Vaza Jato: o seletivo e parcial Sérgio Moro só vazou áudios completos de Lula
Em outros casos, só advogados e investigados tiveram acesso aos relatórios da PF e aos áudios com as conversas interceptadas. Vazamento impediu Lula de ser ministro e ajudou a consolidar o golpe
Publicado: 25 Novembro, 2019 - 11h35
Escrito por: Redação CUT
Novas mensagens da Vaza Jato, publicadas pela Folha de S. Paulo e pelo site The Intercept Brasil neste domingo (24) mostram que os membros da força tarefa da Operação Lava Jato fizeram, em 2016, uma pesquisa interna para provar que era comum o então juiz da 13ª Vara Criminal Federal de Curitiba Sérgio Moro divulgar grampos de réus investigados.
Moro estava sendo cobrado por ter liberado para imprensa o áudio completo de conversas de Lula, inclusive as particulares e sem interesse público, que grampeou. Entre elas, tinha a conversa com a ex-presidenta Dilma Rousseff, durante a tramitação do golpe que a mídia tradicional e o Congresso Nacional chamavam de impeachment. Na conversa, eles discutiam um termo de posse do petista como ministro da Casa Civil, cargo que, como já se sabe, também por meio da Vaza Jato, Lula relutou em aceitar, mas a divulgação do áudio dava a entender que o ex-presidente tinha aceitado para se livrar da prisão.
Na época, Moro disse que apenas seguira o padrão estabelecido pela Lava Jato, garantindo ampla publicidade aos processos que conduzia e a informações de interesse para a sociedade, o que não é o caso de uma conversa privada com um familiar ou amigo. A pesquisa nunca divulgada concluiu o contrário e foi engavetada.
De acordo com o levantamento da força tarefa, em outros casos a quebra de sigilo foi parcial, permitindo apenas a advogados das partes e aos próprios investigados consulta aos relatórios da PF e aos áudios com as conversas interceptadas. Foram analisados documentos de oito casos em que também houve escuta telefônica e "somente no caso do ex-presidente os áudios dos telefonemas grampeados foram anexados aos autos e o processo foi liberado ao público sem nenhum grau de sigilo. Nos outros exemplos encontrados, todos extraídos de ações policiais supervisionadas por Moro na Lava Jato, o levantamento do sigilo foi restrito", aponta a reportagem.
O outro caso foi em 2014, quando Moro classificou com nível zero de sigilo conversas do ex-diretor da Petrobras Renato Duque. "Mas nenhum áudio foi anexado, e a PF levou três meses para apresentar relatório sobre a escuta", ressalva a reportagem.
De acordo com a reportagem da Folha, as mensagens examinadas revelam que o levantamento interno causou desconforto porque não encontraram os elementos para “ajudar a defender Moro contra as críticas que sua decisão recebera”.
A matéria lembra que Moro chegou a ser repreendido pelo ministro Teori Zavascki, que era o relator das ações da Lava Jato no Supremo Tribunal Federal, pela maneira como retirou o sigilo da investigação. Mas reclamações dirigidas ao Conselho Nacional de Justiça foram arquivadas sem que Moro sofresse constrangimento.
Lula não virou ministro, cargo em que teria condições de ajudar Dilma politicamente para impedir a conclusão do golpe de estado, depois foi preso sem crime e sem provas, o que contribuiu para a eleição de Jair Bolsonaro, que levou Moro para ser seu ministro da Justiça.
A cronologia dos fatos
- Moro já tinha mandado interromper a escuta nos telefones de Lula. O diálogo entre ele e Dilma foi grampeado porque uma das operadoras de telefonia demorou a cumprir a ordem do juiz.
- Moro divulgou o grampo no dia 16 de março de 2016, o mesmo dia em que Dilma anunciou a nomeação de Lula como ministro da Casa Civil.
- Lula tomou posse como ministro da Casa Civil no dia 17, por volta das 10h30.
- Cerca de uma hora depois, o juiz federal Itagiba Catta Preta Neto, da 4ª Vara do Distrito Federal, suspendeu a posse por meio de uma decisão liminar (provisória).
- No dia 18, o ministro do STF Gilmar Mendes suspendeu a nomeação. A decisão foi proferida em ação apresentada pelo PSDB, partido de Aécio Neves, um dos líderes do golpe, e pelo PPS, partido que funcionava como linha auxiliar do tucanato.
- Na decisão, Gilmar Mendes afirmou ter visto intenção de Lula em fraudar as investigações sobre ele na Operação Lava Jato. O petista ainda pode recorrer da decisão ao plenário do Supremo.
- Além de suspender a nomeação de Lula, Gilmar Mendes também determinou, na mesma decisão, que a investigação do ex-presidente fosse mantida com o então juiz federal Sérgio Moro. A defesa de Lula pedia para o caso sair do Paraná.
Imparcialidade?
O levantamento não usual do sigilo das investigações sobre o ex-presidente é um dos argumentos utilizados pela defesa de Lula no habeas corpus que pede a suspeição de Sergio Moro e a anulação das sentenças. Ainda não foi marcada a data para o julgamento deste HC no Supremo Tribunal Federal (STF).