MENU

Sindicato dos Bancários de SP faz 100 anos em meio às transformações do trabalho

Para a direção da entidade, desafio é continuar garantindo direitos e fazer frente às rápidas transformações no setor financeiro

Publicado: 17 Abril, 2023 - 10h34 | Última modificação: 17 Abril, 2023 - 11h00

Escrito por: RBA

Sindicato dos Bancários de SP
notice

Nesse domingo (16), o Sindicato dos Bancários de São Paulo, Osasco e Região comemorou seu centenário em meio a profundas transformações no sistema financeiro e no mundo do trabalho. Sua história começou no Brasil de 1923, da política do “café com leite”, quando o presidente era Arthur Bernardes e o governador paulista era Washington Luís, que depois se tornaria o último presidente da chamada República Velha. Em São Paulo, 84 trabalhadores se reuniram em assembleia para aprovar o estatuto da Associação dos Funcionários de Bancos, que 10 anos depois passaria a sindicato. 

Um século para se orgulhar
Até aquela época, os bancários faziam parte da categoria dos comerciários. Independentes, realizaram sua primeira greve em 1932: eram os funcionários do Banespa – fundado em 1909 –, reivindicando aumento salarial e melhoria das condições sanitárias. A tuberculose era comum naquela época – na década de 1930, surgiram a abreugrafia e a vacina BCG. Em 1933, os bancários conquistariam a jornada de seis horas. A mesma que, volta e meia, as empresas (ou governos) tentam eliminar.

Convenção coletiva nacional
Hoje, os bancários têm uma convenção coletiva nacional, conquistada em 1992, além de acordos específicos, contemplando os mais de 400 mil trabalhadores no setor. A atual presidenta do Sindicato dos Bancários de São Paulo, Osasco e Região, Ivone Silva, ressalta que a convenção e todos os direitos nela incluídos são resultado de muita mobilização e não de “bondade” de bancos. “Nosso desafio é contar a história da luta por direitos e os desafios dos trabalhadores. A mudança só acontece com união e organização”, afirma Ivone (leia entrevista ao final do texto).

Além da capital e Osasco, a base do Sindicato dos Bancários abrange mais 15 dos 39 municípios da região metropolitana. Pelo dados de 2021 da Relação Anual de Informações Sociais (Rais), reunia 139 mil trabalhadores naquele ano. Ou 31,6% da categoria (443 mil) em todo o país. Uma categoria que vem mudando rapidamente, observa Ivone. “O perfil do bancário hoje é um trabalhador jovem, conectado às redes sociais, que exige mudanças no trabalho e na sociedade”, define.

Eleição e presença das mulheres
Com isso, a diretoria se prepara para renovar a direção. A eleição está marcada para os próximos dias 25 a 27. Será virtual – outra característica dos tempos atuais, que se acentuou com a pandemia. As campanhas salariais dos últimos anos foram marcadas por assembleias não presenciais. Assim como boa parte da categoria bancária, entre outras, passou a trabalhar de casa. Isso levou à negociação de acordo específico para o home office.

Outra mudança perceptível foi a da presença das mulheres no meio bancário. Na próxima gestão, o sindicato terá uma mulher na presidência pela terceira vez seguida. Atual secretária-geral, Neiva Ribeiro encabeça a chapa única inscrita para as eleições. Dos 12 candidatos à diretoria executiva, 10 são mulheres. Antes de Ivone, a entidade era comandada por Juvandia Moreira, agora à frente da Confederação Nacional dos Trabalhadores do Ramo Financeiro (Contraf-CUT).

Desafios e direitos
Assim, a questão de gênero ganhou espaço na pauta trabalhista. Na última segunda-feira (10), por exemplo, foi lançado em São Paulo o Programa Nacional de Iniciativas de Prevenção à Violência contra as Mulheres. Mais uma vez, resultado de seguidas ações da categoria, que inclusive garantiu uma cláusula específica (86) na convenção coletiva.

Os desafios continuam. No setor financeiro, os bancos insistem em reduzir postos de trabalho, mesmo com lucros que não param de crescer. Os sindicatos seguem em campanha contra metas abusivas, que levam ao adoecimento de muitos trabalhadores.

E, com todas as dificuldades, nos 10 últimos anos, a categoria garantiu reajustes acima da inflação: o índice acumulado é de 90,57%, enquanto o INPC-IBGE somou 83,03%. Segundo os bancários, o ganho real (4,12%) foi maior para o piso (5,09%), auxílio-refeição (17,4%) e vale-alimentação (18,7%). A atual convenção, assinada em 2022, tem duração de dois anos.

O sindicato ainda planeja as celebrações dos 100 anos. Já está confirmada uma sessão solene na Assembleia Legislativa, no próximo dia 24.

Sindicato dos BancáriosSindicato dos Bancários

Confira entrevista com Ivone Silva, presidenta dos Bancários de São Paulo:

Os bancários passaram por transformações políticas, sociais, econômicas e trabalhistas ao longo deste 100 anos. O perfil mudou. Quem é o bancário hoje?

O perfil do bancário hoje é um trabalhador jovem, conectado às redes sociais, que exige mudanças no trabalho e na sociedade.

Nosso desafio é contar a história da luta por direitos e os desafios dos trabalhadores. A mudança só acontece com união e organização. Saber, por exemplo, que a conquista da participação nos lucros e resultados é fruto de muita luta em uma campanha nacional unificada e não uma bondade do banco.

O bancário chega ao banco e tem plano de saúde, vales refeição e alimentação, mas não sabe de onde veio isso. Se ele não souber que isso foi resultado de luta e organização, não vai se organizar também para lutar por novas conquistas. E quando vemos a história nesses 100 anos, percebemos que ela é fruto de muita mobilização, não só para os bancários, mas para todos os trabalhadores.

As mudanças atingiram também o sindicato, que, além das questões profissionais, específicas da categoria, passou a atuar em outros campos. O “sindicato cidadão” se consolidou?

Além da luta por melhores salários e condições de trabalho, o sindicato também se preocupa com as questões relacionadas à vida do trabalhador, como transporte, moradia, saúde, educação e que afetam a qualidade de vida dos bancários e de seus familiares.

Neste centenário, posso dizer que temos uma longa trajetória como protagonistas, organizando não só os bancários, mas a sociedade também. Muitas das nossas mobilizações se ampliaram, a exemplo da nossa luta por uma nova Constituinte, pelas Diretas Já e pela democratização do nosso país. E seguimos lutando por melhores condições de vida para todos os trabalhadores.

Quais serão as prioridades nos próximos anos?

Temos muitos desafios para as próximas décadas. Um deles é manter nossa política de aumento real e de ampliação na participação nos lucros e resultados. Há muitos anos os bancos ganham muito e isso tem de ser bem distribuído com os bancários e bancárias que constroem este resultado.

Além disso, temos que nos organizar para que as novas tecnologias e formas de organização dos bancos não se traduzam em aumento do desemprego e das desigualdades.

Com as transformações na sociedade, o movimento sindical também está mudando. Estamos auxiliando na construção de uma nova etapa no país. E sabemos que os bancários servem de exemplo para outras categorias. Defendemos um modelo que fortaleça o movimento sindical e os trabalhadores.

Na prática, o modelo defendido é o que já acontece na categoria bancária: negociação coletiva forte, participação dos trabalhadores nas assembleias e transparência nas decisões.

Mas podemos fortalecer nosso modelo ainda mais, ao estabelecer, por exemplo, que uma convenção coletiva tenha mais valor que os acordos coletivos. Isso nos dará maior segurança jurídica para a negociação coletiva. É urgente que os sindicatos se fortaleçam para apoiar e defender seus trabalhadores.

Precisamos também voltar a pensar num sistema financeiro que não tenha como único objetivo dar lucro para seus acionistas. É preciso redução de juros e crédito sustentável e barato, que inclua as pessoas que precisam ser bancarizadas, que atenda às peculiaridades regionais e geracionais do país, que ajude a desenvolver áreas prioritárias como habitação, agricultura e educação, que ajude a economia a retomar o crescimento e gerar empregos, que destine recursos para projetos de infraestrutura no país.

Do contrário, as tendências aqui explicitadas vão se aprofundar nos próximos anos e teremos um sistema financeiro cada vez mais excludente, concentrador de renda e que funciona cada vez mais como um obstáculo ao pleno crescimento econômico e social do Brasil.