Escrito por: Tatiana Melim
Em casos de trabalhadores contratados por empresas com sede em outros países para trabalhar no estrangeiro, como é o caso de navios de cruzeiros, a contratação deve seguir a lei que mais protege o trabalhador
Um camareiro de navio de cruzeiros, que era submetido a jornadas de trabalho de 12 a 16 horas por dia, teve reconhecido pela Sexta Turma do Tribunal Superior do Trabalho (TST) o direito de que sua contratação seja regida pela legislação brasileira.
Isso porque as leis de Bahamas, onde fica a sede do grupo Pullmantur, responsável pela contratação do trabalhador, praticamente não prevê nenhuma proteção trabalhista.
Como o camareiro foi contratado no Brasil para trabalhar no navio MV Sovereign, com bandeira de Malta, do grupo Pullmantur, o entendimento unânime dos ministros do TST é de que se aplica a legislação brasileira de proteção ao trabalho quando esta for mais favorável que a legislação estrangeira.
Segundo Nuredin Ahmad Allan, advogado trabalhista e sindical e um dos responsáveis pelo caso junto com o escritório Mauro Menezes e Advogados Associados, as companhias que prestam serviços em cruzeiros geralmente utilizam a legislação com as piores condições para os trabalhadores e trabalhadoras.
“Como muitas dessas empresas estão sediadas em países onde praticamente não existe proteção trabalhista, elas aplicam as piores condições de trabalho”, explica o advogado.
Estamos falando de jornadas de segunda a domingo, de 12 a 16 horas por dia, durante 6 a 9 meses, que é mais ou menos o período que duram os contratos. São condições tão precárias de trabalho que remontam há 400 anos atrás- Nuredin Ahmad Allan“São trabalhadores que ocupam subempregos na hotelaria e restaurantes e sofrem assédio sexual, moral, xenofobia, racismo, homofobia”, completa.
Jurisprudência majoritária
Na reclamação trabalhista, o camareiro pleiteava o reconhecimento da unicidade dos dois contratos e o pagamento de verbas trabalhistas com o objetivo de que fosse aplicada ao seu contrato a CLT mais favorável, no caso a legislação brasileira.
As empresas, no entanto, sustentavam que deveriam ser aplicadas a Lei do Pavilhão, ou Código de Bustamante (Convenção de Direito Internacional Privado, promulgada no Brasil pelo Decreto 18.871/1929), e a Convenção do Trabalho Marítimo da Organização Internacional do Trabalho (OIT), utilizada no país da bandeira da embarcação (Malta) e no país sede da empregadora (Bahamas).
A relatora do recurso do trabalhador no TST, ministra Kátia Magalhães Arruda, argumentou na decisão que “não se ignora a importância das normas de Direito Internacional oriundas da ONU e da OIT sobre os trabalhadores marítimos”.
“Contudo, deve-se aplicar a legislação brasileira em observância ao princípio da norma mais favorável, que norteia a solução jurídica quando há concorrência entre normas no Direito Internacional Privado na área trabalhista”, diz trecho da decisão.
O advogado Nuredin Ahmad esclarece, ainda, que a própria OIT orienta que, se as leis do país forem mais vantajosas para o trabalhador do que as convenções, é a legislação mais favorável que deve valer.
“A decisão do TST não é isolada. Apesar da pressão das companhias, há 3 anos, o entendimento que tem prevalecido é da aplicação das leis que mais protegem os trabalhadores”.
*Com informações do TST