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Sociedade precisa se mobilizar pelo fim do veneno na comida

Alerta é de organizações e movimentos populares que lutam em defesa da redução de agrotóxicos no meio ambiente e nos alimentos para que o brasileiro não seja ainda mais envenenado

Publicado: 30 Novembro, 2018 - 13h22 | Última modificação: 30 Novembro, 2018 - 15h23

Escrito por: Érica Aragão

Mídia Ninja
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Adiado por duas semanas consecutivas e previsto para ser votado na primeira semana de dezembro, o Projeto de Lei (PL 6670/16), que institui a Política Nacional de Redução de Agrotóxicos (PNARA) não conseguiu avançar na Comissão Especial que trata do assunto na Câmara dos Deputados.  

Entidades que lutam pela redução de agrotóxicos no meio ambiente e nos alimentos temem que por falta de quorum para ser votado ainda nesta legislatura, a Câmara engavete o PL que proíbe o uso de produtos considerados extremamente tóxicos. O projeto prevê, ainda, crédito especial, isenção do Imposto sobre Propriedade Territorial Rural para agricultores orgânicos e agroecológicos e a criação de zonas de uso restrito e até zonas livres de agrotóxicos.

Mesmo tendo votos suficientes para aprovação do PL na Comissão Especial, os parlamentares, ligados ao agronegócio e contra a medida, estão usando das regras regimentais para adiar a votação e deixar para o próximo ano. Isso significa que o PL terá de tramitar novamente por todas as comissões onde já foi analisado.

A indicação da deputada Tereza Cristina, presidente da Frente Parlamentar Agropecuária, para o ministério da Agricultura, feita pessoalmente pelo presidente eleito, Jair Bolsonaro (PSL), indica que em 2019 as dificuldades para aprovação de um projeto como essa será muito mais difícil.

Tereza é uma defensora do agronegócio. E, Bolsonaro já se pronunciou tanto em defesa dos ruralistas quanto a favor ao Pacote do Veneno, o Projeto de Lei (PL 6299/02), que já está pronto para votação no plenário da Câmara. Esse PL facilita e amplia a liberação de novos pesticidas, mesmo sem aprovação do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais (IBAMA) e da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA). 

O Brasil já é um país muito permissivo em relação ao uso de agrotóxicos, diz vice-presidenta da CUT, Carmen Foro. Segundo ela, enquanto no Brasil há 504 princípios ativos de agrotóxicos com uso permitido, na União Européia 70% deles são proibidos há mais de dez anos.

Para a Carmen Foro, que também agricultora familiar, toda a sociedade tem se unir na luta contra o uso de agrotóxicos no país, o maior consumidor mundial deste veneno.

“No Brasil é assustador o crescimento do uso dos agrotóxicos. Subiu de sete quilos por hectares para 15, envenenando o solo, o alimento, o ar, a água prejudicando vidas e o meio ambiente. E todos têm de estar unidos na luta pela aprovação do projeto que reduz o uso de veneno no campo”.  

O secretário do Meio Ambiente da CUT, Daniel Gaio, concorda com Carmen e acrescenta “a Política Nacional de Redução de Agrotóxicos pode representar uma forma de resistência importante e de garantias no tema da transição para um modelo de produção de alimentos sustentáveis, com melhores condições para agricultores, segurança alimentar e proteção do meio ambiente”.

A continuação deste modelo de agricultura baseado na produção de commodites compromete a vida do planeta e das pessoas
- Carmen Foro

E defender os brasileiros e brasileiros é defender a aprovação da política nacional, afirma Daniel.

“Diante as ameaças aos temas socioambientais que vem acontecendo e da possibilidade de situação piorar no próximo governo, é fundamental avançarmos na discussão da PNARA ainda este ano. E é fundamental a participação da sociedade”, disse.

O presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores e das Trabalhadoras na Agricultura Familiar do Brasil (Contraf-Brasil), Marcos Rochinski, concorda plenamente com o Daniel nos dois sentidos, tanto quanto a falta de esperança com o novo governo quanto na urgência do povo apoiar a causa.

A sociedade brasileira tem que se mobilizar, exigir cada vez mais produto de qualidade e saudável, mostrando que não admite mais continuar consumindo produto envenenado
- Marcos Rochinski

Segundo ele, sem mobilização não há expectativa de que o Congresso Nacional melhore em relação a luta por menos veneno.

Por isso, diz o dirigente, é preciso que “a sociedade  fortaleça os mercados locais e a agricultura familiar, que produz mais de 75% dos alimentos consumidos no país”.

Para o presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores da Agricultura (CONTAG), Aristides Santos, a luta não pode ser só da sociedade organizada e sim de todos que consomem alimentos no país.

Segundo Aristides, a população pode e deve ajudar, porque a luta é de todos e todas. 

“A luta dos movimentos sociais e dos parlamentares de esquerda e na defesa do meio ambiente e por uma alimentação saudável não serão suficientes”, afirma.

Será preciso essa interação com a sociedade de vários segmentos sociais, a própria opinião pública e a mídia para fazer esta grande articulação para convencer os deputados aprovarem o PNARA, que na prática eliminaria o PL do veneno
- Aristides Santos

PNARA

A Política Nacional de Redução do Agrotóxico propõe a redução gradual do uso de agrotóxicos no Brasil e vai possibilitar a transição de uma agricultura convencional para um modelo mais sustentável para o planeta, a população e mais justo para quem planta. O impacto da medida levaria a sociedade a repensar o modelo da agricultura brasileira.

Em lugar de grandes quantidades de químicos e concentração de terra para monocultura de commodities, como milho e soja, a medida incentiva uma agricultura que respeita quem produz e quem se alimenta, além de assegurar distribuição e acesso verdadeiramente democráticos.

“Este projeto traz para nós uma condição de caminhar na perspectiva de redução para que a gente possa ter uma agricultura cada vez mais saudável, para chegar na população brasileira com alimento sem veneno”, destacou Aristides.

A PNARA também prevê revalidação dos registros de agrotóxicos após 10 anos e, sucessivamente, a cada 15 anos após a primeira revalidação.

Não é de hoje que esta disputa de projeto de agricultura vem sendo travada no Congresso Nacional, mas a questão da liberação ou não dos agrotóxicos ou da proibição ou não do uso é uma discussão urgente e decisiva para uma vida mais saudável, um país menos doente.

Para a secretaria de Formação da CUT, Rosane Bertotti, que também é agricultora familiar, o modelo atual demonstra cada vez mais o desrespeito à vida e à saúde das pessoas e não tem nenhuma preocupação com qualidade e segurança da alimentação, diferente da Agricultura Familiar.

“A Agricultura Familiar é o meio de produção e sobrevivência, no qual nos preocupamos com a saúde, de quem vai produzir ou consumir”.

Cuidamos da terra como um bem viver e somos sustentáveis, preservamos e respeitamos o meio ambiente e nossas riquezas
- Rosane Bertotti

Segundo a dirigente, “para comermos com mais qualidade e com menos veneno na natureza precisamos defender um modelo de desenvolvimento sustentável junto com a agricultura familiar, sem exploração do trabalho, das riquezas naturais, do meio ambiente, da terra com um único objetivo: uma vida mais saudável”.

O veneno e os impactos na saúde

O Brasil consome 20% do agrotóxico mundial, sendo mais da metade herbicidas à base de glifosato - molécula que foi descrita como um provável causador de câncer humano pela Agência Internacional de Pesquisa em Câncer (IARC) da Organização Mundial de Saúde (OMS), já em março de 2015.

De acordo com a secretária de Saúde do Trabalhador da CUT, Madalena Margarida da Silva, a contaminação por agrotóxicos pode ocasionar também tonturas, cólicas abdominais, náuseas, vômitos, dificuldades respiratórias, tremores, irritações na pele, nariz, garganta e olhos; convulsões, desmaios, coma e até mesmo a morte.

“As intoxicações crônicas — aquelas causadas pela exposição prolongada ao produto — podem gerar problemas graves, como paralisias, lesões cerebrais e hepáticas, tumores, alterações comportamentais, entre outros”, complementa Madalena.

Além disso, afirma a secretária, “em mulheres grávidas, podem levar ao aborto e a malformação congênita. Diante dessa constatação é inaceitável que o Brasil continue expondo a população ao adoecimento e morte”.

 “A saúde e a alimentação não são mercadorias, são diretos humanos e, portanto, uma luta de toda a sociedade”, concluiu.