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STF decide que aposentado especial não pode continuar trabalhando em área de risco

Decisão afeta trabalhadores que já recebem o benefício e continuam no mercado de trabalho. Segundo especialistas, empresas podem usar decisão do STF para demitir

Publicado: 08 Junho, 2020 - 17h01 | Última modificação: 08 Junho, 2020 - 17h16

Escrito por: Andre Accarini

reprodução
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Decisão em plenário virtual do Supremo Tribunal Federal (STF), na sexta-feira (5), determina que trabalhadores que tiveram a concessão de aposentadoria especial, por trabalharem em profissões de risco à saúde e à integridade física, como médicos, eletricitários, mineiros e outras profissões (veja relação abaixo), não poderão mais continuar trabalhando nessas funções.

A decisão afeta trabalhadores, que por direito, obtiveram a aposentadoria e continuam no mercado de trabalho.

De acordo com o Advogado Diego Bochnie, do escritório Advocacia Garcez, o Artigo 57, parágrafo 8° da Lei Previdenciária já previa que o trabalhador que consegue a aposentadoria especial tem de ser afastado da função de risco, sob pena de perder a aposentadoria.

Mas, explica o advogado, os Tribunais Regionais Federais (TRF´s) em todo o país, começaram a entender que esse dispositivo seria inconstitucional porque não teria finalidade protetiva e poderia criar obstáculos ao livre exercício de profissão, garantido pela Constituição Federal de 1988. Para os desembargadores, o trabalhador poderia ter o benefício e ao mesmo tempo continuar a trabalhar em sua área de risco.

“O entendimento é de que uma coisa é o direito à aposentadoria e outra distinta é o exercício das funções pelo contrato de trabalho do trabalhador”, diz Diego Bochie.

O advogado esclarece que a aposentadoria ocorre por direito, com base no tempo de contribuição e idade mínima e no caso da aposentadoria especial, tempo diferenciado. “Isso é o direito garantido pela lei e não deveria implica em qualquer repercussão no contrato de trabalho”.

Uma coisa é o trabalhador contribuir até ter o direito à aposentadoria e outra questão é o contrato de trabalho
- Diego Bochnie


Por que o STF julgou?

O caso que levou o STF a julgar a questão teve origem no TRF-4, que abrange os estados do Sul do país. A decisão sobre a ação movida por uma auxiliar de enfermagem, favorável à trabalhadora, criou jurisprudência para outras decisões semelhantes, também argumentando que o dispositivo era inconstitucional, ou seja, trabalhadores poderiam continuar exercendo suas atividades.

No entanto, o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) entrou com um recurso extraordinário no STF que ficou parado durante alguns anos, até que na última sexta houve o julgamento. A decisão não foi unânime, mas o entendimento final é de que o dispositivo é cláusula protetiva e é constitucional.

O STF, ele diz, determinou que o trabalhador, a partir de sua aposentadoria especial, tem obrigatoriedade de se afastar da área de risco para receber o benefício e a consequência jurídica seria a suspensão do benefício.

Diego afirma que isso gera repercussões nos contratos de trabalho, além, de dúvidas sobre a situação em que ficam os trabalhadores.

“Por exemplo, um trabalhador que foi contratado como eletricista, sempre teve essa função, fez concurso, como fica o contrato de trabalho dele? O empregador teria que demiti-lo? Ele poderia pedir realocação?”

Segundo o advogado, a decisão não responde essas perguntas.

O também advogado Maximiliano Garcez afirma que o acórdão da decisão ainda não foi publicado, mas que já passa a valer. Ele diz também que decisão do STF tem que ser aplicada de forma respeitosa e adequada aos trabalhadores, em especial no momento de pandemia do coronavírus em que muitos trabalhadores estão perdendo empregos.

“As empresas se orgulham de terem responsabilidade social e essa é a hora de provarem isso, realocando trabalhadores, saindo da área de risco e assumindo outras funções, para que continuem usufruindo de seus direitos”, ele diz.

Maximiliano ainda afirma que a atuação sindical em acordos coletivos, a partir de agora, será de vital importância para proteger trabalhadores de não perderem seus empregos.

O advogado teme que as empresas usem a decisão como argumento para demitir trabalhadores, apesar de a decisão do Supremo citar “suspensão” do benefício e não “cancelamento”, no caso de o trabalhador continuar na atividade de risco.

Ele cita inclusive o caso da Eletrobras que tem feito vários planos de demissão de funcionários, visando reduzir o quadro de pessoal.

“Muitas empresas estarão na ânsia de demitir e afastar trabalhadores, inclusive públicas, como Eletrobras, que tem implantando programas de desligamento. Entendo que o RH [departamento de Recursos Humanos] dessas empresas podem tentar tirar proveito dessa situação”. A esperança, ele complementa, é de que o STF considere ilegais ações assim.

 

Trabalhadores nas mãos do STF

Diego Bochnie fala sobre a incerteza dos trabalhadores que passam a depender dos efeitos dessa decisão para saber como será o futuro. Ele lista quatro cenários.

O primeiro deles é o de trabalhadores que estão na área de riso e aguardam uma decisão do INSS para se aposentar. O segundo caso é o de trabalhadores que aguardam o desfecho de uma ação judicial para continuar exercendo suas atividades.

Outro caso é os já aposentados, que conseguiram a aposentadoria por decisão judicial, mas o INSS recorreu. E, por último, aqueles que já se aposentaram por decisão judicial e ao processo não cabe mais recursos por parte do INSS, ou seja, já têm o chamado trânsito em julgado.

A partir dessas dúvidas, o escritório começou a fazer um estudo para avaliar quais são as possiblidades.

Em nota, a equipe de advogados do escritório Advocacia Garcez, que presta assessoria jurídica à Federação Nacional dos Urbanitários (FNU-CUT), afirma que há uma série de questões que não foram definidas.

Uma delas é: “como fica a situação do empregado de empresa pública, se o concurso público era específico para a área de risco? A empresa poderia demitir? A empresa privada também poderia demitir?”

Ainda sobre empresas públicas ou privadas, os advogados pretendem questionar se existe a obrigação de readaptação de função?


Continuidade do trabalho após a aposentadoria especial INSS

A lei não proíbe o trabalhador que recebe aposentadoria especial de continuar trabalhando. O que a lei diz é que quem recebe aposentadoria especial não pode continuar exercendo atividades que colocam em risco a saúde ou a integridade física.

Todavia, se o segurado continuar exercendo atividade especial terá que escolher entre o benefício e a continuidade do trabalho.

 

Aposentadoria especial

A Aposentadoria Especial é um benefício previdenciário concedido ao trabalhador que exerce suas atividades com exposição a agentes nocivos, que podem causar prejuízos à saúde e integridade física com o passar do tempo.

Têm direito à aposentadoria especial, o trabalhador que comprovar, além do tempo de trabalho, a efetiva exposição a agentes químicos, físicos, biológicos ou associação de agentes prejudiciais definidos pela legislação em vigor à época do trabalho realizado por período exigido para a concessão do benefício (15, 20 ou 25 anos a depender do grau de risco).

 

Arquivo/Agência BrasilArquivo/Agência Brasil 

Atividades consideradas de risco

Aposentadoria após 25 anos de profissão

Aeroviário;

Aeroviário de Serviço de Pista;

Auxiliar de Enfermeiro;

Auxiliar de Tinturaria;

Auxiliares ou Serviços Gerais; 

Bombeiro;

Cirurgião;

Dentista;

Eletricista (acima de 250 volts);

Enfermeiro;

Engenheiros Químicos, Metalúrgicos e de Minas;

Escafandrista;

Estivador;

Foguista;

Químicos Industriais;

Toxicologistas;

Gráfico;

Jornalista;

Maquinista de Trem;

Médico; 

Mergulhador;

Metalúrgico;

Mineiros de superfície;

Motorista de ônibus;

Motorista de caminhão (acima de 4000 toneladas);

Técnico em laboratórios de análise e laboratórios químicos;

Técnico de radioatividade;

Trabalhadores em extração de petróleo;

Transporte ferroviário;

Transporte urbano e rodoviários;

Operador de Caldeira;

Operador de Raios-X;

Operador de Câmara Frigorífica;

Pescadores;

Perfurador;

Pintor de Pistola;

Professor;

Recepcionista;

Soldador;

Supervisores e Fiscais de áreas com ambiente insalubre;

Tintureiro;

Torneiro Mecânico;

Trabalhador de Construção Civil (Grandes Obras – apartamentos acima de 8 andares);

Vigia Armado.

Aposentadoria após 20 anos de profissão

Extrator de Fósforo Branco;

Extrator de Mercúrio;

Fabricante de Tinta;

Fundidor de Chumbo;

Laminador de Chumbo;

Moldador de Chumbo;

Trabalhador em Túnel ou Galeria Alagada;

Trabalhadores permanentes em locais de subsolo, afastados das frentes de trabalho;

Carregador de Explosivos;

Encarregado de Fogo.

Aposentadoria após 15 anos de profissão

Britador;

Carregador de Rochas;

Cavoqueiro;

Choqueiro;

Mineiros no subsolo;

Operador de britadeira de rocha subterrânea;

Perfurador de Rochas em Cavernas.