Escrito por: Mariano Vásquez

Tentativa de golpe no Equador: Não é...

Artigo de Mariano Vásquez, da CTA-Argentina

Abre com veemência a camisa. Não tem colete à prova de balas. Não está rodeado de militares armados até os dentes. Coragem sanguínea. Diz: “Se querem matar o Presidente, aqui está, matem-me se têm valor”.

As imagens que chegam ao vivo, as crônicas dos meios de comunicação, as palavras carregadas de tensão são eloquentes. Instantaneamente penso em Salvador Allende e sua ousadia durante o golpe de 11 de setembro de 1973. Fiel a sua promessa e aos seus ideais. Não se rende. Sai como cadáver. Um cadáver incômodo para todos os presidentes covardes que em outros tempos governaram nossos países e se colocaram de joelhos ante os interesses anti-populares.

Ontem vi em seu espelho ao presidente Rafael Correa, arriscando sua vida, defendendo a democracia e o processo de mudanças que deu inicio com a Revolução Cidadã. Firmeza ética. Convicção ideológica sem fissuras. Valentia pura. Espelho de Allende.

Instintivamente vem a mim a recordação do golpe exitoso em Honduras. O temor a que um cenário tão obscuro se repita. Porém há diferenças e no mesmo dia o jogo foi virado. Talvez Manuel Zelaya nunca tenha avaliado perder a vida.

Apenas com sua segurança pessoal, Correa foi até o regimento onde estavam amotinados mil policiais sediciosos. Não quiseram escutá-lo, o vaiaram. Os alfinetou: “Se querem matar o Presidente, aqui está, matem-me se têm valor”.

O agrediram, o insultaram, lhe jogaram gás lacrimôgeneo, o sequestraram no hospital policial e inclusive ali, nesta circunstância, seguiu fiel a sua fibra moral: “Eu de aqui saio como Presidente ou como cadáver”. As multidões saíram às ruas para respaldar o governo legítimo. Unasul foi hiperativa e rápida. Aula de solidariedade. Logo um grupo de elite do exército o resgatou a tiros, junto ao povo, que ali também se encontrava, enfrentando os sublevados.

Depois, história conhecida, uma lei do Poder Executivo sobre o Serviço Público derivou em protestos de um setor da polícia. Parecia uma reivindicação meramente sindical. Porém o efeito contagiou e se estendeu até o aeroporto internacional Mariscal Sucre com a ocupação, e consequente suspensão dos vôos. E o levante seguiu a um par de regimentos do interior do país. Já era um golpe, com setores da direita açulando os que estavam agachados, como os seguidores do ex-presidente Lucio Gutierrez, que também se meteram pela força nos estúdios da televisão pública. Ali os jornalistas foram fiéis ao mandato moral deste ofício que deve estar guiado pela verdade. E se expandiu e se fez maior a cláusula ética de ser fiéis ao denunciarem o golpe. Fundaram exemplo.

Hoje é um dia de alegria, um golpe de Estado contra um dos processos revolucionários da região fracassou estrepitosamente. Como já havia ocorrido na Venezuela (2002) e na Bolívia (2008). Porém o antecedente de Honduras (2009) abriu uma fissura de golpes modernos, com a ponta da lança nos oligopólios dos meios de comunicação, com a mesma intenção que as da época da Doutrina de Segurança Nacional e os mesmos cúmplices.

Precisamos estar alertas. E a América Latina deve ser um só punho para não somente resistir contra estes embates da direita, mas para consolidar os processos de transformação vitoriosos na última década, em curso na região.

Não é tempo de frouxos.