Lutar contra os agrotóxicos também é resistir aos retrocessos
Publicado: 05 Dezembro, 2016 - 00h00 | Última modificação: 06 Dezembro, 2016 - 13h40
O 3 de Dezembro foi consagrado como Dia Mundial da Luta contra os Agrotóxicos em memória do vazamento de uma fábrica de agrotóxicos em Bophal, Índia, onde morreram 15.000 pessoas e mais de 300.000 foram intoxicadas, em 1984.
Este ano, a luta contra o uso de agrotóxico e a denúncia dos seus impactos sociais e ambientais não podem ser desvinculados da conjuntura política do Brasil e da denúncia do golpe de Estado. Com a fragilização da democracia e redução do espaço de diálogo do governo com os movimentos e organizações da sociedade civil, abre-se uma brecha perigosa para que grupos econômicos ligados a interesses ruralistas e do agronegócio tenham mais liberdade para influenciar na flexibilização de leis que limitam, ainda que de forma tímida, o uso dos agrotóxicos.
Assim como a PEC 55, a terceirização e outros projetos, avança no Legislativo uma série de medidas que retira direitos e flexibiliza conquistas sociais. Um deles é o PL PL6299/2002, ou PL do Veneno, que vem sendo denunciado por movimentos e organizações da sociedade civil.
Dentre as medidas, o PL altera o nome de Agrotóxico para Defensivos Fitossanitários, escondendo da sociedade todo o risco que estes venenos trazem para nossa saúde e o meio ambiente, além de facilitar o registro de novos agrotóxicos sem fazer os estudos aprofundados sobre seus riscos. Esta se somaria à já aprovada Lei 13.301/2016, que permite a pulverização aérea para combate ao Aedes Aegypti, de ampla rejeição pela comunidade científica e militantes da saúde pública e do meio ambiente.
A CUT vem denunciando e se mobilizando contra os retrocessos que estão acontecendo no país, que atingem não só a classe trabalhadora, mas todos os brasileiros e brasileiras. É nosso papel resistir ao avanço de pautas conservadoras e às ameaças contra os direitos garantidos pela Constituição. A luta contra o uso de agrotóxicos também faz parte desta batalha.
A defesa da agroecologia e o combate ao uso de agrotóxico não só diz respeito a uma forma diferente de produção de alimentos, mas também sobre outro modelo de desenvolvimento socialmente justo e ambientalmente sustentável que precisa ser discutido. Cada vez mais a população está ciente dos impactos deste modo de produção de alimentos com veneno, e as políticas do Estado não podem seguir um caminho contrário para beneficiar o interesse de grandes grupos econômicos nacionais e internacionais.
Porque a luta contra o uso de agrotóxicos
O século XX caracterizou-se por um intenso e contínuo processo de mudanças tecnológicas e organizacionais, que atingiram de forma contundente o mundo do trabalho, acarretando grandes transformações nos processos de produção e nas relações de trabalho urbano e rural.
A Agricultura também se encontra em transformação tecnológica e organizacional, cujo resultado final tem sido o aumento da produtividade, mudanças iniciadas na Revolução Verde, também conhecida como Modernização da Agricultura.
Embora tenha surgido com a promessa de acabar com a fome mundial, não se pode negar que essa revolução trouxe inúmeros impactos sociais e ambientais negativos através da introdução na agricultura brasileira da utilização dos insumos químicos conhecidos como agrotóxicos.
Os impactos na saúde decorrentes da utilização de agrotóxicos atingem desde os trabalhadores que aplicam o produto e moradores próximos às regiões de pulverização até os consumidores dos alimentos contaminados com os resíduos de veneno.
A contaminação pelos agrotóxicos acontece de maneira direta (na preparação e no manuseio) ou indireta (contaminando o ar, água, solo e alimento) e se manifesta através de intoxicações agudas que podem incluir fraqueza, cólicas abdominais, vômitos, espasmos musculares, entre outros, e intoxicações crônicas: efeitos neurotóxicos, carcinogênicos, teratogênicos, mutagênicos, dermatites de contato, lesões hepáticas e renais, arritmia cardíaca, alergia, asma brônquica, danos ao sistema reprodutivo, entre outros...
A vasta utilização dos agrotóxicos na produção agrícola no Brasil vem crescendo cada vez mais e representa um grave problema de saúde pública, por apresentar um alto consumo, e está entre os primeiros países do mundo no uso de agrotóxicos e transgênicos. Esses venenos têm isenção de impostos e quem paga a conta somos nós com os danos causados à saúde e ao meio ambiente.
O Agronegócio, que é responsável pela produção de desmatamento, ocupa grandes extensões de terra com cultivo extensivo e monocultura, usa de forma intensiva o agrotóxico. 65% do consumo anual de agrotóxico está na plantação da soja, milho, algodão e cana de açúcar, resultando num desequilíbrio ecológico que contribui para o aumento da resistência das pragas ao controle químico. Tudo isso, gera um ciclo vicioso, que, por sua vez leva ao aumento das dosagens e do número de aplicações durante o ciclo produtivo das plantas.
O agronegócio, além de usar o agrotóxico de forma intensa, não gera empregos e não produz alimentos. Nos últimos 12 anos a área plantada de alimentos diminuiu, enquanto a soja – voltada especialmente à agropecuária - subiu para mais de 83% e cana de açúcar, mais de 100%. Dos alimentos que vão para nossa mesa 70% são produzidos pelos agricultores e agricultoras e seus familiares e camponeses. No entanto, muito desses produtores são envolvidos numa cilada do mercado, que vende de forma casada as sementes e os agrotóxicos, ocasionando o endividamento do produtor e a contaminação de alimentos.
A pauta da luta contra os agrotóxicos atinge direita e indiretamente a classe trabalhadora, por isso é importante a mobilização, levando o debate para diferentes espaços, conhecendo e divulgando a realidade de trabalhadoras e trabalhadores impactados com a produção e uso de agrotóxicos, a contaminação das nossas águas, terras e alimentos e denunciando aqueles que se beneficiam deste modelo predatório.
A CUT participa, desde 2011, da construção da Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos, articulação de organizações nacionais e internacionais contrárias ao uso de venenos e que apontam a necessidade de um novo modelo de produção e consumo, tendo a agroecologia como sua principal diretriz. Em breve, iniciaremos mais uma etapa desta luta, agora visando especificamente a derrubada do PL do Veneno.