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CUT convoca para março Marcha em Brasília

Vagner Freitas, presidente da CUT, fala sobre os próximos passos da mobilização em defesa dos direitos, da democracia, contra a atual política econômica, o golpismo e o retrocesso

Publicado: 05 Janeiro, 2016 - 12h21 | Última modificação: 05 Janeiro, 2016 - 13h43

Escrito por: Luiz Carvalho e Paula Brandão

Roberto Parizotti
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Vagner Freitas, durante ato em São Paulo em novembro de 2015

Para usar uma metáfora do futebol, os movimentos sociais capitaneados pela CUT conseguiram empatar um jogo que parecia perdido. Aqueles que queriam ganhar no tapetão, porque não conseguiam vencer com a bola rolando, já contavam com a vitória quando, aos 45 minutos do segundo tempo, com raça e união, os movimentos sociais conseguiram igualar o placar.

Juntos, colocaram milhares nas ruas no final de 2015 e deixaram quem já cantava vitória com um gosto amargo na boca. Mas, como diz outro jargão no futebol, quem não faz, toma. Com apoio das ruas, é hora do governo sair da defesa e partir para o ataque.

Um primeiro passo foi dado: a saída do ex-ministro da Fazenda, Joaquim Levy, pela política de benção ao mercado financeiro que representava, estagnando a economia em nome de um ajuste fiscal, foi um bom primeiro passo, mas precisa se concretizar com diálogo e propostas para reaquecer a economia.

Isso é o que defende o presidente nacional da CUT, Vagner Freitas. Na primeira conversa com o Portal da CUT neste ano, o dirigente aponta o que espera de 2016, ressalta que as mobilizações em defesa da democracia, contra o golpe e pelo desenvolvimento com distribuição de renda, aliadas ao fim da atual política econômica continuam na agenda.

Vagner fala ainda sobre a pesquisa CUT/Vox Populi, intitulada “Brasil: a agenda da população”, que referenda o desejo da população de impedir retrocessos como as mudanças na Previdência e manter conquistas como os programas sociais.

Confira abaixo os principais momentos.

CUT nas ruas em março
No início dos trabalhos legislativos estaremos com a pauta dos trabalhadores nas ruas. Os mesmos movimentos que ocuparam todo o país em novembro do ano passado novamente estarão mobilizados em março em defesa da democracia, contra o golpe, contra a reforma da Previdência, pela manutenção dos direitos e para colocar o Cunha (Eduardo Cunha, presidente da Câmara) fora do Congresso.

Foi nossa ação em defesa de direitos e da democracia que fez parceiros, partidos, movimentos que não votaram em Dilma, mas são contra o retrocesso e contra o golpe, virem junto nessa luta, num momento em que os golpistas já davam como certo o impeachment da presidenta e a prisão do Lula. Um enfrentamento que fez as bancadas dos partidos progressistas também se levantarem no Congresso Nacional com a mesma bandeira. Fomos nós que fizemos um movimento junto aos empresários, com ações como o Compromisso pelo Desenvolvimento, para isolar golpistas de direita e outros mais. Com esses setores batemos na tecla de que a agenda do Brasil não é a agenda do impeachment e da lava-jato, mas do desenvolvimento econômico, da geração de emprego e renda.

A partir disso, não podemos perder de vista duas grandes frentes: a discussão sobre a reforma do Estado e a disputa de opinião na sociedade. O acerto dos governos Lula, Dilma, Nestor e Cristina Kirchner (ex-presidentes da Argentina), Rafael Correa (ex-presidente do Equador), Hugo Chavez (ex-presidente da Venezuela) e Evo Morales (presidente da Bolívia) foi fazer o embate direto com o neoliberalismo. O mote da luta da esquerda mundial tem de continuar sendo a derrota do neoliberalismo, porque se não fosse a luta da esquerda, dos movimentos sociais e desse governo no Brasil e na América Latina, o neoliberalismo já teria implementado sua agenda do começo ao fim. O segredo da esquerda que deu certo por aqui foi impedir a implementação de uma pauta de redução de custos por meio da redução de direitos, do fim da carteira assinada, das garantias legais num cenário de economia desregrada.

Como será 2016
Vamos continuar defendendo que o Estado não pode retirar direito, que a política de valorização do mínimo deve continuar porque é boa para o trabalhador e para a economia, vamos continuar defendendo a geração de emprego, a mudança na política econômica, que causa a recessão e vamos continuar defendendo a legislação trabalhista. Não aceitaremos que o negociado se sobreponha sobre o legislado, negligenciado a legislação.

Isso significa fazer política, porque você, trabalhador, se não gosta de política, vai ser comandado por alguém que gosta. Nós somos uma central sindical que defende direitos trabalhistas, por isso brigamos no parlamento, nas eleições, temos propostas políticas e econômicas. Porque se não fizermos isso, o patrão vai fazer, organizar pessoas para fazer e o trabalhador será prejudicado.

Como seria prejudicado em caso de impeachment da Dilma para entrada do Temer (Michel Temer, vice-presidente), tendo como base o Ponte para o Futuro, programa do PMDB, que acaba com a CLT, com as férias e com o 13º salário. Quando o trabalhador ouve que precisa tirar a presidenta, que ela é ruim, também precisa saber que o Eduardo Cunha, autor dessa proposta, é o mesmo cara que defende a terceirização sem limites e que apoia todas as propostas que retiram direitos dos trabalhadores.

Sem Levy, hora de virar o jogo
O Nelson Barbosa (novo ministro da Fazenda) tem a faca e o queijo na mão para vir agora com notícias boas para o Brasil. Porque se ele continuar com o discurso de ajuste fiscal e segurar a economia, vai perder a chance de aproveitar o clima do final do ano em que conseguimos equilibrar o jogo com os direitistas.  Tem que mudar a agenda da economia, com as propostas que apresentamos no 12º CONCUT (Congresso Nacional da CUT) no ano passado - o reaquecimento do mercado interno por meio do barateamento do crédito e da redução da taxa de juros.

Nós achamos que o Estado deve ser também indutor do crescimento econômico, não pode só ser o mercado quem determina as regras do jogo. Isso é de esquerda e fico feliz quando sociólogos como o Boaventura de Sousa Santos e o Emir Sader enxergam também dessa forma, ao invés de dizer que o neodesenvolvimentismo construído a partir do governo Lula é pouco importante. Se não fosse o neodesenvolvimentismo, teria sido o neoliberalismo, que teria vindo com o PSDB. E só será possível construir nova sociedade se trabalhadores foram protagonistas políticos desse jogo; mas não se sentirão incluídos se não tiverem emprego e renda.

Previdência
Não aceitaremos nenhuma mudança na Previdência e qualquer discussão que venha a ocorrer deve se for feita no Fórum de Debates sobre Políticas de Trabalho, Renda, Emprego e Previdência, criado no ano passado justamente para discutir essas questões.

A CUT foi chamada e aceitou participar do Fórum por ser um espaço de diálogo, então, não há razão para, mesmo antes de tomar posse, o ministro da Fazenda já falar em reformar e pautar isso como uma das primeiras ações para 2016. Então, criou o Fórum para quê? Queremos que as propostas sejam discutidas pela sociedade nesse ambiente que tem representantes dos trabalhadores, do empresariado, do parlamento e do governo. É onde devemos tirar consenso sobre questões como a Seguridade, que não é só a Previdência, mas todo um sistema de proteção social que o país tem e que não é deficitário. O que precisa é combater a sonegação dos que não recolhem para a Previdência, e não retirar um direito tão importante e tão essencial como a aposentadoria.

"Não podemos perder de vista duas grandes frentes: a discussão sobre a reforma do Estado e a disputa de opinião na sociedade"
Vagner Freitas



E não adianta dizer que esse problema só afligirá nossos filhos e os trabalhadores que adentrarem o sistema a partir de agora. O governo precisa se posicionar sobre isso, porque os neoliberais acham que isso não é importante, que é melhor fatiar a Previdência, acabar com todos os direitos adquiridos e vender essa proteção para empresas privadas, como acontece no México e no Chile. Essa é a pauta que não queremos ver aqui.

Desde o Fórum Nacional do Trabalho, em 2003, no mandato do presidente Lula, já defendíamos um sistema público e universal, que é tranquilamente sustentável se cobrar os sonegadores e os devedores, se o orçamento da Seguridade Social for utilizado somente para o financiamento do sistema, se tiver uma gestão transparente e quadripartite, com a participação dos trabalhadores, se a contribuição das empresas passar a ser calculada sobre o faturamento e não somente considerando a folha de pagamento. Esse último ponto, por exemplo, serviria para arrecadar junto a setores que ganham muito, empregam pouco e é algo que já cobramos há muito tempo.

Salário mínimo no caminho certo
Os mesmos que querem acabar com a Previdência querem o fim da política de valorização do salário mínimo. E eu quero elogiar a proposta corretíssima da presidenta Dilma de corrigir o valor acima da inflação. Isso é investimento no aquecimento da economia, muitas cidades têm como fonte de renda os trabalhadores que recebem um salário. São eles que fazem girar a economia, aumentando o mercado de consumo brasileiro, que tem espaço sim para crescer. Não estamos na Dinamarca, na Suécia ou na Holanda, onde a desigualdade é muito menor e a maior parte da população tem acesso a condições dignas de vida. Temos 200 milhões de habitantes e menos de 40 milhões de consumidores.

Todo americano tem dívida porque tem crédito, alguém que empreste. Vai comparar nosso endividamento com o do cidadão americano? O sistema financeiro deveria fomentar esse financiamento. Aqui não tem crédito, a taxa de juros está lá em cima e o sistema financeiro só serve para escochar o país inteiro. Não tem nenhuma função social. Temos que ampliar, por exemplo, o crédito consignado para os trabalhadores também do setor privado com o laço das empresas para evitar o endividamento individual.

Onde errou
O papel do BNDES é fomentar o desenvolvimento e apresentar linhas de crédito para as empresas brasileiras, mas isso tem de vir acompanhado de contrapartidas sociais como a manutenção do emprego. Houve o subsídio, mas não a contrapartida para ajudar a melhorar a vida das pessoas.

Não conheço nenhum país desenvolvido em que o Estado não foi indutor de desenvolvimento. Pode pegar a Coréia ou mesmo os Estados Unidos. Quando a GM ia quebrar, o Obama mandou resolver. Não foi o sistema financeiro econômico que resolveu a crise hipotecária, foi o Tesouro Americano.

Além disso, na saída de 2011 para 2012, ao invés de discutir com a sociedade para construir subsídios para aprovar o orçamento, o governo criou um processo de apertar o cinto e paralisar a economia que nos trouxe problemas gravíssimos. A CUT nunca fugiu desse debate, somos contra a política econômica praticada no segundo mandato da Dilma até aqui.

Atuação do Congresso em ano de eleição
Políticos são movidos por pressão o tempo todo e acho que alguns parlamentares podem mudar de opinião, se mantivermos em 2016 a mesma capacidade de mobilização que tivemos em 2015. Você tem corporações no Congresso, a bancada da bala, do agronegócio e da Bíblia são orientadas por seus interesses. Nossos atos em defesa da democracia não vão mudar a posição de um Bolsonaro, de um Caiado, mas pode respaldar os políticos que são contra o retrocesso, para que possam se levantar contra o conservadorismo.

Queremos que o Congresso Nacional, em 2016, tenha uma pauta muito mais progressista do que teve em 2015. Vamos acabar com essa ideia de tirar direitos dos trabalhadores, de reduzir maioridade penal, de facilitar as pessoas a andarem com armas, de criminalizar as mulheres e os LGBTs, (lésbicas, gays, bissexuais e transgêneros), de ataques à democracia e aos direitos humanos.

Mídia e Judiciário
O problema do Brasil é fundamentalmente político, e não só econômico. Se resolver a questão política, o Brasil tem viabilidade econômica. Uma coisa está atrelada a outra. A crise política impede que o país tenha condições de andar economicamente, mas a grande mídia brasileira nunca fala isso, fala que o governo fez tudo errado, que gastou demais. O que é gastar demais? É gastar com Bolsa-Família, com programas sociais? Isso não é gasto, é investimento. Mas a mídia oculta isso. O que falta é uma regularização na mídia para que haja contraposição, para que os dois lados possam ser ouvidos com as mesmas condições. A lei do direito de resposta é uma conquista, é um primeiro passo. Mas é preciso ter uma mudança rápida e significativa da mídia no Brasil, assim como uma mudança no poder judiciário.

O processo de sensacionalismo e de espetacularização da Justiça, que conta com promoção da mídia, tem que acabar. Exemplo disso está no tratamento dado à família Vaccari e à família Cunha. Porque o tratamento é diferente? A cunhada do Vaccari chegou a ser presa injustamente, acusada sem provas, confundida com esposa de Vaccari, que também não há provas de qualquer ato ilícito. O caso foi amplamente divulgado na mídia, como um espetáculo. Já a mulher de Cunha, acusada e com provas contra ela, nada foi mostrado. Há evidente diferença de tratamento.

O poder Judiciário precisa entender que ele não pode ser partidarizado e que ele é fundamental para a democracia.

Mobilização e Reformas
Não tenho dúvida de que o Brasil só não teve um desfecho diferente neste fatídico 2015 pela ação da CUT e dos movimentos sociais. Se não tivéssemos feito a disputa nas ruas, essa agenda do impeachment da presidenta pelos golpistas teria muita chance de ter saído vitoriosa e a política econômica de ajuste ia avançar para prejuízo dos trabalhadores.

Daí a importância da unidade da esquerda, da mobilização conjunta das entidades que compõem as Frentes Brasil Popular e Frente Povo Sem Medo, das centrais sindicais, dos partidos políticos, artistas e intelectuais, construindo unidade nas ruas e nas redes em defesa da democracia, contra o golpe e contra medidas que prejudicam o trabalhador e impedem o desenvolvimento do País.

Também seguiremos em defesa das reformas que o país precisa, como a reforma política, agrária e tributária, bem como a regulamentação dos meios de comunicação, do sistema financeiro e mudanças no Judiciário.

Continuamos mobilizados para terminar esse “terceiro turno” que a direita teima em não querer acabar. Em março estaremos novamente nas ruas para esse embate, fazendo pressão, e mostrar que a classe trabalhadora não vai permitir a retirada de direitos, o retrocesso e qualquer tentativa de golpe. Estaremos nas ruas quantas vezes forem necessárias!