Tiro, paulada e soco: sobrinho de Bolsonaro é réu por tentativa de feminicídio
Vítimas eram mulheres com quem o acusado já havia se relacionado; em um dos casos, Orestes Bolsonaro chegou a atirar
Publicado: 29 Setembro, 2021 - 12h17 | Última modificação: 29 Setembro, 2021 - 12h27
Escrito por: Vinícius Segalla, do Brasil de Fato
O empresário Orestes Bolsonaro Campos, de 39 anos, é réu na Justiça de São Paulo em dois processos criminais: um por lesão corporal e outro por tentativa de homicídio. Em comum, as duas condutas foram motivadas por ciúme, se deram contra mulheres com quem o acusado já havia se relacionado e na presença dos homens que então se relacionavam com as vítimas, que por sua vez também foram agredidos. O Brasil de Fato teve acesso aos autos dos dois processos penais.
Orestes Bolsonaro é filho de Maria Denise Bolsonaro Campos, irmã do presidente da República, Jair Bolsonaro (sem partido). Ela e seus filhos ganharam notoriedade nacional quando, em julho de 2019, fizeram uso de um helicóptero da Força Aérea Brasileira para ir do município de Eldorado (SP), onde moram, ao casamento do deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), no Rio de Janeiro. A própria família gravou um vídeo a bordo da aeronave pública, e em seguida postou as imagens em suas redes sociais.
Os crimes de violência e tentativa de assassinato a que responde Orestes Bolsonaro foram cometidos em 2020. O mais grave foi no dia 2 de outubro daquele ano, no município de Cajati, próximo a Eldorado, na região paulista do Vale do Ribeira. Tanto a Polícia Civil quanto o Ministério Público e a Justiça de São Paulo enquadraram o caso como "homicídio qualificado tentado - feminicídio". Veja, abaixo, trecho do boletim de ocorrência lavrado no dia do crime denunciado.
Naquela data, de acordo com testemunhas, com as provas colecionadas pelo Ministério Público na ação penal e com a Polícia Civil do Estado de São Paulo, Orestes Bolsonaro entrou sem ser autorizado - às 6h30 da manhã - na residência de uma ex-namorada (cujo nome não será publicado para que não se exponha ainda mais a vítima), que se encontrava em seu quarto, dormindo, em companhia de seu então namorado (que também terá seu nome preservado).
Foi ali que, segundo a Polícia e o Ministério Público, Orestes Bolsaro tentou matar os dois. Primeiro, a golpes de pau, fazendo uso de um taco de madeira que portava. Depois, com tiros de pistola. A arma de fogo utilizada foi apreendida e era de propriedade formalizada e perfeitamente legal do acusado, conforme se vê abaixo, em reprodução de documento constante nos autos do processo.
Esta não teria sido a primeira vez que Orestes Bolsonaro teria agredido a ex-companheira, conforme se lê na denúncia do Ministério Público, assinada pelo promotor de Justiça João Otávio Bernardes Ricupero. De acordo com as investigações policiais e da promotoria, o acusado rotineiramente agredia a vítima, com quem fora casado por 17 anos. Leia trecho abaixo:
A violência doméstica e familiar foi marcada pela violência física e psicológica exercida pelo denunciado, que, durante o relacionamento, já vinha praticando constantes agressões físicas e verbais contra a ofendida, em razão de sua personalidade possessiva e violenta (art. 7.°, incisos I e II, da Lei 11.3430/2006).
Conforme revelado pelos elementos dos Autos, a vítima XXXXX e o denunciado foram casados por cerca de dezessete anos, possuindo dois filhos desse relacionamento. O denunciado tratava sua ex-esposa de forma possessiva, não aceitando que ela iniciasse novo relacionamento amoroso, ainda que já estivessem separados há vários (dez) meses.
Os fatos que ocorreram no dia 2 de outubro de 2020 estão detalhadamente narrados na denúncia do MP-SP. Leia abaixo mais um trecho, em que os nomes das vítimas foram retirados pela reportagem:
Sabendo que sua ex-esposa pernoitava com o namorado XXXX e utilizando-se da chave da casa de XXXX que lhe fora por ela confiada, ali entrou sorrateiramente de madrugada, onde as vítimas dormiam.
Em seguida, o denunciado passou a desferir golpes em XXX com um pedaço de madeira, fazendo com que o ofendido desfalecesse. XXXX, então, segurou ORESTES, que portava uma arma de fogo, enquanto XXXX se restabelecia.
O denunciado sacou o seu revólver e, nesse momento, XXX entrou em luta corporal com ele, permitindo que a vítima pegasse seu filho de colo e saísse de casa para chamar a polícia.
Durante a briga, ORESTES ainda quebrou um copo de vidro na cabeça de XXXX, realizou um disparo de arma de fogo que não atingiu o ofendido por erro de pontaria, bem como mordeu-o no braço, mas XXX conseguiu se evadir quando o denunciado caiu no chão. O delito somente não se consumou porque a vítima, mesmo ferida, conseguiu fugir e chamar a polícia.
A Polícia Civil deu início às investigações no mesmo dia em que o crime ocorreu. Não foi lavrado flagrante delito porque Orestes Bolsonaro fugiu antes que os policiais chegassem ao local.
O Ministério Público recebeu o relatório da polícia e, no dia 3 de abril deste ano, denunciou o acusado à Justiça. Veja trecho abaixo.
A Justiça de São Paulo, então, passou a apreciar a denúncia. No dia 1º de junho deste ano, a juíza Gabriela de Oliveira Thomaze acatou a acusação, tornando, assim, Orestes Bolsonaro Campos réu por dupla tentativa de homicídio quadruplamente qualificados. A fase de instrução processual (audiências, análise de provas e oitiva de testemunhas) deverá ter início nas próximas semanas. Veja, abaixo, trecho da decisão judicial.
Segundo processo: Orestes Bolsonaro encontrou mulher na cama com outro e a arrastou no chão pelos cabelos
Este não é o único crime cometido contra uma mulher e motivado por ciúme a que responde o sobrinho do presidente da República. No dia 17 de setembro de 2020, por volta das 2h da madrugada, no município de Registro, também na região do Vale do Ribeira, Orestes Bolsonaro foi a uma festa com uma mulher (que também terá seu nome preservado).
Em dado momento, o réu sentiu falta da companhia ao seu lado, passou a procurá-la e veio a encontrar deitada em uma cama na companhia de um ex-namorado. Ao se deparar com a cena, Orestes Bolsonaro agrediu com socos e tapas as pessoas que estavam deitadas, e depois arrastou a mulher pelo chão do cômodo, puxando-a pelos cabelos, conforme disseram testemunhas e comprova exame de corpo de delito realizado na vítima, que atestou escoriações no rosto, edemas nos braços, pernas e barriga e escoriações no couro cabeludo.
Algumas horas após o episódio, Orestes Bolsonaro encontrou na rua com o homem que havia agredido, cada um em seu automóvel. O acusado teria voltado a agredir a vítima, chegando a disparar um tiro de pistola em seu veículo.
Essas são todas informações constantes nos autos do processo penal a que responde o réu pelo crime de lesão corporal, ao qual o Brasil de Fato também teve acesso.
A polícia passou a investigar o crime no mesmo dia em que ocorreu. O Ministério Público recebeu o relatório policial e, no dia 18 de dezembro do ano passado, denunciou Orestes Bolsonaro à Justiça por lesão corporal. Veja, abaixo, trecho da denúncia.
A Justiça de São Paulo, então, passou a apreciar a denúncia. No dia 24 de fevereiro deste ano, a juíza Barbara Donadio Antunes Chinen acatou a acusação, tornando, assim, Orestes Bolsonaro Campos réu por lesão corporal. O processo se encontra em fase de instrução. Veja, abaixo, trecho da decisão judicial.
Outro Lado
O Brasil de Fato entrou em contato por email com o advogado que defende Orestes Bolsonaro nos processos penais. Seu nome é Alexander Neves Lopes. Foram enviadas as seguintes perguntas:
- Como o réu se declara em relação à autoria dos atos que lhe são imputados?
- Quais motivos levaram o réu a proceder como descrito nos autos? Se os autos trazem inverdades ou falsa narrativa, qual é a versão do réu?
- Como se deram as circunstâncias que resultaram em abertura de processo penal, de acordo com o réu?
Até a publicação desta reportagem, não havia resposta. Caso o advogado ou seu cliente venham a se manifestar, suas declarações serão incluídas nesta página.
Edição: Vivian Virissimo