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Votorantim Metais de Niquelândia-GO

Publicado: 11 Dezembro, 2007 - 18h26

Escrito por: Sindicato denuncia danos à saúde e mortes provocadas por exposição à amônia

Uma grave denúncia ecoa das vozes dos trabalhadores metalúrgicos e mineiros na região noroeste do Estado de Goiás, na cidade de Niquelândia. A denúncia envolve dezenas de mortes e centenas de pessoas que tiveram suas condições de saúde gravemente prejudicadas pela rotina de trabalho na unidade metalúrgica e mineradora da cidade, a CNT (Companhia Níquel Tocantins) de propriedade da Votorantim Metais do Grupo Votorantim.

A cidade, anteriormente chamada de São José do Alto Tocantins e posteriormente Traíras, recebe desde 1943 o nome de Niquelândia, em alusão as grandes reservas deste metal. Nestes tempos o níquel era pesquisado e explorado por grupos japoneses e principalmente alemães, que acabaram expulsos da região por pressão dos americanos, que implantaram a CNT, durante a 2ª Guerra. Ao findar da Guerra, a área ficou um pouco esquecida pelas grandes potências mundiais, sendo ela comprada pelo Grupo Votorantim em 1957. Somente na década de 80 conclui-se a construção da usina de beneficiamento (concentração) de níquel, e a partir daí, inicia-se a fase de exploração em larga escala.

Niquelândia situa-se em uma condição geográfica e ambiental privilegiada no Estado de Goiás. Os solos são férteis e a paisagem é belíssima, com montanhas, vales e água abundante. Este cenário favorece seu potencial eco-turístico e a produção agrícola, que se destaca na cidade pela produção de milho, arroz, feijão, mandioca, tomate e melancia. E neste cenário de harmonia com a natureza que se insere a unidade de produção de concentrado de níquel da Votoratim Metais.

A Votorantim explora um tipo de minério conhecido como níquel laterítico. Este minério é formado na superfície dos terrenos, por óxidos e silicatos de níquel e cobalto, que constituem compostos extremamente estáveis em condições naturais. Por esse motivo as mineradoras utilizam-se de processos extremamente caros e consumidores de energia para o beneficiamento deste minério. Além disso, o processo inclui participação de produtos químicos perigosos e exalação de gases tóxicos, com alto potencial de danos à saúde e ao meio ambiente. A Votorantim, em Niquelândia, é a única unidade industrial/mineradora no Brasil a utilizar-se deste processo.

AM?NIA - Um dos gases exalados neste processo é a amônia (NH3). Este gás é um velho conhecido vilão das industrias, e segundo a Agência de Proteção à Saúde do Reino Unido, pode causar irritação e corrosão da superfície dos olhos, nariz e garganta; tosse, edema pulmonar, espasmos e, por fim, a morte pela falência do sistema respiratório (asfixia). Este vilão silencioso causa ao longo do tempo o processo de adaptação, onde o indivíduo exposto não mais sente o cheiro de amônia, devido à fadiga olfativa, e assim, não percebe o perigo eminente.

Segundo o presidente Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias Extrativas de Niquelândia (SITIEN), Cícero Joventino de Oliveira, em 1992, iniciaram-se as discussões acerca dos danos à saúde causados pela exposição de trabalhadores à amônia. Assim, foram abertos processos com denúncias contra a Votorantim, porém a posição da empresa foi de negar responsabilidade e afirmar que o processo aplicado na unidade não apresenta risco à saúde dos trabalhadores. No passado, foram realizadas audiências públicas visando à conscientização e divulgação para sociedade brasileira destas denúncias. No entanto, tanto o Ministério Público, quanto o Ministério do Trabalho, não tomaram providencia alguma quanto a esses casos.

Foi convocado pelo SITIEN, em 19 de outubro deste ano, uma audiência pública para discussão dos casos de danos à saúde ou de morte causados pela exposição dos trabalhadores à amônia na Votorantim Metais. Para esta audiência foram convidados à participação os trabalhadores, a empresa, os membros dos sindicatos da região, CUT, Ministério do Trabalho, Ministério Público, parlamentares, vereadores e advogados particulares dos processos em andamento. Entretanto, Ministério Público e do Trabalho não enviaram nenhum representante, assim como a empresa, que enviou um ofício ao sindicato argumentando que "a empresa não participará por discordar da forma como o assunto está sendo conduzido por esta entidade". De forma antagônica, neste ofício, a empresa também comenta que "a Votorantim Metais sempre se pautou por ética, transparência e respeito a seus colaboradores, comunidade e meio ambiente, mantendo-se aberta ao diálogo".

AUDI?NCIA - Nesta audiência pública, os deputados federais Rubens Otoni e Pedro Wilson Guimarães (membro da comissão de Direitos Humanos e Minorias), ambos da bancada do PT, se comprometeram a formar uma comissão para acompanhar o caso junto aos sindicatos, federações e ministérios (público, saúde e justiça). A intenção é elaborar um documento protocolado no Ministério do Trabalho para que se possa promover um estudo detalhado sobre as denúncias e assim mover uma ação coletiva do caso.

Em depoimentos compilados em vídeo exibido nesta audiência, os trabalhadores mencionam sintomas como: fortes dores de cabeça constantes, dor no peito, falta de ar, dor na juntas por artrose, emagrecimento, problemas na vista, cegueira. Estes sintomas assemelham-se muito àquilo mencionado na literatura médica, onde o contato e inalação com amônia geram problemas de corrosão da mucosa e pele. Neste mesmo vídeo, denúncias de trabalhadores revelam setores do processo onde não se fazia uso de EPIs (equipamento de proteção individual) e muitos citam o contato direto com a gás tóxico, chegando ao extremo de serem obrigados a cheirar amostras com amônia, seguindo recomendação de engenheiro da empresa.

Os médicos de Niquelândia, contratados pela empresa para fazer os exames médicos periódicos dos trabalhadores, nunca associaram esses sintomas com a contaminação por amônia. No entanto, o Dr. Otávio Brasil, médico toxicologista de Brasília-DF de renome no país, relacionou esses sintomas com a ação da amônia no organismo.

Segundo o presidente do SITIEN, hoje 450 pessoas já entraram com processos contra a empresa, sendo que 200 conquistaram a realização de audiência na Justiça. Esta mesma fonte declara também que no mês de setembro três ex-funcionários da empresa morreram ainda com processos em andamento na justiça. Atualmente, o presidente do SITIEN, e o próprio sindicato, são acusados pela empresa em ação na justiça por "difamação do nome e imagem da empresa".

AGRAVAMENTO - A situação deste caso fica agravada pelo desconhecimento dos trabalhadores, ações individualizadas com advogados particulares, falta de análise de qualidade dos quadros clínicos dos trabalhadores realizadas por médicos independentes e a carência de fiscalização adequada dos órgãos públicos. Assim, fica claro que os trabalhadores não podem lutar em ações isoladas contra a gigante Votorantim. E necessário desdobrar essa luta sob uma óptica coletiva, sob o atento olhar da sociedade brasileira. Cabe ao poder público apoio nesta luta, através de abertura de audiência pública e subseqüente formação de uma equipe de técnica especializada, para andamento efetivo de investigações honestas, sem máscaras, nem mentiras que possam ser geradas pelo poder do sistema do grande capital.