Escrito por: Luiz Carvalho

STF decide se institucionalizará racismo no Brasil

Supremo reinicia nesta semana julgamento que pode anular reconhecimento de territórios quilombolas

Roberto Parizotti
Gabriel, Rosana Fernandes (Adjunta de Combate ao Racismo) e Vicentinho falam sobre os quilombos

Na abertura do encontro do Coletivo Nacional da CUT de Combate ao Racismo, nesta segunda-feira (14), em São Paulo, o julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) do Decreto Federal 4887/03, que reconhece os territórios quilombolas, foi o ponto principal dos debates.

Caso a ADI de autoria do antigo Partido da Frente Liberal (PFL) e atual Democratas (DEM), apresentada em 2012, seja julgada constitucional, o reconhecimento de 2.600 comunidades seria considerado nulo e haveria dificuldade de titulação sem marco legal, o que também pode prejudicar outras 6.000 comunidades que pleiteiam o direito à terra.

Durante o encontro, o advogado e mestre em Direito Processual Penal, Gabriel Sampaio, apontou a importância para a democracia de o STF rechaçar a medida.

“Validar instrumentos jurídicos é fundamental para a democracia porque sabemos que o país tem déficit com a população negra desde a abolição da escravatura. Tivemos legislações que reproduziram desigualdades como a lei de terras e a falta de titulação desses territórios. É fundamental que aja uma decisão que valide esse instrumento, o Estado possa avançar e políticas para quilombolas e a população negra sejam aplicadas”, defendeu.

Sampaio afirmou que qualquer decisão contrária neste momento, ignora até mesmo o papel do próprio tribunal de zelar pela Constituição e estabelecer um mínimo de equilíbrio entre os desiguais. “O STF é um tribunal que tem como missão a defesa da Constituição e dos direitos que ela preconiza. A questão do decreto assume essa relevância. Esperamos que do ponto de vista jurídico ocorra decisão favorável à paridade e que o Supremo mantenha posicionamentos históricos que têm tomado como a validação da política de cotas. Esperamos que proteja os interesses dos que necessitam”, acrescentou.

Também presente no encontro, o deputado federal Vicente Paulo da Silva, o Vicentinho, ressaltou que neste momento de golpe o que está em jogo é o enfrentamento ao poder dos financiadores do golpe.

“O objetivo de quem questiona as terras quilombolas é tirar a posse dos que mais necessitam e trabalham nelas para jogar nas mãos do latifúndio e da monocultura da cana. Não podemos deixar de manifestar nossa posição como classe trabalhadora e como movimento social sobre essa questão. Quilombolas somos todos nós”, disse o parlamentar.

Resultado da crise

Para Sampaio, o debate sobre a anulação dos decretos não traz novidade em um cenário de crise. Conforme observou, toda que vez que o capitalismo enfrenta uma crise há a opressão das camadas mais pobres e com menor representação institucional para recompor as faixas de lucro da minoria.

Isso ocorre, reforçou, por meio da super-exploração da classe trabalhadora e a população negra está diretamente ligada a esse processo que se mostra por meio de reformas como a Trabalhista e a Previdenciária que aplicam a retirada de direitos básicos e das condições dignas de trabalho.

“O Brasil, último país a abolir a escravatura, convive com uma burguesia incapaz de produzir um projeto de nação. Precisamos investir em um projeto baseado no tripé constituído por formação, organização e luta popular, que nos leve a lembrar e conhecer o que nos trouxe até aqui”, disse o advogado.

E lembrou-se ao final de lutadores emblemáticos como Dandara, Luís Gama, Zumbi dos Palmares e Abdias do Nascimento, personalidades que inspiram até hoje o movimento negro. “Temos que ampliar nosso engajamento nos espaços de poder para mudar a cara do Congresso e do Judiciário brasileiros. E discutir outros temas como a política de drogas que faz dos presídios um lugar majoritariamente destinado aos negros”, concluiu.

Secretária da CUT de Combate ao Racismo, Maria Júlia Reis Nogueira, apontou que a política do governo ilegítimo de Michel Temer é reduzir a pó qualquer investimento em política pública de distribuição de renda e defesa da igualdade.

“Primeiro, o governo Temer congela por 20 anos o investimento em políticas públicas que auxiliam justamente quem mais precisa. Depois, aprova a Reforma Trabalhista, que atinge principalmente a população negra, porque é quem ocupa os piores postos de trabalho e onde se concentra o maior número de desempregados. Por fim, quer passar uma Reforma Previdenciária que atinge em cheio o conjunto da população negra que tem mais dificuldade em ter o trabalho formal”, pontuou.