As escadarias do Teatro Municipal e a aprovação do Estatuto da Igualdade Racial
Publicado: 08 Abril, 2008 - 00h00
A população negra vislumbra a possibilidade de obter uma grande vitória na luta contra o racismo no Brasil.
O Projeto de Lei número 3198, do ano de 2000, institui o Estatuto da Igualdade Racial. Ãâ° de autoria do senador Paulo Paim que, em entrevista concedida ao apresentador Paulo Henrique Amorim, afirmou: "apresentei o estatuto há 10 anos no Congresso. Quando eu era deputado, ao sair eu deixei ele aprovado na Comissão Mista, na Comissão Especial, e de lá para cá ele não avançou. Eu chego no Senado, aprovo uma nova versão e mando àCâmara. Conforme conversas com todos os setores da sociedade, naquela ocasião não havia questionamentos. E mais uma vez é engavetado, não aprova nem a versão original e nem o substitutivo. Eu como sou autor de diversos estatutos... como do Idoso, da Pessoa com Deficiência, eles estão tramitando normalmente. O da Pessoa com Deficiência está pronto para ser votado, só não foi votado porque as entidades querem aprimorar o texto. A questão de combate ao racismo está dormindo em alguma gaveta da Câmara dos Deputados. Isso é inaceitável."
Em recente depoimento, o ministro Edson Santos responsável pela Secretaria Especial de PolÃÂticas de Promoção da Igualdade Racial (Seppir), afirmou: "A partir de um trabalho de convencimento, discussão e demonstração ao parlamentares do estado de desigualdade racial no Brasil, essa aprovação, que tem por objetivo consolidar os direitos da população negra, será possibilitada. Isso seria um marco na luta contra o racismo no nosso paÃÂs. A Seppir é um instrumento do governo no sentido de coordenar ações de combate a esse estado de desigualdade. O Estatuto da Igualdade Racial vai transformar essas ações em polÃÂticas de Estado. Assim como existe o Estatuto da Criança e do Adolescente, o Estatuto do Idoso, teremos um conjunto de leis que permitirá e determinará ao Estado brasileiro uma ação para o combate da desigualdade racial. E eu acredito que até o final do ano teremos um ambiente favorável para a aprovação do Estatuto na Câmara Federal."
Este depoimento reforça as palavras proferidas pelo Presidente Lula na cerimônia de posse do ministro da Promoção da Igualdade Racial realizada em 20 de Fevereiro, afirmando que "O Estatuto da Igualdade Racial somente não foi colocado em votação no Congresso por falta de consenso do movimento negro".
A conjuntura polÃÂtica aponta a necessidade do movimento negro adotar uma postura pragmática em relação ao Estatuto. temos que separar o "zoio" do trigo.
Qual é efetivamente o segmento da sociedade que se posiciona contra a aprovação do Estatuto?
Sabemos que para a elite dominante branca o Estatuto ou qualquer outra forma de ação afirmativa, polÃÂtica pública, cota etc, tem o mesmo efeito que a cruz provoca nas "hostes celestiais da maldade".
O povo negro que na sua grande maioria não está organizado em nenhuma legenda do movimento negro, não pode aceitar que sofismas e falsos argumentos sirvam para fundamentar a postura de meia dúzia de pessoas - que se intitulam lideranças - de tentar impedir um dos mais expressivos avanços da história recente do paÃÂs na luta contra o racismo.
A aprovação do Estatuto da Igualdade Racial significa que as escadarias do Teatro Municipal de São Paulo, que desde a década de 70 é palco improvisado de grandes manifestações organizadas pelo movimento negro, poderão efetivamente voltar a ser utilizadas para a sua função primordial, que é o de possibilitar o acesso de mais de 46% da população aos grandes espetáculos que hoje são freqüentados exclusivamente pela elite conservadora, reacionária e predominantemente branca. Será, principalmente, um grande avanço rumo àconquista da igualdade de oportunidades aos negros e negras deste pais.
Marcos Benedito é coordenador da Comissão Nacional Contra a Discriminação Racial (CNCDR/CUT) e presidente do Instituto Sindical Interamericano Pela Igualdade Racial (INSPIR)