Escrito por: Rosely Rocha
Governo quis reduzir IPI para empresas concorrentes às da zona Franca de Manaus, mas voltou atrás após decisão do STF. Para economista do Dieese, decisão colocaria em risco empregos e desenvolvimento da região
Criada em 1957 durante o mandato de Juscelino Kubistchek, a Zona Franca de Manaus (ZFM) tem hoje 105 mil trabalhadores e trabalhadoras que correm o risco de perder seus empregos, se o governo de Jair Bolsonaro (PL) conseguir impor a redução de 35% no Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), para empresas que são concorrentes às do polo industrial localizado na capital do Amazonas.
Ocorre que em função da grande distância dos centros urbanos, a Zona Franca desde a sua criação tem incentivos fiscais para as empresas se fixarem na região Norte do país, a fim de promover geração de empregos e desenvolvimento regional. Caso as empresas de fora do polo tivessem o IPI reduzido elas teriam mais vantagens, pois as empresas da ZFM já contam com esse incentivo e, portanto, seus produtos ficariam mais caros.
As tentativas de prejudicar a Zona Franca foram três, e somente após liminar do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), em que ele concorda que a redução do IPI prejudicava a competitividade da ZFM, o governo recompôs por meio de decreto no último dia 24 deste mês, a cobrança do imposto às outras empresas que não fazem parte do polo industrial.
Ao todo, serão 170 produtos da região que terão as suas alíquotas do IPI recompostas para o patamar em que estavam no início do ano. No polo industrial são fabricados televisores, celulares, motocicletas, aparelhos de som e de vídeo, ar-condicionado, relógios, bicicletas microcomputadores e aparelhos transmissores/receptores, entre outros.
Redução do IPI não traz vantagens ao consumidor
O governo federal manteve a redução do IPI em 35% para empresas que fabricam produtos que não concorrem com os fabricados na Zona Franca de Manaus.
Mas, segundo a economista e técnica do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), da subseção da Confederação Nacional dos Metalúrgicos (CNM/CUT), Renata Miranda Filgueiras, reduzir o IPI não reduz o preço final do produto.
“A própria Anfavea [Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores] admitiu que a redução desse imposto acarretaria, no máximo na redução de 1% no preço final de um veículo fabricado no Brasil. Temos experiência no país que não deu certo. A maioria dos empresários, na verdade, aumentou a sua margem de lucro e não repassou o benefício para o consumidor. É super frágil esse argumento de que a redução do IPI vai reduzir o preço para o consumidor final”, diz Renata.
Além disso, prossegue a economista, a medida de redução do IPI, causará perda expressiva da arrecadação do governo estimada em R$ 18,4 bilhões, considerando os cortes no IPI com o decreto de abril de 2022, agora suspensos pelo governo, por decisão do STF.
O polo industrial registrou crescimento de 10,96% no faturamento que foi de R$ 68,17 bilhões, acumulados de janeiro a maio deste ano, em relação ao mesmo período de 2021.
Entenda os ataques do governo
De acordo com o presidente do Sindicato dos Metalúrgicos do Amazonas (Sindmetal-AM), Valdemir Santana, esta não é a primeira vez que os empregos na Zona Franca de Manaus sofrem ataques. Desde o golpe contra a ex-presidenta Dilma Rousseff, em 2016, a região perdeu cerca de 62 mil empregos.
“O setor de componentes eletrônicos, que fabrica carregadores de baterias, celulares e notebooks, foi afetado com o fim de isenções fiscais, que resultaram em demissões, desde que Michel Temer assumiu a presidência, em 2016”, disse em entrevista ao Portal CUT, no ano passado, quando o governo decidiu em fevereiro de 2021, reduzir os impostos sobre a importação de bicicletas. A previsão é que a medida vai impactar em 3,6 mil empregos diretos e 7 mil indiretos da indústria de bicicletas.
Já em 25 de fevereiro deste ano, Bolsonaro assinou um primeiro decreto que reduzia em 25% o IPI da maioria dos produtos, incluindo vários fabricados na Zona Franca. Em 9 de março, ao se reunir com autoridades e empresários do Amazonas, o presidente prometeu um novo decreto no qual preservaria as fábricas instaladas no estado. Porém, em 15 de abril, uma nova versão do decreto sai sem as promessas feitas. Por fim, no dia 29 do mesmo mês, um novo decreto piorava ainda mais, pois eleva a redução a 35% e ainda não trazia medidas de proteção à Zona Franca.
“Os ataques à zona franca só vão aumentar a margem de lucro de outras empresas porque estamos numa crise econômica muito profunda e os empresários vão querer recompor parcialmente essas taxas de lucro”, conclui Renata Filgueiras.