tem transformado a categoria em verdadeira moeda de troca, um papel que os servidores têm se recusado a aceitar. Ela destaca, por exemplo, que até hoje o governo não havia dado nenhuma informação sobre a situação do pagamento dos salários de janeiro dos servidores.
Solange avalia que, se o regime for aprovado e todas suas condições atuais impostas, o Estado não poderá contratar servidores para além do número do quadro atual e terá os investimentos limitados. Para Solange, o resultado direto do RRF seria o crescimento no RS da busca por parcerias com a iniciativa privada para a administração de escolas e o sucateamento da rede pública. “Vai referendar por muitos anos essa postura privatista do governo, de firmar acordos com Organizações Sociais para gestão das escolas ou até para a municipalização da educação, como já tem feito”, diz.
Talvez a área que mais venha sido utilizada como “moeda de troca” seja a da segurança pública, com o governo frequentemente condicionando a adoção de medidas e investimentos a aprovações na AL. No entanto, o presidente do Sindicato dos Escrivães, Inspetores e Investigadores da Policia Civil do RS (Ugeirm), Isaac Ortiz avalia que o RRF, se aprovado, será um desastre para a segurança, uma vez que não será possível mais aumentar os efetivos da Brigada Militar, da Civil e das outras corporações para além dos níveis atuais, permitindo-se apenas a reposição de aposentados.
“Hoje, os efetivos já são muito precários. A Brigada tem cerca de 15 mil homens, a Civil menos de 5 mil. Isso vai ser uma tragédia para nós, o RS não vai poder fazer investimentos, não vai poder fazer praticamente nada. E esse filme nós já vimos, no governo Britto, quando fizeram o que seria a melhor negociação do Brasil com o Fernando Henrique e foi um fracasso. Esse tipo de acordo que limita gastos com saúde, educação e segurança só vai aumentar a violência”, afirma Ortiz.
Para o diretor do Sindicato dos Engenheiros do RS (Senge), Diego Mizette Oliz, o RRF é, na verdade, o “regime de retrocesso federativo” e uma espécie de “crédito negativado” que a União estará dando para o RS ao prolongar a dívida por mais 20 anos, em troca da entrega das estatais e de uma série de medidas de ajuste fiscal, mas que só resultarão numa dívida ainda maior no futuro. “O RS vai entregar a roupa do corpo e ficar só de cueca, para daqui a três anos entregar a cueca também e ficar pelado”, diz.
O Senge tem sido um crítico das privatizações desde que o governo lançou suas iniciativas, no final de 2016, para retirar a obrigatoriedade da realização de plebiscito para venda ou federalização das estatais CEEE, Sulgás e CRM. “Com as privatizações, irão ocorrer demissões e a centralização da engenharia em outros estados, gerando emprego e gerando economia lá, deixando de empregar os nossos engenheiros”, diz, acrescentando que, para ele, o governo deveria, depois de anos atuando pela via do ajuste fiscal, passar a trabalhar para atrair investimentos, aumentar a receita, e combater a sonegação de tributos. “A sonegação, as grandes entidades empresariais não querem discutir”.