Escrito por: Vanessa Ramos
Bolsonaro vetou 14 dos 17 artigos da Lei, debatida e negociada pelos movimentos sindical e social e parlamentares, para proteger os trabalhadores e investir na produção de alimentos no Brasil
Agricultores familiares de 17 estados e do Distrito Federal realizaram protestos nesta quarta-feira (23) contra os vetos do presidente Jair Bolsonaro (ex-PSL) à Lei n º 14.048, de 2020, conhecida como Lei Assis Carvalho, que autorizava o poder público a comprar da agricultura familiar e doar os alimentos para as famílias mais pobres nas periferias das grandes cidades, além de criar um auxílio emergencial para trabalhadores e trabalhadoras durante a pandemia do novo coronavírus, entre outras medidas urgentes e necessárias.
Para exigir que o Congresso Nacional derrube o veto presidencial e garanta a adoção das medidas emergenciais de apoio a agricultores familiares durante a pandemia, centenas de trabalhadores e trabalhadoras foram às ruas do Distrito Federal, Goiás, Pernambuco, Ceará, Piauí, Rio Grande do Norte, Paraná, Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Bahia, São Paulo, entre outros estados. [Confira no final da matéria]
A luta é por condições de vida e de trabalho
A lei vetada por Bolsonaro deriva do Projeto de Lei (PL) 735, aprovado no Congresso Nacional no final de agosto, resultado de discussões realizadas por entidades sindicais e movimentos sociais, a partir da “Plataforma Emergencial do Campo, das Florestas e das Águas em Defesa da Vida e para o Enfrentamento da Fome diante da Pandemia do Coronavírus”.
O texto, dos deputados Paulo Pimenta (PT-RS), do líder Enio Verri (PT-PR), juntamente com a Bancada do PT, agrega 26 projetos e foi inteiramente construído em parceria com os movimentos do campo.
Apesar de toda essa articulação e elaboração, quando chegou às mãos de Bolsonaro ele não titubeou, vetou 14 dos 17 artigos do PL, entre eles o que estendia o auxílio emergencial de R$ 600 a agricultores familiares que não tivessem recebido o benefício. No caso das mulheres, a cota seria dobrada, como previa a lei que aprovou o auxílio para trabalhadores desempregados, informais e microempreendedores individuais.
“Contrariedade ao interesse público e inconstitucionalidade” foi a justificativa de Bolsonaro ao vetar os artigos, argumentando que não há previsão orçamentária.
O presidente também vetou medidas como a concessão automática do benefício Garantia-Safra aos agricultores familiares, a criação de um programa de fomento para apoiar a atividade produtiva desses trabalhadores durante o estado de calamidade pública e a renegociação de dívidas de pequenos agricultores.
Coordenador-Geral da Confederação Nacional dos Trabalhadores e Trabalhadoras na Agricultura Familiar do Brasil (Contraf-Brasil), Marcos Rochinski relata que, desde o início da pandemia, as entidades sindicais já apontavam ao governo a necessidade de medidas de apoio e organização do processo produtivo da agricultura familiar.
“Avisamos que o país correria um sério risco com o passar do tempo de aumento substancial dos preços dos produtos agrícolas e, isso, certamente afetaria a vida do conjunto dos trabalhadores e trabalhadoras do nosso país. E foi o que aconteceu com alguns alimentos”, explica.
Ao lembrar que os agricultores familiares são os responsáveis pela produção de 70% dos alimentos que chegam à mesa das famílias brasileiras, Rochinski avalia com preocupação o próximo período.
“A crise relacionada ao aumento nos preços dos alimentos tende a se acentuar se não forem tomadas medidas importantes para a retomada da capacidade produtiva da agricultura familiar. Por mais que o governo tente dizer que isso tem a ver com o aumento do dólar e o crescimento de exportação, sabemos que quem produz a maior parte dos alimentos que compõem a cesta básica são os agricultores familiares. O veto é urgente para garantir este conjunto de medidas e o processo de retomada da capacidade produtiva”, aponta.
Para o secretário de Desenvolvimento da Federação da Agricultura Familiar do Estado de São Paulo (FAF-SP), José Justino Filho, a intransigência do governo com relação aos vetos apenas comprova o descaso de Bolsonaro e apoiadores frente à agricultura familiar e camponesa na produção de alimentos básicos no país.
“Queremos sensibilizar a sociedade para a crise do desabastecimento de alimentos e o desmonte das políticas públicas da agricultura familiar. Seguiremos pressionando o Congresso e o governo para a derrubada imediata dos vetos", afirma.
O dirigente também destaca que a alimentação adequada, assim como as condições propícias para isso, consta no artigo 25 da Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 1948, bem como na legislação nacional.
“Existe um direito constitucional à alimentação e o governo nega isso, agindo com descaso contra a população brasileira na garantia daquilo que inclusive está na lei e que é essencial ao Brasil”, conclui Filho.
Protestos pelo Brasil
Em Brasília, os agricultores familiares realizaram manifestação em frente ao Congresso Nacional e ministérios, distribuindo alimentos da agricultura familiar.
No Ouroeste (SP), os agricultores dispuseram alimentos para distribuir para a população no centro da cidade.
Em Goiás, os agricultores familiares do acampamento Graça Branca, no município de Jaupaci, ocupam as margens da rodovia GO-173, altura do km 9.
Veja mais fotos dos atos pelo país
*Edição: Marize Muniz